Este é o nosso oitavo texto de crítica ao programa apresentado pelo PSTU para debate no Polo Socialista. Veja os nossos sete primeiros textos aqui. O texto de programa do PSTU, por sua vez, pode ser encontrado aqui.
No mesmo item em que trata das privatizações, e talvez um pouco vexado por reivindicar estatizações para um Estado essencialmente burguês, o documento do PSTU argumenta que tais estatizações teriam de ocorrer “sob controle dos trabalhadores”. Com esse tipo de justificação – que já era apresentada pela ala lassalleana da social-democracia alemã no século XIX [ver novamente V. Lidtke] –, o PSTU crê dar um salto de qualidade rumo ao socialismo. O documento afirma:
“Propomos a revogação de todas as privatizações, e que as novas empresas reestatizadas passem ao controle dos trabalhadores. Achamos fundamental o controle dos trabalhadores, que são os que garantem a produção, para que essas estatais sirvam aos interesses da população e não aos da burguesia ou de burocracias privilegiadas” [página 24].
Na Crítica do Programa de Gotha (1875), ao tratar dos social-democratas que acreditavam que era possível caminhar ao socialismo por meio de estatizações, Marx zombou dos que adicionavam a frase “sob controle dos trabalhadores” para escamotear a capitulação:
“Por [um resto de] vergonha na cara, coloca-se […] ‘sob controle democrático pelo povo trabalhador’ […] mas ‘democrático’ em alemão significa ‘de domínio do povo’. Então, que significa ‘controle do domínio do povo pelo povo trabalhador’? E precisamente para um povo trabalhador que, por meio dessa reivindicação colocada ao Estado, expressa a sua completa consciência de que não está no poder nem está apto a governar!”
A formulação, para Marx, é tão confusa que só revela a impotência e o despreparo político dos que a defendem.
Trotsky, entretanto, foi mais incisivo do que Marx ao criticar a frase “sob controle dos trabalhadores” vinculada à ideia de estatização. O russo indica a raiz dessa deformação programática: ela provém do atrelamento da burocracia sindical ao Estado burguês. Para Trotsky, essa reivindicação nada tem a ver com o verdadeiro controle operário da indústria, que só pode surgir da articulação de Comitês de Fábrica (ou seja, das formas duais de poder operário, nos locais de trabalho). Explica o revolucionário, num de seus últimos textos, “Os sindicatos na época da decadência imperialista” (1940):
“A administração das estradas de ferro, campos petrolíferos etc., sob controle das organizações operarias, não tem nada a ver com o controle operário da indústria, porque em última instância a administração se faz por meio da burocracia trabalhista, que é independente dos operários, mas depende totalmente do Estado burguês. Essa medida tem, por parte da classe dominante, o objetivo de disciplinar a classe operaria fazendo-a trabalhar mais a serviço dos ‘interesses comuns’ do Estado, que superficialmente parecem coincidir com os da própria classe operaria. Na realidade, a tarefa da burguesia consiste em liquidar os sindicatos como organismos da luta de classes e substituí-los pela burocracia, como organismos de dominação dos operários pelo Estado burguês”.