Transição Socialista

Comentários à proposta de manifesto dos companheiros do PSTU

Introdução

Os companheiros do PSTU lançaram em 22/02 uma “Proposta de Manifesto”, um “Chamado à rebelião” por um “projeto socialista contra a crise capitalista” (veja aqui). Nele há a defesa da conformação de “Polo operário, popular, revolucionário e socialista”. Os companheiros afirmam, muito corretamente, que:

“a tarefa de defender uma alternativa revolucionária e socialista, é também de centenas, talvez milhares de ativistas que estão todos os dias nas lutas, nas fábricas, ocupações, favelas, escolas. Queremos debater esse manifesto e essa proposta entre todos para apresentarmos essa alternativa conjuntamente ao país.”

Buscando contribuir para a discussão do manifesto, para apresentarmos uma alternativa conjunta ao país, tecemos neste texto uma série de considerações. Trata-se em geral de críticas — algumas já apresentadas em outras ocasiões. Elas estão divididas em três eixos principais:

I. A caracterização do quadro de partidos burgueses;

II. A leitura sobre imperialismo e a caracterização do Brasil;

III. O problema do método do programa.

O primeiro ponto talvez seja o menos polêmico, mas visa a esclarecer como, do nosso ponto de vista, os companheiros adaptam-se a conceitos estranhos ao marxismo, o que lhes atrapalha a compreensão do quadro de partidos existentes e da função desses partidos na luta de classes. As tendências gerais do regime político ficam relativamente apagadas.

O segundo ponto visa a esclarecer como os companheiros trabalham com concepções de imperialismo, dependência, atraso, semicolônia que são derivadas do (ou adaptadas ao) stalinismo e sua teoria das etapas da revolução. Tais adaptações atrapalham a compreensão do caráter explosivo do Brasil na revolução socialista mundial e fazem com que os companheiros restrinjam boa parte de sua lógica programática às reivindicações democrático-burguesas. O programa propriamente socialista, que urge ser apresentado, fica neutralizado.

O terceiro ponto, sobre o qual já divergimos algumas vezes, trata do velho problema do método do programa. Nele trabalhamos, mais uma vez, como os companheiros não concebem propriamente um programa dialético e transitório (o Programa de Transição da IV Internacional) e adaptam-se à lógica social-democrata de programa mínimo oposto a programa máximo. Isso faz com que sejam obrigados a lançar, logicamente, uma série de propostas que aparecem para as massas como esquerdistas (máximas), e são ao mesmo tempo, na prática, para gestão do Estado burguês atual (restringindo-se ao quadro democrático-burguês).

Apresentamos as críticas abaixo com a seriedade que pensamos ser necessária. Não há, todavia, de nossa parte, nenhum interesse em realizar ataques fortuitos aos companheiros. As críticas, para nós, servem para demarcações fraternas de diferenças, ou seja, servem como algo que clarifica e contribui para a conformação de trabalhos conjuntos hoje e amanhã. Conhecer bem nossos aliados é condição para manter e aprofundar alianças.

Temos certeza de que o trabalho conjunto de nossa organização com o PSTU, bem como com outras organizações marxistas, faz com que o movimento da classe trabalhadora ganhe. É por isso que, a despeito das críticas apresentadas abaixo, temos convicção de que a melhor coisa que os revolucionários podem fazer neste momento eleitoral é apoiar as candidaturas lançadas pelo PSTU. É por isso que, em declaração pública lançada no dia de hoje em nosso site, também anunciamos que entraremos de cabeça na campanha pelos candidatos do PSTU, a começar pelos lutadores Vera Lúcia e Hertz Dias para o pleito executivo federal. Vamos de Vera e Hertz, vamos de 16 nas eleições, vamos com o PSTU!

Abaixo os comentários ao manifesto apresentado.

I. A caracterização do quadro de partidos burgueses

O manifesto abre-se corretamente com uma consideração sobre a gravidade e explosividade da conjuntura atual, derivada da grave crise da dominação burguesa em nosso país. Também corretamente os companheiros afirmam que as eleições não mudam a vida da nossa classe, mas que, devido à imposição do pleito, as massas são forçadas a se politizar e cabe aos revolucionários responder corretamente as suas questões.

Em seguida, os companheiros apresentam “três projetos capitalistas” que estariam se consolidando no horizonte eleitoral. Seriam eles: um “conservador-ditadorial” (Bolsonaro), outro “capitalista neoliberal puro” (Alckmin, Meirelles, Maia), por fim o “capitalista social-liberal ou democrático reformista de colaboração de classes com a burguesia” (PT, PCdoB e PSOL).

Pensamos que essas caracterizações são frágeis e, por isso, atrapalham uma compreensão mais profunda da gravidade da conjuntura. A própria quantidade de adjetivos revela isso. O PT não é “social liberal”, nem o PSDB é “capitalista neoliberal puro”. Tais conceitos parecem-nos frágeis pois são mais sociológicos do que marxistas. Pode parecer preciosismo de nossa parte, mas vale apontar isso com mais calma.

Lenin, no Imperialismo, fase superior do capitalismo, ensina que os tempos de liberalismo da burguesia acabaram. Na verdade, falando isso, ele não fazia nada além de repetir Marx e Engels no Livro III de O Capital (seção V, especificamente capítulo XXVII), onde os mestres do marxismo apontaram a tendência à necessária supremacia do monopólio capitalista, à supressão de liberdade de concorrência e à atuação fundamental do Estado burguês no aprofundamento disso tudo. Utilizar os termos “liberal” ou “neoliberal” para caracterizações contemporâneas significa reconhecer — mesmo que implicitamente — que Marx, Engels e Lenin estavam errados; que houve um retorno a uma época histórica que, para eles, estaria superada.

“Neoliberalismo” é um termo cuja gênese remete à social-democracia e ao stalinismo light (eurocomunismo) do velho continente. Diante do desmonte do Estado de Bem-Estar Social europeu, tais setores — sociais-democratas e eurocomunistas — viram suas vidas políticas subtraídas. Seu propósito de existência era administrar o Estado capitalista para a burguesia, com cara “social”, e assim impedir a revolução social. Para os social-democratas, o Estado se resumia a essa característica de “bem-estar” (pois era a função que lhes cabia). O fim do tipo de Estado “de bem-estar” — devido aos desdobramentos da crise capitalista — pareceu aos social-democratas o fim de todo tipo de Estado e um suposto retorno à “liberdade” de comércio.

Todavia, o caráter de “Bem-Estar” do Estado era apenas um dos traços — bastante minoritário — do Estado burguês. Era apenas o pano com o qual os oportunistas enganavam a classe trabalhadora, encobrindo a verdadeira face do Estado e prometendo migalhas para a vida sob o capitalismo. Na verdade, por trás da aparência enganadora desse Estado “social”, os demais traços do Estado não só se mantiveram, mas se ampliaram. Ao longo de todo o século XX — seja sob o “bem-estar”, seja sob o “neoliberalismo” — o Estado burguês se manteve e se ampliou em suas funções primordiais, aquelas que lhe caracterizam desde o nascimento — enquanto órgão para acumulação burguesa, órgão para expropriação, para militarismo e para intervenções de política monetária. O Estado, como instrumento da classe burguesa contra a proletária, só se fortaleceu. Todas essas formas de ação do Estado, bem como as tendências de monopólio, são alavancas fundamentais do modo de produção capitalista, que funcionam como potentes elementos de contratendência à crise histórica do sistema. Sem elas (sem o Estado), o capitalismo já teria acabado.

Falamos tudo isso para lembrar das caracterizações eleitorais dos companheiros. Pelo exposto acima, pensamos que não faz sentido afirmar que Alckmin, Meirelles e Maia são “capitalistas neoliberais puros” e PT, PCdoB e PSOL são “capitalistas social-liberais ou democráticos reformistas de colaboração de classes com a burguesia”. Isso é a superfície da política, é o que eles dizem de si mesmos, como se apresentam, mas não corresponde em nada à sua verdadeira função na luta de classes. De certo ponto de vista, PT e PSDB são a mesmíssima coisa. O mesmo vale para o PMDB. São partidos burgueses, partidos do grande capital. Não há nada de “social” no PT, nada de “democrático” ou de “reformista” nesse partido (ou há tão pouco nele quanto há de “social” no PSDB, contido em seu nome). Nem no PT ou PSDB há qualquer coisa de propriamente liberal, no sentido real (ultrapassado historicamente) do termo.

Para além do que os partidos falam de si, valendo-se de termos ideológicos, devemos buscar suas funções na luta de classes. O PT provou que é absolutamente capaz de dirigir violentas ações do Estado capitalista contra a classe trabalhadora. Até por isso, colocar o PSOL ao lado do PT é caracterizar erroneamente; é forçar a barra contra o PSOL. O PSOL não é capaz ainda de exercer a dominação burguesa como o PT. O PSOL caminha — é verdade — para a sua absoluta adaptação à ordem burguesa, para realizar serviços sujos para essa ordem, mas ainda está longe de assumir o grau do PT nisso. Colocar o PSOL lado a lado ao PT, equiparando-os, cria uma dupla falsidade: faz parecer que o PT é de “esquerda” e, ao mesmo tempo, força a barra demais, de forma sectária, contra o PSOL. Aliás, essa caracterização errada fez com que os companheiros do PSTU se negassem a apoiar a ala à esquerda do PSOL, marxista, no seu combate aos lulistas e oportunistas reformistas nos últimos meses.

É preciso compreender que a tendência geral do regime democrático-burguês atual ruma ao bonapartismo. Bolsonaro é um sintoma de que a ordem burguesa necessita de uma saída autoritária. A burguesia necessita derramar mais violência do Estado contra a classe trabalhadora, para que esta pare de brotar repentina e inesperadamente nas ruas em centenas de milhares ou em milhões, para que pare a onda crescente de greves nas fábricas, para que parem as ocupações de escolas etc. O sinal de alarme já soou para a burguesia. Mas achar que apenas Bolsonaro representa um projeto “conservador-ditatorial” é algo simplista.

Bolsonaro é o mais frágil e incapaz, dos “três projetos capitalistas” apresentados, para realizar uma ditadura burguesa. Bolsonaro mal tem partido e sua base eleitoral é volúvel demais (pois amparada, em grande medida, em proletários revoltados contra o sistema político falido da burguesia). Alckmin, baseado na forte máquina repressora do estado de São Paulo — sobretudo em sua polícia militar —, cacifa-se como candidato a repressor muito mais competente e estável para a burguesia do que Bolsonaro. Mas sobretudo Lula é o mais habilitado, por já ter dirigido o Executivo federal para a burguesia duas vezes, por já ter implementado ações repressoras em grande escala, e por ter — eis seu diferencial — um aparelho de controle da classe trabalhadora que os outros dois não têm. Quando Lula fala a jornais burgueses que é o mais capacitado para “harmonizar o país”, tem consciência absoluta de seu papel. Um governo do PT não seria um governo de um projeto de “conciliação de classes”, mas do representante burguês com os melhores efetivos para controlar, reprimir e paralisar a classe trabalhadora.

Assim, não devemos colocar o problema apresentado pela conjuntura nesse quadro de “três vias” — sobretudo a partir do que elas dizem de si mesmas —, pois isso ajuda a confundir o que os partidos são e seu papel especial na conjuntura. É preciso compreender a tendência geral do regime e quais candidatos têm bases humanas e materiais mais bem preparadas para representar essa tendência do regime.

II. A leitura sobre imperialismo e a caracterização do Brasil

Em seguida, os companheiros listam “algumas propostas centrais para o debate”. Na listagem de tais propostas, há também, pensamos, elementos corretos e errados.

Está correto afirmar que a crise social do Brasil — exploração, miséria, violência, falta de seguridade social etc. — é derivada da crise econômica pela qual passou o sistema capitalista após 2007-2008. O capitalismo retomou sua acumulação, mas isso necessariamente significou destruição da vida das massas no mundo todo.

Todavia, em seguida os companheiros trazem toda uma concepção sobre a realidade brasileira que deriva, em última instância, de vertentes antigas, melhores ou piores, do stalinismo. Trata-se da ideia de que “o Brasil tem ainda o agravante de ser um país semicolonial”. Essa caracterização do Brasil como semicolônia tem marco fundamental no VI Congresso da Internacional Comunista, de 1928, quando esta já estava stalinizada e visava a impedir a revolução em todos os países do mundo. Dado que o Brasil seria um país atrasado — semicolonial — caberia ainda realizar aqui tarefas de caráter nacional, democrático-burguesas, de “libertação do Brasil” em relação ao imperialismo.

A rigor, nem mesmo existe um Brasil. Existem dois, um da classe trabalhadora e outro da burguesia. A defesa do “nacional” e a abstração de um suposto país chamado “Brasil” — até hoje não encontrado — são elementos valorizados pelo programa stalinista para paralisar a revolução socialista aqui, sujeitando a classe trabalhadora à burguesia nacional. Trata-se da ideia de uma suposta revolução nacional para diluir a de revolução socialista.

No mesmo parágrafo, os companheiros falam que o problema é que o Brasil é “subordinado aos países ricos, aos monopólios internacionais”. Em seguida, critica-se a “rapina, por meio do sequestro do orçamento do Estado pelos bancos com o mecanismo da dívida pública, da remessa de lucros das multinacionais para fora do país, das privatizações, da entrega dos recursos naturais e até do subsolo ao capital estrangeiro, além da permanente reprodução da desigualdade social.

Cabe questionar nesse ponto: os companheiros preferem que os lucros burgueses, em vez de serem remetidos ao exterior, fiquem aqui? Então o problema não seria a existência de lucros burgueses — a extração de mais-valia no processo de trabalho —, mas de saber para onde são destinados os “lucros”? Preferem que os recursos naturais, em vez de serem entregues à burguesia de outros países, sejam entregues à burguesia nacional? Certamente os companheiros não querem nada disso, mas esses são resultados lógicos de se sobrevalorizar o conceito de imperialismo na sua forma stalinizada — cria-se o inimigo externo, que apaga as diferenças de classe internas ao país.

Nessas horas, devemos lembrar dos três Ls: Luxemburgo, Liebknecht e Lenin. Estes sempre afirmavam contra os nacionalistas-chauvinistas: “o inimigo principal está em nosso próprio país”. Em vez de apontar para a classe trabalhadora como inimigo uma coisa externa e abstrata — o imperialismo —, deve-se voltar a atenção às coisas concretas, ao inimigo verdadeiro: a exploração cotidiana no local de trabalho. Ao operário no Brasil não importa se a empresa que o explora é brasileira ou estrangeira, não importa se as remessas de lucro saem ou ficam — o que importa é que parte de sua vida é roubada para alimentar o capital; o que importa é estancar o roubo e controlar os meios de produção.

Quanto ao fato de o “Brasil” estar “subordinado”, ser “dependente”, somos obrigados a dizer, de forma assertiva: que bom. Isso não é um problema para o Brasil. A rigor, é uma das características de todos os grandes países capitalistas e — melhor ainda — é uma das condições para se chegar mais rapidamente ao socialismo. Trotsky, na História da Revolução Russa, nos dá um exemplo muito ilustrativo quanto a isso, comparando a Inglaterra e a Índia. A Inglaterra era ainda a nação capitalista modelo, e a Índia uma nação colonial das mais atrasadas. Trotsky comenta que caso as duas nações fossem submetidas a um bloqueio econômico, a Inglaterra pereceria muito mais rapidamente do que a Índia, pelo simples fato de que a Inglaterra, por ser uma nação capitalista modelo, era mais dependente do mercado mundial para produzir qualquer mínima coisa. E a Índia, por ser uma nação atrasada, era praticamente autossuficiente.

Pensamos que, para o marxismo, o fato de um país ser dependente não é um elemento ruim: significa que está num ponto alto do capitalismo, com forças produtivas mais desenvolvidas, mais próximo portanto de estabelecer a economia numa forma socialista. Poder-se-ia estabelecer mais rapidamente as bases econômicas do socialismo na Inglaterra do que na Índia (apesar de ser mais fácil ao proletariado tomar o poder político na Índia do que na Inglaterra). É possível que, ao falar que é necessária uma “independência”, os companheiros queiram dizer que nessa ideia se esconde a de uma revolução socialista. Mas por que então escondê-la? Coincidir a ideia de socialismo com a de independência do mercado mundial é flertar com a ideia do socialismo num só país. O capitalismo é dependente — um modo de produção mundial —, portanto, o socialismo, que só nascerá em âmbito global, terá necessariamente de ser dependente. Jamais haverá socialismo com qualquer traço de “independência” nacional.

É por isso que consideramos errada a análise dos companheiros quando lastima a subordinação e a dependência. Na verdade, os companheiros adaptam-se a certas concepções da antiga ala esquerda — muito mais rica e séria, é verdade — do PCB, desde as vias traçadas por Caio Prado Jr. e Ruy Mauro Marini. Por seu esforço, tais intelectuais devem ser respeitados, mas deve-se constatar que nunca superaram os limites colocados pelo stalinismo na caracterização do Brasil e de importantes países da América Latina, nunca se aproximaram verdadeiramente do trotskismo, jamais deixaram de orbitar as linhas burocratizadas de Moscou.

Dizem ainda os companheiros, após falar da “subordinação nacional”, que “o resultado disso é uma maior exploração”. Trata-se de uma variação da tese marinista da superexploração. Na verdade, como comprova Marx em o Capital (seções III, IV e V do livro I, sobretudo capítulos VIII e XIII), com uma série de dados e fórmulas matemáticas, isso a rigor é falso. A “maior exploração” se dá nos países de maior acumulação capitalista anterior, onde se concentram as chamadas formas de extração de mais-valia relativa. Marx compara o escravismo nos EUA ao trabalho do operário inglês e comprova que há maior exploração — extração de maior massa de mais-valia — no trabalho do operário inglês do que no do escravo norte-americano. Marx também comprova que a exploração de crianças operárias inglesas é maior do que a de servos camponeses da Valáquia. Isso não significa que o escravismo e a servidão não eram absolutamente condenáveis e não destruíam as condições de vida desses produtores diretos, mas significa que o grau de exploração era menor (produzia um mais-produto em menor escala). A verdade é que, ainda hoje, a maior exploração — maior extração de mais-valia, maior “produtividade” do trabalho — está nos países capitalistas mais ricos, como EUA, Alemanha e Japão, onde estão as indústrias de ponta e onde reina a extração de “mais-valia relativa”. É por isso que tais países e suas indústrias dominam o mercado mundial.

Todavia, esses países capitalistas avançados, onde há maior exploração (mais-valia relativa), combinam-se com os países capitalistas menos avançados, onde reinam formas absolutas de extração de mais-valia. A extração de mais-valia se dá de forma desigual e combinada (relativa e absoluta) em todo o globo, como ensinou Marx na seção V do Livro I de o Capital. Os países capitalistas mais ricos e os países capitalistas menos ricos formam um todo, um sistema-mundo capitalista. Disso deriva-se um todo concreto e uma estratégia internacionalista que parte da necessidade do controle dos meios de produção no próprio país, ou seja, da luta contra a exploração cotidiana no local de trabalho — e não de uma luta abstrata e nacional contra uma suposta “submissão” ao “imperialismo”. Não faz sentido falar de imperialismo antes de falar da forma de exploração e das condições de vida da classe trabalhadora brasileira. Assim mina-se um potencial revolucionário.

O Brasil, ainda que não seja a nação capitalista mais rica do planeta, não é nem de longe atrasado ou semicolonial. Não se define um país como atrasado por sua suposta dependência do mercado mundial — pela circulação do capital —, mas pela quantidade de relações de produção pré-capitalistas que ele possui (ou seja, pela própria estrutura de produção). No Brasil praticamente não existem relações de produção pré-capitalistas. Nos próprios métodos burgueses de contagem de riqueza, o Brasil é a sétima economia capitalista mundial. Na verdade, o Brasil é uma potência, a maior economia burguesa no hemisfério sul do globo, e por isso um elemento chave da cadeia da revolução socialista mundial. É possível até que este país ou região seja um elo frágil dessa cadeia, devido à dimensão gigantesca do nosso proletariado e ao tamanho abismal das contradições sociais aqui colocadas (grau de miséria e desigualdade sem pares). O Brasil não é semicolônia ou atrasado, mas uma potência revolucionária em ebulição. Nossas tarefas, nele, não são de “libertação” ou de uma “nova independência” abstrata, mas de iniciar a revolução socialista internacional.

III. O problema do método do programa

Em seguida, no texto, os companheiros apresentam uma série de pontos programáticos: “1) Romper com o imperialismo e com o capitalismo para garantir o fim da desigualdade, da opressão e violência”; “2) Por emprego, salário, terra e direitos para todos”, “3) Fim de todo preconceito, opressão, corrupção e violência e defesa das liberdades democráticas! Não pode ser libre quem oprime outro povo”.

Pelo que já expusemos no item anterior, acreditamos que a ordem de apresentação dos pontos está errada. As questões de emprego e salário devem ser apresentadas primeiro. Não se deve “romper com o imperialismo e com o capitalismo” para garantir as condições de vida da população trabalhadora, mas deve-se lutar intransigentemente para garantir as condições de vida da população trabalhadora, o que produz a ruptura com o imperialismo e o capitalismo. Dado que o capitalismo necessita piorar as condições de vida da classe trabalhadora, a mera manutenção destas — na forma correta, com um programa radical e intransigente de manutenção — leva a classe a se confrontar e ter de enfrentar o capitalismo. É preciso encontrar o método que leva as massas trabalhadoras necessariamente da luta conservadora por manutenção das suas condições de vida à tomada do poder (ruptura).

Esse método está contido no Programa de Transição de Trotsky (bem como em o Capital de Marx), lido de forma processual, dialética, não recortada. No caso específico do Programa de Transição, o método parte das reivindicações aparentemente conservadoras, que parecem meramente manter as condições de vida da classe — a escala móvel de salário e a de horas de trabalho, combinadas —, e, a partir delas, transita-se imanentemente (necessariamente) até a tomada do poder. A tomada do poder é o resultado lógico e necessário da mera luta por conservação das condições de vida da classe naquela forma radical (escalas). As massas, na defesa intransigente de sua condição de vida (ou seja, dirigidas pelo partido), chegarão ao socialismo sem saber disso, e, quando estiverem nele, concluirão que são favoráveis a ele.

Assim, a ruptura com o imperialismo é resultado de um processo, e não primeiro elemento. Do contrário, a ruptura sempre será uma mera explicação, um discurso, uma doutrinação socialista vazia, algo apresentado ideologicamente às massas, na via do convencimento da “necessidade”. Essa é a concepção dogmática, que não estabelece uma dialética entre o programa mínimo e o máximo. Entre eles há um abismo, e o socialismo aparece como “convencimento”, ao mesmo tempo em que se adapta a formas de luta mínimas não transitórias, herdadas da social-democracia, do eurocomunismo e da burocracia sindical.

Devido a esse problema de método, as propostas práticas apresentadas pelos companheiros padecem de um duplo problema: ao mesmo tempo aparecem como esquerdistas para as massas e têm conteúdo social-democrata, reformista. Os companheiros parecem ter uma alma dupla: meio socialista e meio social-democrata.

A “suspensão do pagamento da dívida”

Defender, por exemplo, a “suspensão do pagamento da dívida pública” aparece às massas hoje como algo radical demais, como politicagem demais, algo complexo demais, se comparado a defender intransigentemente o salário e emprego no lugar de trabalho. Ao mesmo tempo, essas propostas não são revolucionárias — foram feitas por governos burgueses em grave crise social, como na Argentina, por exemplo. Tais propostas aparecem como passíveis de serem executadas pelo Estado atual, como tarefas para o Estado atual, para os socialistas na gestão do Estado burguês atualmente existente.

Pensa-se assim, de forma bastante pragmática: como resolver o problema da saúde ou educação? Bastaria não pagar a dívida e colocar esse dinheiro em saúde e educação. O pragmatismo — derivado da necessidade de responder “concretamente” às questões que surgem das massas, em entrevistas etc — leva os candidatos da esquerda socialista a portarem-se como gestores humanistas do Estado burguês. “Se eu estivesse lá, cancelaria na hora a dívida e manejaria as verbas para a educação e saúde”, pensam nossos candidatos. O mal dessa concepção é esse pragmático “se eu estivesse lá”, limitado pelos quadros de ação dentro do capitalismo. Nele, a ação política não está determinada pela luta que impede a exploração capitalista — nele, não se trata de cancelar a mais-valia que corre no Estado, mas de melhor alocá-la num canto ou outro dos “serviços”.

Não se trata de pensar o que o nosso socialista faria nos quadros econômicos e políticos atuais, mas de criar o processo em que a classe trabalhadora, na luta contra a extração da mais-valia, cria seus próprios órgãos duais de poder (primeiro, comitês de fábrica, depois, conselhos), para ela própria realizar conscientemente suas tarefas de superação do capitalismo. O conteúdo (defesa das condições de vida) e a forma (comitês primeiramente clandestinos, depois comitês de fábrica, depois conselhos) transcrescem juntos até a necessidade da tomada do poder e do socialismo. A primeira via, pragmática, mantém a classe trabalhadora passiva, espectadora do sujeito salvador que gerenciará o Estado burguês de forma mais radical; a segunda via pressupõe a ação consciente e controle direto da classe não só de toda a economia, mas, no mesmo processo, de todos os mecanismos de poder (é o verdadeiro empoderamento das massas).

Nacionalização, estatização etc.

O mesmo problema retorna nos itens seguintes: “nacionalização e estatização”, “reestatização”, “estatização, sem indenização e sob controle dos trabalhadores”. No Programa de Transição, essas tarefas aparecem muito adiante no desenvolvimento, depois que a classe já criou seus próprios mecanismos de poder dual e os articulou nacionalmente por toda a economia. Apresentar tais reivindicações dessa forma, como pontos iniciais, necessariamente traz a seguinte questão: quem nacionalizará? Quem estatizará? Quem será o salvador? Isso só aparece como possível para o governo atualmente existente. Novamente, na prática, os socialistas se propõem agir enquanto social-democratas, ainda que no fundo não queiram isso.

É exatamente por isso que Trotsky, ao final de seu clássico texto “Os sindicatos na época da decadência capitalista” (1940), critica os socialistas que defendem “nacionalização sob controle da classe trabalhadora”. As atuais empresas estatais são “controladas” por trabalhadores, inclusive com participação da burocracia sindical em sua gerência. Isso não muda seu caráter burguês. O que é necessário é criar antes o poder dual, para ele exercer um contrapeso à vontade da gerência corrompida e envolver a base dos trabalhadores na escola do controle operário.

Só agora emprego e trabalho

Infelizmente, só depois disso tudo — e vejam quantas coisas já comentamos neste texto — aparece o ponto do programa “por emprego, salário, terra e direitos para todos”. Na prática, os camaradas secundarizam o elemento estrutural, onde se dá propriamente a luta de classes — a luta pela repartição da mais-valia no processo de trabalho, luta que estrutura e ordena todos os demais conflitos e contradições entre as classes. Assim, o manifesto dos companheiros, ainda que tenha que começar, corretamente, por uma consideração da explosiva conjuntura atual (de crise de dominação da burguesia), deveria iniciar seus pontos propriamente programáticos com as reivindicações da classe para manutenção das suas atuais condições de vida, contra a crise capitalista. Essas reivindicações — as únicas propriamente transitórias existentes — são as escalas móveis.

Nesse sentido, é ruim que apareça no documento somente a escala móvel das horas de trabalho — “redução da jornada sem redução do salário, dividindo as horas para que todos possam trabalhar” — e não a escala móvel de salários (reajuste mensal dos salários de acordo com a inflação). Essas duas reivindicações são as únicas transitórias pois são as únicas que — caso aplicadas e defendidas energicamente, intransigentemente — efetivamente impedem a piora das condições de vida da nossa classe. Manter as condições atuais é algo que o capitalismo não pode atender. Isso amplia as contradições; cria formas de luta e organização superiores; abre a dualidade de poderes. Elas, como explicou Trotsky (ver discussões com membros do SWP), têm esse potencial porque, combinadas, são a descrição da economia socialista, são a forma como funcionará a economia socialista. Trata-se, portanto, da forma mais simples e concreta de colocar o socialismo no presente capitalista (e sem ficar falando de socialismo). É a forma mais “conservadora” de defender os salários e empregos e, ao mesmo tempo, presentificar o socialismo, abrindo contradições no presente. Aí reside todo o caráter explosivo dessas reivindicações. Elas não podem ser separadas; não cabe colocar uma e não colocar a outra, pois assim quebra-se a possibilidade de concretizar no presente o devir contraditório socialista.

Defende-se ainda, nesse ponto do texto, “saúde, transporte e educação públicos, gratuitos e de qualidade”. O problema é o mesmo já apresentado: por trás desse “público” — e na ausência de órgãos de poder da classe — esconde-se o Estado burguês. Novamente essas medidas aparecem como medidas para serem executadas pelo Estado burguês, na gerência do Estado burguês. Aparecem como reformistas, embora os companheiros não queiram isso.

Opressões

O ponto 3 — preconceito, opressão, corrupção, violência — reproduz parte dos problemas apontados nos parágrafos acima, na medida em que os problemas reais de opressão e violência não aparecem vinculados necessariamente à estratégia revolucionária. Tais problemas, mais uma vez, aparecem mais como questões a serem resolvidas enquanto tarefas democrático-burguesas (enquanto reformas do Estado). Ressoa ainda o peso da concepção do Brasil enquanto país atrasado, semicolonial, que deveria avançar numa série de reformas de caráter democrático-burguês, enquanto etapa necessária, em vez de diretamente socialistas.

Não se deve, obviamente, ser contra a aprovação de possíveis reformas democrático-burguesas que diminuam a opressão e possam ser usadas pelos oprimidos contra este sistema. O mal, todavia, consiste em não conseguir ligar de forma clara a questão da opressão à estratégia socialista. Isso faz com que as reformas possivelmente conquistadas estanquem em seu caráter democrático-burguês e se dissipem em mais ou menos tempo graças à barbárie capitalista.

Por exemplo, não se deve ser contra medidas democrático-burguesas contra a opressão das mulheres. Mas, por si só, elas não resolvem o problema da opressão da mulher — na medida em que não apontam para além deste sistema. A função central dos revolucionários, por exemplo, nesse caso específico das mulheres, não consiste em encontrar reivindicações democrático-burguesas (o que a pequena-burguesia e parte da burguesia já farão), mas em descobrir onde estão as operárias nas fábricas, onde estão as fábricas com grandes quantidades de mulheres. Por serem mais oprimidas pelo sistema, tais fábricas com maioria feminina têm maior potencial na luta de classes. É de fábricas assim que pode surgir com mais força o processo transitório ao socialismo. São fábricas assim que contêm o maior potencial de aplicar e fazer explodir as reivindicações transitórias (escalas móveis) rumo ao socialismo. A mesma questão vale para a opressão de raça.

Segurança

A questão da segurança apresentada pelos companheiros também tem a limitação de sua alma dupla (meio reformista, meio socialista). Defende-se corretamente o fim das ações de repressão atuais (GLO, UPPs e outras), mas ao mesmo tempo defende-se a “desmilitarização da polícia”, ideia relativamente vaga, que flerta com propostas reformistas. Defende-se o fim de um ataque burguês — as medidas de repressão — e ao mesmo tempo uma reforma para o Estado atual (desmilitarização). Mais uma vez busca-se uma saída pragmática.

Acontece que exigir a “desmilitarização” (algo central para os reformistas do PSOL, por exemplo) abstratamente é algo errado para os revolucionários. Basta ver que, hoje, as propostas por desmilitarização que estão no Congresso Nacional são das figuras burguesas nefastas Blairo Maggi e de Celso Russomano. Estes sabem bem que a desmilitarização, aprovada por este congresso, enquanto reforma, tende mais a unificar e fortalecer o corpo policial para repressão em escala ampliada. A tarefa muito mais é outra. A Comuna de Paris só foi possível porque a Guarda Nacional se sublevou e voltou suas armas para a burguesia. O mesmo vale para o papel do Exército na Revolução Russa. Os revolucionários devem defender — e isso fazem corretamente os companheiros, com um dos melhores programas da esquerda — o direito de sindicalização das categorias armadas e o direito democrático de elas elegerem seus superiores. Assim coloca-se a questão como uma reivindicação da categoria, a ser realizada pela luta do proletariado, na base, e não se joga para a abstração que pode ser sequestrada no parlamento burguês. Com esses elementos garantidos (com organismos de duplo poder nessas categorias), deve-se defender a abertura de contratações (similar às “frentes públicas de trabalho”) nessas categorias, bem como formas de vincular sempre mais tais guardas ao povo, a milícias de autodefesa populares etc. Existindo tais órgãos de duplo poder nessas categorias, deve-se ainda defender a prisão de elementos corrompidos e milicianos.

Mas apresentar tudo isso, que é correto, conjuntamente com a via reformista da “desmilitarização”, é neutralizar e inviabilizar totalmente qualquer programa revolucionário para os setores militares!

Corrupção

A questão da corrupção também aparece numa forma democrático-burguesa, uma forma prática ou pragmática: aponta-se a necessidade de confisco dos bens de todos os corruptos e corruptores. Ninguém é contra isso – e é importante que a revolta contra a corrupção se expresse, pois é a expressão da revolta do proletariado contra o Estado parasita burguês –, mas é necessário compreender também que se trata de uma reivindicação democrática-radical, que não aponta para o socialismo. A forma mais correta de colocar o problema – mas sem negar a importância da expressão da revolta contra a corrupção –, é revelar ao operário que a verdadeira corrupção é a que ele sofre todo dia no local de trabalho. Corrupção é roubo, mas o verdadeiro e mais sério roubo é o que ele sofre cotidianamente. O que o capitalista faz com o dinheiro que ele roubou da classe trabalhadora — se compra políticos, jatinhos ou meios de produção — é algo, como diria Marx, post festum, ou seja, após a festa. A festa capitalista já fora realizada, já se roubou o operário, agora resta ao capitalista ver o que fazer do dinheiro que tem em mãos. Só colocar o problema no âmbito da relação do empresário com o político é superficial porque, no limite, legitima a verdadeira corrupção, o verdadeiro roubo capitalista. Nesse sentido, ainda que se deva denunciar a corrupção para melhor revelar o caráter burguês do Estado, a reflexão deve ser trazida para a questão estrutural, para corretamente educar os operários nos problemas mais profundos do sistema.

Poder operário e popular

Após tudo isso, após apresentar um programa que consideramos dúbio — pois busca reivindicações “concretas” que aparecem como de gestão do Estado burguês—, os companheiros colocam corretamente que as eleições não mudam nada. Mas se as eleições não mudam nada, por que se apresenta um programa pragmático-eleitoral, de fortes tendências de gestão do Estado burguês? Não se poderia chegar à gerência do Estado burguês senão pela eleição. Assim, a afirmação de que só a luta e a movimentação da classe pode mudar a vida aparece neutralizada pela sombra de que é possível mudar a vida pela gestão do Estado. Assim transparece a ideia de que as mobilizações e pressões das massas seriam justamente para que o socialista na gerência do executivo consiga efetivar medidas mais democrático-radicais (mas não propriamente socialistas). Não se trata propriamente da concepção de que só a luta muda a vida, mas da concepção de que a luta ajuda o Estado (atual) a mudar a vida. Essa é, no fundo, a concepção de um governo de Frente Popular — ou seja, de um governo de “socialistas” à frente do Estado burguês, apoiado em órgãos de poder da classe. Frentes Populares são formas de governo em que necessariamente existem órgãos de poder dual em larga escala — comitês ou conselhos — e estes dão ainda respaldo ao poder oficial burguês. Frentes Populares foram, por exemplo, os governos de Kerensky na Rússia em 1917, de Leon Blum da França na década de 1930, de Allende no Chile no início dos anos 1970 (e, diga-se de passagem, os governos do PT nunca foram de frente popular, mas burgueses).

Verdade seja dita que, no ponto seguinte — “operários e povo pobre no poder” —, os companheiros apresentam um concepção correta de governo de Conselhos. Não transparece nesse ponto a ideia de que a luta dos trabalhadores seria um apoio ao governo “socialista” à frente do Executivo burguês. Isso é um avanço importante dos camaradas, pois até recentemente utilizavam-se da forma “Por um governo Socialista apoiado em conselhos populares”. Agora avançaram para algo como “Por um governo de conselhos populares”. Mas os pontos anteriores dos programa, com ilusões na gerência do Estado burguês, como tratamos, revelam que a questão ainda não está completamente clara e sedimentada entre os companheiros; que se dá um processo de modificação e avanço nas posições, ainda não tão bem consolidado.

Consideração final

Pensamos que o programa dos companheiros ainda é traçado por formas contraditórias, entre as quais não há propriamente dialética — esquerdismo e reformismo nas propostas, mínimo e máximo, etapa nacional (democrático-burguesa) e etapa socialista, luta no chão de fábrica e governo burguês radical. Isso tudo, para nós, em última instância é expressão da ausência de um método propriamente dialético para superar tais oposições, da adaptação às lógicas da esquerda tradicional, social-democrata ou eurocomunista. A adaptação à lógica destas não vem somente no uso de termos como “neoliberalismo”, mas também em suas análises do Brasil enquanto país atrasado, nas reivindicações mínimas opostas às máximas, e na forma dúbia na concepção do poder, que flerta com a defesa de uma Frente Popular. Não é à toa que o MIR chileno, dirigido por Ruy Mauro Marini, apoiou a Frente Popular de Allende (o que foi desastroso para a revolução chilena) — isso decorria necessariamente da caracterização feita do Chile enquanto atrasado, que pressionava por uma etapa nacional (um programa democrático-burguês), que por sua vez pressionava por uma lógica de reivindicações mínimas reformistas-democráticas-radicais de gerência do Estado burguês, que criava a dubiedade na concepção das formas de poder a se governar o país. Isso tudo está vinculado e suas consequências são desastrosas (no Chile, os cordões industriais, formas de poder dual, ficaram amarrados a Allende e, por isso, desarmados diante da ascenção de Pinochet).

Sim, são muitos os elementos apontados acima. Há muita discussão e pano para manga. Esperamos sinceramente ainda poder aprofundar tais discussões com os companheiros, em momentos oportunos, visando a apresentar uma alternativa socialista para a classe trabalhadora brasileira.