Por Razón y Revolución (Argentina)
Todos nós sabemos o que implica passar um dia inteiro sem energia elétrica. Nós, argentinos, passamos isso a cada fim de ano, quando as temperaturas aumentam, falta água, a comida apodrece e os aparelhos elétricos queimam. Agora imagine esse corte de luz se prolongando por mais de 90 horas, sem ter certeza de quando vai ser reparado. A isso, some-se a escassez de alimentos, remédios e produtos de higiene. Por último, adicione o fato de este risco ter sido denunciado pelos próprios trabalhadores do sistema elétrico e o governo não só não ter feito nada para solucioná-lo, mas também ter perseguido e desaparecido com os denunciantes. Esse inferno para qualquer membro da classe trabalhadora tem nome e se chama chavismo.
Já em fevereiro do ano passado, Elio Vicente Palacios Andrade, trabalhador da Corporação Elétrica Nacional (CORPOLEC) e secretário-geral do Sindicato Único da Classe Trabalhadora do Setor Elétrico de Caracas, Vargas e Miranda, advertiu que o sistema elétrico estava próximo do colapso. Ele fez a denúncia no contexto dos grandes apagões, um em 6 de fevereiro de tarde e outro em 14 de fevereiro na madrugada, que se somavam a um apagão que aconteceu em dezembro de 2017. Naquela ocasião, Palacios Andrade foi detido pela SEBIN [polícia política do governo venezuelano], o mesmo que sumiu com Alcedo Mora, acusando-o de difundir notícias falsas sem fundamentos técnicos. No entanto, no contexto do mesmo apagão, o Colégio de Engenheiros da Venezuela anunciou que acreditava que a crise ia se intensificar e que os apagões seriam mais prolongados, devido às falhas que começavam a acontecer nas centrais elétricas por falta de manutenção, que resultavam em explosões, como as duas da subestação Santa Teresa 3 em Miranda. Isso obrigava a outras centrais, no caso as centrais de Guarenas-Guatire e Tacoa, a aumentar sua exigência produtiva, trazendo o problema a elas também.
No fim da semana, em 7 de março, quase um ano depois da denúncia de Palacios Andrade, começou um novo apagão na Venezuela, que deixou sem luz quase todo o país. O governo saiu a denunciar um ataque cibernético do imperialismo que gerou a queda do sistema. Assim, ou Palacios Andrade e todo o Colégio de Engenheiros da Venezuela são agentes encobertos da CIA, ou o governo mente, como faz com a inflação e com a pobreza, para esconder o descalabro que gerou para beneficiar um punhado de burgueses. Alí Briceño, Secretário Executivo da Federação dos Trabalhadores da Indústria Elétrica, nos dá a resposta, explicando o que realmente se passou. Os fatos foram os seguintes: da subestação de Malena, localizada no Estado de Bolívar, nas margens do Rio Orinoco, na represa Guri, que é em Puerto Ordaz e fornece 80% da energia do país, as ervas daninhas cresceram de tal maneira que geraram um incêndio de vegetação que chegou a danificar a três linhas de produção de 765kw, duas por reaquecimento e uma por sobrecarga. Por precaução, quando isso acontece, deve-se apagar toda a planta e, para ela poder ser ligada novamente, deve-se fazer uma re-calibragem de frequência, mas o pessoal qualificado que se encarregava dessa tarefa abandonou a empresa e o país, segundo disse Briceño, algo que o Colégio de Engenheiros também havia dito um ano antes. Briceño também denunciou que a isso se deve somar o fato de que não se fez manutenção nos transformadores, o que dificulta o funcionamento. Além disso, encontram-se fora 20 entidades, e é por isso que, se a ativação não se faz de maneira correta, ou seja, com o pessoal capacitado, os insumos necessários e em condições ótimas, o descalabro vai ser muito pior. De fato, tentou-se reativar alguns transformadores, mas não isso não funcionou, como no caso da subestação Humboldt, que terminou em uma nova explosão, deixando sem luz os poucos bairros de Caracas onde a eletricidade havia voltado.
A crise elétrica na Venezuela começou em 2010 e se agravou em 2014. No primeiro ano, já haviam acontecido alguns apagões nacionais devido às falhas na geração de energia, e por isso o governo adquiriu plantas térmicas que reforçavam a geração de energia hidroelétrica. Estas compras foram de usinas térmicas antigas, de modo que em 2014 a produção caiu para 38%, caindo 62% na produção hidrelétrica, que por sua vez sofre as complexidades naturais do fenômeno El Niño. O governo também adicionou plantas de geração distribuída, que consistem na instalação de grupos geradores com unidades conectadas entre si, com uma capacidade de produção de 10 a 70 quilowatts cada uma. Instalaram-se 928 plantas, que só servem para fornecer energia de maneira isolada e por pouco tempo para regiões focalizadas, mas só funcionam 28%. Quer dizer, por sua política, o chavismo está no topo da lista dos responsáveis pela situação elétrica que hoje a Venezuela vive.
Perante essa situação, o governo respondeu atacando os trabalhadores, despedindo Damaris Cervantes, funcionária da CORPOLEC que havia denunciado o colapso do sistema elétrico e a perseguição aos sindicatos. Seus familiares e companheiros denunciaram que a SEBIN a sequestrou de casa em um sábado à noite e seu paradeiro é desconhecido. Além disso, Ángel Sequea, Chefe de Despacho de Carga da Guiana na sede de Puerto Ordaz também foi detido pela SEBIN como parte de uma “investigação de rotina”, e seus companheiros denunciaram que ele possivelmente morreu em um motim que aconteceu no Cicpc [Divisão de Homicídios do Corpo de Investigações Científicas, Penais e Criminais, agência da polícia venezuelana], onde permanecia detido. A isso é preciso se somar os 21 mortos por falhas nos hospitais, pelo menos as mortes confirmadas, e os 500 detidos que se produziram nas tentativas de saques.
É preciso se dizer com todas as letras que o regime chavista é uma ditadura de ataque frontal à classe trabalhadora e é responsável pelo desinvestimento, pelo péssimo investimento no caso em que o fez, e a perseguição aos trabalhadores que denunciavam essa situação, inclusive desde antes de Guaidó aparecer em cena. O mesmo regime que soltou Leopoldo López, Antonio Ledezma e não se atreve a tocar em Guaidó não hesita em sequestrar e assassinar trabalhadores, como Alcedo Mora, os irmãos Vergel, Elio Andrade, Damaris Cervantes e Ángel Sequa e a encarcerar outros como Rodney Álvarez. Guaidó aproveitou essa situação para retomar as sequências de marchas, convocando uma mobilização na terça-feira dia 12. Sem dúvida, nem Guaidó nem nenhum dirigente opositor moveu um dedo para ajudar verdadeiramente a classe trabalhadora pauperizada da Venezuela, e só montou um show na fronteira querendo fazer entrar dois caminhões de açúcar.
Apenas a intervenção da esquerda revolucionária, de uma maneira imediata, concreta, e independente de Maduro e Guaidó pode apontar um luz no fim do túnel. Os próprios trabalhadores da CORPOLEC denunciaram tanto o desinvestimento quanto a perseguição e o desaparecimento de companheiros. São uma mostra de que a classe trabalhadora está disposta a enfrentar Maduro, a quem corretamente responsabiliza por sua situação. É preciso convocar agora mesmo uma mobilização, independente de Maduro e Guaidó, que reúna a maior quantidade de forças possíveis, que permita colocar a esquerda como alternativa à crise.
– Fora o governo Maduro, assassino de trabalhadores!
– Aparição com vida de Alcedo Mora, dos irmãos Vergel, de Damaris Cervantes, de Ánguel Sequa e de todos os lutadores sequestrados pelo chavismo
– Por uma mobilização proletária independente