Os petroleiros de base da Petrobras mostram o caminho para a esquerda. Nos mais de 10 dias de greve, têm enfrentado suas direções conciliadoras (sobretudo ligadas à CUT), os fura-greves da administração, o engodo da direção da estatal, as repressões policiais e o cerco de silêncio da grande mídia. Ainda assim, seguem resistindo como podem: são mais de 11 refinarias e 58 unidades marítimas paralisadas. Segundo dados dos grevistas, quase metade da produção de petróleo teve de ser paralisada para que a voz do peão fosse ouvida. A greve nacional dos petroleiros é um fator muito importante para o conjunto da classe trabalhadora brasileira, dada a centralidade do setor energético na economia capitalista. Saudamos essa importante luta!
Grande parte da esquerda brasileira, entretanto, parece ser incapaz de ouvir a voz do peão e prefere desperdiçar energias em ações secundárias nesta conjuntura. “Ações secundárias” são aquelas sobre-determinadas pela luta fundamental, a luta entre a classe trabalhadora e a classe burguesa pela apropriação da mais-valia nos principais ramos da economia. A esquerda socialista brasileira, que é pequena mas não desprezível, infelizmente prefere colocar a maior parte das suas energias nas lutas super-estruturais, por pequenas e limitadas reformas do Estado burguês ou por direitos democráticos, e deixa em segundo plano a luta estrutural de classe, por emprego e salário, que determina todas as demais e é a única capaz de resolvê-las. É como combater sintomas e não a causa de uma doença: a médio prazo ela tomará todo o corpo. Agindo assim a esquerda socialista é incapaz de parar o movimento da barbárie que se propõe combater.
Esquerda novamente fazendo o jogo do PT
Neste domingo tivemos um bom exemplo da confusão da esquerda brasileira. Neste momento de grave crise econômica e crise política do governo federal, uma força política nada desprezível (cerca de 15 mil pessoas) foi mobilizada para parar a Avenida Paulista (que já estava parada graças à política gourmet de Haddad) contra… Eduardo Cunha. Cunha é corrupto e reacionário e é correto indignar-se contra sua figura nefasta, mas é apenas um coadjuvante na implementação do retrocesso nacional. Ele tem sua significativa parcela de culpa e deve ser penalizado, mas é figura auxiliar num projeto burguês que implementa a barbárie a passos largos e que há mais de uma década, no Brasil, tem no Partido dos Trabalhadores sua coluna vertebral política. A própria projeção de um medíocre como Eduardo Cunha (até poucos meses um desconhecido nacional, do segundo escalão do PMDB) é produto dos tempos de dissolução política e mediocridade produzidos pelo PT.
Há portanto que se perguntar: essas energias militantes da esquerda não seriam mais relevantes, na atual conjuntura, se estivessem com a base das categorias em greve? Tamanha solidariedade não ajudaria os operários da Petrobras, por exemplo, a vencer, a superar suas próprias limitações sindicais, a segurar os piquetes contra os fura-greves? Ainda não se inventou uma forma de se estar em dois lugares ao mesmo tempo, portanto: ou as energias da esquerda estão em um lugar ou noutro. A esquerda precisa entender quais são os elos frágeis da cadeia política nacional, aqueles que podem ajudar a desencadear um grande movimento da classe trabalhadora, que fortalecerá a própria esquerda. Certamente, a luta contra Cunha, por seu caráter superestrutural, não é nem será o elo frágil capaz de desatar um forte movimento da classe trabalhadora.
Em política, como se sabe, nada é gratuito. “A realidade não perdoa o menor erro de doutrina”, dizia Trotsky. O afastamento da luta da classe operária e a sobrevalorização das pautas pequeno-burguesas reformistas e superestruturais fazem a esquerda orbitar necessariamente em torno de interesses duvidosos e privados. Essencializar o não-essencial é um erro político grave. Na prática, mesmo que não tenha consciência disso, parte da esquerda socialista está caindo no jogo do petismo. A única condição para se poder participar do ato do dia 08/11 era não falar “Fora Dilma” ou não atacar centralmente a presidenta. Falar “Fora Cunha”, hoje, sem no mínimo atacar frontalmente a presidenta é fazer o jogo do PT, portanto, é legitimar o avanço da barbárie capitalista. É vergonhoso: nem mesmo Dilma é lembrada como responsável pelo ajuste fiscal!
Os caminhos colocados para a esquerda
A esquerda brasileira tem hoje de optar por seguir orbitando em torno do PT ou abrir um caminho novo. A classe trabalhadora, cuja maioria dos membros despreza este governo federal, clama por algo novo, à altura de sua raiva e disposição de luta. Tragicamente, entretanto, grande parte da esquerda socialista – de onde poderia surgir algo novo – opta por passeios dominicais cujo impacto econômico é nulo e cuja função política é aliviar para o governo federal.
As correntes do PSOL que seguirem esse caminho deparar-se-ão com um beco sem saída. Estão sendo centralizadas pela Frente Povo Sem Medo e serão redirecionadas para o colo do petismo. Em pouco tempo perceberão que construíram seu algoz, o candidato Lula. Basta ver o chamado do ato deste domingo, dia 08/11, organizado pela Frente Povo Sem Medo, e ver o chamado do ato do dia 13/11, organizado pela lulista Frente Brasil Popular: os dois chamados são idênticos, têm os mesmos pontos, a mesma linha política, a mesma abordagem. Diferenciam-se apenas pela retórica um pouco mais “raivosa” da Frente Povo Sem Medo.
Por que a Frente Povo Sem Medo está separada da Frente Brasil Popular? Se seu programa político é o mesmo, nada o explica. Em política, quando algo não se explica, quando afronta a razão e a lógica elementar, é porque algo está sendo escondido. O que está sendo escondido? As pistas estão aí para quem quiser ver: os elogios de dirigentes da Frente Povo Sem Medo a Lula. Tais elogios não são gratuitos: são acordos. Com sua atual política, que alivia para o governo federal, o PSOL não paralisará o movimento que os principais dirigentes da Frente Povo Sem Medo farão rumo ao lulismo quando chegar o momento. Na hora H, o PSOL perceberá que somente perdeu tempo e construiu um instrumento contra si mesmo.
Os companheiros do PSTU, da Conlutas, MRT e outras organizações de luta da esquerda socialista estão certos em não se integrarem à Frente Povo Sem Medo, dada a sua atual linha política. Isso levará, sem dúvida, a certo isolamento dessas organizações dentro da esquerda brasileira. Mas o isolamento, ensinou tantas vezes Lenin, não deve ser temido, na medida em que for temporário. A verdade é que a revolta e os anseios da classe trabalhadora brasileira passam cada vez mais ao largo, por fora, do cada vez mais diminuto e falido campo do petismo e do semi-petismo. Os que ainda optam por orbitar em torno do petismo e seu modo de militar devem ser abandonados à própria sorte. A falência do PT os arrastará conjuntamente. A esquerda revolucionária deve se dedicar, integralmente, à sua vinculação com a classe operária – esse árduo, arriscado e aparentemente ingrato trabalho –, pois grandes combates se avizinham.
É hora de decidir se se está com a vanguarda operária, ou com os lulistas.