Transição Socialista

Congresso de fundação do Partido Comunista Alemão

I Discurso a favor da participação do KPD nas eleições para a Assembléia Nacional

Todos nós, inclusive o camarada Levi, encaramos a arrebatada oposição e o estado de espírito que aqui se manifestaram durante a sua exposição2 com a alegria íntima proveniente da origem dessa oposição. Todos compreendemos e estimamos muitíssimo o elã revolucionário e a firmeza que todos exprimem; e quando o camarada Rühle3 os adverte contra o nosso oportunismo não fazemos caso dessas repreensões. Talvez o nosso trabalho não tenha sido em vão, se encontramos companheiros de partido tão decididos. O perigo do nosso oportunismo não é tão grande quanto o camarada Rühle o pintou. Estou convencida de que é nosso dever falar-lhes também, alto e bom som, sempre que temos opinião contrária à sua. Seríamos tristes representantes da Liga Spartakus, que enfrentou o mundo inteiro, se não tivéssemos coragem de nos opor aos nossos pró­prios camaradas.

A alegria de que acabei de falar, proveniente do estado de espírito arrebatado que vocês manifestam, não é sem mescla. Eu a vejo com um olho que ri, outro que chora. Estou convencida de que vocês querem construir o seu radicalismo de maneira um tanto cômoda e rápida; sobretudo os gritos de “votar de­ pressa!” mostram isso. A maturidade e a seriedade não se encontram nesta sala. Estou firmemente convencida de que esse é um assunto sobre o qual precisamos refletir e que deve ser tratado calmamente. Fomos chamados a realizar as maiores tarefas da história universal, e não é demais refletir, de forma madura e fundamentada, sobre os passos a dar para estarmos seguros de alcançar nosso fim. Não se podem tomar decisões tão importantes de maneira precipitada. Sinto falta de reflexão, de seriedade, as quais não devem de forma alguma ser excluídas do elã revolucionário, mas unir-se a ele.

Quero dar um pequeno exemplo de quão irrefletidamente vocês querem decidir sobre coisas que carecem de madura reflexão. Um dos camaradas que aqui grita de maneira particularmente violenta, impelido pela impaciência revolucionária, exige que não se perca tempo. A discussão sobre uma das questões mais importantes é chamada de perda de tempo. Esse camarada referiu-se à Rússia; tal exemplo pode mostrar-lhes como não se leva tempo a examinar se os argumentos apresentados são corretos. A situação na Rússia, quando a Assembléia Nacional foi dissolvida, era um pouco semelhante à da Alemanha atual. Mas vocês esqueceram que antes da dissolução da Assembléia Nacional, em novembro, algo diferente ocorrera — a tomada do poder pelo proletariado revolucionário? Vocês já têm hoje porventura um governo socialista, um governo Lenin­-Trotski? A Rússia já possuía antes uma longa história revolucionária que a Alemanha não tem. Na Rússia a revolução não começa em março de 1917, mas já no ano de 1905. A última revolução é, portanto, apenas o último capítulo, atrás dele está todo o período desde 1905. Nessas circunstâncias, alcança-se uma maturidade das massas totalmente diferente da de hoje na Alemanha. Atrás de vocês não há nada a não ser a miserável meia-revolução de 9 de novembro. Temos que refletir maduramente sobre o que no momento mais serve à revolução, como devem ser vistas e formuladas suas próximas tarefas táticas.

Não sejam tão apressados, tenham paciência para ouvir até o fim. Pretende-se trabalhar no Parlamento com palavras de ordem. Isso não é o essencial. Qual é na Alemanha o caminho mais seguro para educar as massas para a sua tarefa? Na sua tática, vocês partem da ideia de que em quatorze dias, se a população de Berlim sair às ruas, se pode fazer em Berlim um novo governo. “Em quatorze dias fazemos aqui um novo governo.” Eu me alegraria se esse fosse o caso. Mas como político sério não posso construir minha tática sobre especulações. Evidentemente, tudo é possível. Mostrarei a vocês que sobretudo com a nova mudança no governo, a próxima fase trará consigo um fortíssimo conflito. Todavia, sou obrigada a trilhar os caminhos provenientes de minha concepção sobre a situação alemã. As tarefas são imensas e desembocam na revolução socialista mundial. Mas o que vimos até agora na Alemanha ainda é a imaturidade das massas. Nossa próxima tarefa consiste em formar as massas, em cumprir essa tarefa. Queremos chegar a isso por meio do parlamentarismo. A palavra deve decidir. Digo a vocês que justamente em virtude da imaturidade das massas, que até agora não souberam levar à vitória o sistema conselhista, a contra-revolução conseguiu erigir contra nós a Assembléia Nacional como um bastião. Agora o nosso caminho passa por esse bastião. Tenho o dever, tenho toda razão de me opor a ele, de lutar contra esse bastião, entrar na Assembléia Nacional e bater com o punho na mesa, a vontade do povo é a suprema lei. Aqui temos que decidir. Quando a massa estiver madura, o montinho, a minoria formada para dominar, eles vão nos entregar o poder; serão expulsos do templo aqueles que nada têm que fazer ali, nossos adversários, a burguesia, os pequenos burgueses etc. Com isso eles não contam.

Vocês precisam ser consequentes. Por um lado, vocês espe­culam sobre uma tal maturidade da situação, sobre um tal poder revolucionário e consciência das massas que prometem, em quatorze dias, pôr no lugar da Assembléia Nacional um governo socialista; por outro, dizem que, se a Assembléia Nacional tiver êxito, a pressão das ruas irá varrê-la. Vocês não imaginam que se nós propusemos às massas não pôr o voto na urna as eleições serão diferentes. As eleições representam um novo instrumento da luta revolucionária. Vocês permanecem presos aos velhos modelos. Para vocês existe apenas o Parlamento do Reichstag alemão. Vocês não conseguem imaginar a utilização desse meio em sentido revolucionário. Vocês pensam: ou metralhadoras ou parlamentarismo. Nós queremos um radicalismo um pouco mais refinado, não apenas esse grosseiro ou…ou. Ele é mais confortável, mais simples, mas é uma simplificação que não serve para a formação nem para a educação das massas. 

De um ponto de vista puramente prático, será que vocês podem dizer, de consciência tranqüila, se decidirem pelo boicote — vocês, o melhor núcleo do operariado alemão, representantes da camada mais revolucionária — será que podem garantir, de consciência tranquila, que as grandes massas do operariado seguirão realmente suas palavras de boicote, que não participarão [das eleições]? Falo das grandes massas, não dos grupos que nos pertencem. É preciso considerar os milhões de homens, mulheres, jovens, soldados. Pergunto claramente se vocês podem dizer, de consciência tranqüila, caso decidamos aqui boicotar a Assembléia Nacional, que essas massas voltarão as costas às eleições, ou melhor, erguerão os punhos contra a Assembléia Nacional? Não podem afirmar isso de maneira tranquila. Nós conhecemos as circunstâncias que dominam as mas­ sas, o quanto ainda são imaturas. O fato é que vocês nos tiram a possibilidade, nós que queremos introduzir nessas cabeças o espírito revolucionário, de arrancar o poder à contra-revolução. Enquanto nós somos pela atividade em sentido revolucionário, vocês, sem cerimônia, voltam as costas às maquinações contra­ revolucionárias, entregam as massas às influências contra-revolucionárias. Vocês mesmos sentem que não podem fazer isso. 

De que maneira querem vocês influir nas eleições se de antemão dizem que as consideramos sem importância? Precisamos mostrar às massas que não há melhor resposta à resolução contra-revolucionária contra o sistema conselhista do que realizar uma poderosa manifestação dos eleitores, elegendo justamente pessoas que são contra a Assembléia Nacional e a fa­vor do sistema conselhista. Esse é o método ativo que permite dirigir contra o peito do adversário a arma apontada contra nós. Vocês têm que compreender que aquele que levanta contra nós a suspeita de oportunismo, por causa da pressão de tempo e de trabalho, não teve tempo de examinar, com vagar e profundida­de, quer a sua quer a nossa proposta.

Trata-se apenas de ver qual o método mais adequado para o objetivo comum de esclarecer as massas. Fique sabendo, camarada Rühle, que nesta sala não há nenhum oportunismo! Existe uma profunda contradição na sua própria argumentação quando o senhor diz que eu temo as prejudiciais consequências do parlamentarismo sobre as massas. Por um lado, o senhor está tão seguro da maturidade revolucionária das massas que acredita já instalar aqui, em quatorze dias, um governo socialista; acredita, portanto, na vitória imediata e definitiva do socialismo. Por outro, o senhor teme, para as mesmas massas, tão maduras, as perigosas consequências das eleições. Quero dizer-lhe com franqueza que eu, em geral, não temo nada. Estou convencida de que a massa, desde o princípio e graças a todas as circunstâncias, nasceu e foi criada para isso, estou convencida de que ela compreenderá corretamente a nossa tática. Precisamos educar as massas no espírito da nossa tática para que saibam utilizar o instrumento das eleições não como uma arma da contra-revolução, mas como massas com consciência de classe, revolucionárias, para aniquilar, com a mesma arma, aqueles que a empurraram para as nossas mãos.

Concluo com a formulação: entre nós, no que se refere aos fins e às intenções, não há nenhuma diferença; estamos todos sobre o mesmo terreno, combatendo a Assembléia Nacional como um bastião da contra-revolução, querendo chamar e educar as massas para aniquilar a Assembléia Nacional. Põe-se a questão da conveniência e dos melhores métodos. O vosso é mais simples, mais confortável, o nosso é um pouco mais complicado’. e justamente por isso considero-o capaz de aprofundar o revolucionamento intelectual (geistige Revolutionierung) das massas. Além disso, a vossa tática especula sobre a precipitação dos acontecimentos nas próximas semanas, a nossa encara o caminho ainda longo da educação das massas. Nossa tática leva em conta as próximas tarefas ligadas às tarefas da iminente revolução como um todo, até que as massas proletárias alemãs estejam maduras para segurar as rédeas. Vocês lutam contra moinhos de vento ao atribuir-me tais argumentos. Precisaremos recorrer às ruas, nossa tática apoia-se no fato de que nas ruas desenvolvemos a ação principal. Isso prova então que ou vocês querem usar metralhadoras ou querem entrar no Parlamento alemão. Ao contrário! A rua deve, em toda parte, dominar e triunfar. Queremos colocar dentro da Assembléia Nacional um sinal vitorioso, apoiado na ação exterior. Queremos explodir este bastião de dentro para fora. Queremos a tribuna da Assembléia Nacional e também as das assembléias dos eleitores. Quer decidam assim quer de outro modo, vocês estão conosco sobre um terreno comum, o terreno da luta revolucionária contra a Assembléia Nacional.

lI Discurso contra uma organização econômico política unificada do movimento operário

Camaradas! Não só não lamento que no atual debate se apresente o assim chamado debate sindical, mas, ao contrário, congratulo-me com ele. É compreensível que, no momento em que enfrentamos a tarefa de tratar dos problemas econômicos imediatamente, tropecemos na enorme trincheira erguida à nossa frente pelos sindicatos. A questão da luta pela emancipação é idêntica à questão da luta contra os sindicatos. Temos dez vezes mais razões para isso na Alemanha do que em outros países. Pois a Alemanha foi o único país em que durante os quatro anos da guerra não ocorreu nenhum movimento salarial, e isso como consequência de palavras de ordem dos sindicatos. Mesmo que os sindicatos não tivessem feito mais nada, só por isso mereceriam desaparecer. Durante a guerra e a revolução até agora os sindicatos oficiais revelaram-se uma organização do Estado burguês e da dominação de classe capitalista. Por isso, é evidente que a luta pela socialização na Alemanha precisa, em primeiro lugar, tratar de liquidar os obstáculos erguidos pelos sindicatos contra a socialização. De que maneira se poderá levar a cabo essa liquidação? Que estrutura positiva deve ser posta no lugar dos sindicatos?

Devo pronunciar-me contra a sugerem dos camaradas de Bremen que, na sua moção,4 propõem uma assim chamada or­ganização unificada. Eles não perceberam uma coisa. É hora de formar os conselhos de operários e soldados como portadores de todas as necessidades políticas e econômicas e como órgãos de poder da classe operária. Este é, em primeiro lugar, o ponto de vista correto para os órgãos de luta econômica.

Nos Princípios5 encontra-se exposta uma ideia diretriz: os conselhos de operários são chamados a dirigir e fiscalizar as lutas econômicas a partir das próprias fábricas. Conselhos de fábrica, eleitos por delegados de fábrica, em conexão com os conselhos operários, saídos igualmente das fábricas, unidos na cúpula dos conselhos econômicos do Reich. Vocês verão que os Princípios não têm outro resultado senão um completo esvaziamento de todas as funções dos sindicatos. (Aplausos). Nós expropriamos os sindicatos das funções que lhes foram confiadas pelos operários e das quais se desviaram. Substituímos os sindicatos por um novo sistema de bases totalmente novas. Os camaradas que propagam a organização unificada parecem imbuídos da ideia…6

Esses eram meios e caminhos que se podiam seguir antes da revolução. Hoje precisamos concentrar-nos no sistema dos conselhos de operários, e não associar as organizações por meio de combinações das velhas formas, sindicato e partido, mas erigi-las sobre uma base totalmente nova. Conselhos de fábrica, conselhos de operários, e, numa ascensão contínua, uma estrutura totalmente nova, que nada tem em comum com as tradições antigas e ultrapassadas.

Não se trata de aceitar, no último momento, a moção de Bremen e Berlim.7 Igualmente, a palavra de ordem de saída do sindicatos tem uma pequena dificuldade para mim. Onde ficam os recursos colossais que se encontram nas mãos daqueles senhores? Esta é apenas uma pequena questão prática. Eu não gostaria de que na liquidação dos sindicatos os vários aspectos fossem esquecidos, e não gostaria de uma cisão em que talvez uma parte dos recursos do poder ainda ficasse naquelas mãos.

Concluo com a moção: peço-lhes gue enviem as moções aqui apresentadas à mesma comissão econômica que redigiu os Princípios. Ela foi eleita pelos conselhos de operários e soldados que se encontram no terreno da Liga Spartakus, e trabalha com a participação de membros da central spartakista. Ela não se sente autorizada a elaborar resoluções definitivas, mas redigiu os Princípios para apresentá-los aos camaradas em todo o país. Os membros [da comissão] devem fazer que tudo seja erigido sobre a base mais ampla e democrática, que cada indivíduo participe. Então estaremos seguros de que aquilo que foi criado é fruto maduro da luta. Peço-lhes que considerem as sugestões apenas como tais, que as enviem à comissão econômica e que submetam as diretrizes aos membros [da comissão].

III Nosso programa e a situação política

A tarefa que hoje enfrentamos — discutir e adotar nosso programa8 — vai além da circunstância formal de que ontem nos constituímos em um novo partido autônomo e que um novo partido precisa oficialmente adotar um programa; a discussão de hoje sobre o programa é motivada por grandes acon­tecimentos históricos, sobretudo pelo fato de que nos encontramos num momento em que o programa social-democrata — programa socialista do proletariado — deve ser erigido em novas bases. Camaradas, retomamos assim a trama urdida por Marx e Engels no Manifesto comunista há exatamente setenta anos. Como vocês sabem, o Manifesto comunista considera o socialismo, a realização dos objetivos socialistas, a tarefa imediata da revolução proletária. Foi a concepção que Marx e Engels defenderam na revolução de 1848 e que consideravam igualmente como base da ação proletária em sentido internacional. Ambos acreditavam então — assim como todos os dirigentes do movimento proletário — que se estava perante a tarefa imediata de introduzir o socialismo; que bastava realizar a revolução política, apoderar-se do poder político estatal para que o socialismo imediatamente se tornasse carne e osso. Posteriormente, como vocês sabem, os próprios Marx e Engels revisaram totalmente esse ponto de vista. Eis o que dizem de sua própria obra no primeiro prefácio, que ainda assinaram juntos, para a edição do Manifesto comunista de 1872 (reproduzido na edição de 1894):

Atualmente, essa passagem [o fim do capítulo II, isto é, as medidas práticas a serem tomadas para realizar o socialismo] seria hoje diferente em muitos aspectos. Tendo em vista o imenso desenvolvimento da grande indústria nos últimos 25 anos e, com ele, o progressivo desenvolvimento da organização da classe operária em partido; tendo em vista as experiências práticas, primeiro da revolução de fevereiro e depois, sobretudo, da Comuna de Paris, que pela primeira vez permitiu ao proletariado durante dois meses a posse do poder político, esse programa está hoje obsoleto em alguns pontos. A Comuna, especialmente, demonstrou que “a classe operária não pode simplesmente se apoderar da máquina estatal já pronta e colocá-la em movimento para seus próprios fins”.9

E que diz essa passagem considerada obsoleta? Lemos o seguinte na p.23 do Manifesto comunista:

O proletariado utilizará seu domínio político para arrancar pouco a pouco todo o capital à burguesia, para centralizar todos os instrumentos nas mãos do Estado, ou seja, do proletariado organizado como classe dominante, e para aumentar o mais rapidamente possível a massa das forças produtivas.

Isso naturalmente só poderá ser realizado, no princípio, por uma intervenção despótica no direito de propriedade e nas relações burguesas de produção, isto é, por medidas que parecem economicamente insuficientes e insustentáveis mas que, no curso do movimento, ultrapassam a si mesmas e são inevitáveis como meios para revolucionar todo o modo de produção.

Tais medidas, é claro, serão diferentes nos diferentes países.

Contudo, nos países mais avançados, as seguintes medidas poderão geralmente ser aplicadas:

  1.  Expropriação da propriedade fundiária e emprego da renda da terra nas despesas do Estado.
  2.  Imposto fortemente progressivo.
  3.  Abolição do direito de herança.
  4.  Confisco da propriedade de todos os emigrados e rebeldes.
  5.  Centralização do crédito nas mãos do Estado, por meio de um banco nacional com capital do Estado e monopólio exclusivo.
  6.  Centralização dos meios de transporte nas mãos do Estado.
  7.  Multiplicação das fábricas nacionais e dos instrumentos de produção; cultivo e melhoramento das terras segundo um plano comum.
  8.  Trabalho obrigatório igual para todos; constituição de exércitos industriais, especialmente para a agricultura.
  9. Unificação dos serviços agrícolas e industriais; medidas tendentes a eliminar gradualmente as diferenças entre cidade e campo. 
  10. Educação pública e gratuita de todas as crianças. Eliminação do trabalho das crianças nas fábricas em sua forma atual. Combinação da educação com a produção material etc.10

Como vocês vêem, exceto por alguns detalhes, essas são as mesmas tarefas com que hoje imediatamente nos defrontamos: a execução, a realização do socialismo. Setenta anos separam o atual momento do tempo em que esse programa foi estabelecido; e a dialética histórica levou-nos hoje de volta à concepção que Marx e Engels haviam abandonado por considerá-la errada. Eles tinham então boas razões para considerá-la errada e abandoná-la. O desenvolvimento do capitalismo que, entretanto, ocorreu fez que o erro de outrora hoje seja verdade, e hoje é tarefa imediata realizar o que Marx e Engels enfrentavam em 1848. Contudo, entre aquele ponto do desenvolvimento, o início e a nossa concepção e tarefas atuais, existe todo o desenvolvimento não apenas do capitalismo, mas também do movimento proletário socialista e, em primeiro lugar, do movimento operário na Alemanha, país guia do proletariado moderno. Esse desenvolvimento ocorreu numa forma singular. Após as decepções da revolução de 1848 em que Marx e Engels abandonaram o ponto de vista segundo o qual o proletariado se encontrava na situação de poder, imediata e diretamente, realizar o socialismo, nasceram em todos os países partidos socialistas, social­ democratas que adotaram um ponto de vista totalmente diferente. Proclamou-se como tarefa imediata a luta cotidiana no plano econômico e político para, pouco a pouco, formar os exércitos do proletariado, que seriam chamados a realizar o socialismo quando o desenvolvimento socialista tivesse alcançado a maturidade. Essa reviravolta, essa base totalmente diferente sobre a qual o programa socialista foi estabelecido adquiriu, sobretudo na Alemanha, uma forma bastante atípica. Na Alemanha, até o colapso do 4 de agosto, predominava na social-democracia o programa de Erfurt em que as chamadas tarefas mínimas urgentes ficavam em primeiro plano e o socialismo era transformado numa longínqua estrela brilhante, em objetivo final. Porém, mais importante do que aquilo que está escrito no Programa é a maneira viva pela qual é compreendido; e a compreensão do Programa era determinada por um documento importante para a história do nosso movimento operário, a saber, o prefácio que Friedrich Engels escreveu em 1895 para a Luta de classes na França. Camaradas, não é apenas por interesse histórico que examino essas questões; pelo contrário, é uma questão bem atual e um dever histórico que nos incumbe, ao pormos nosso Programa no terreno em que Marx e Engels se encontravam em 1848. Em virtude das transformações entretanto introduzidas pelo desenvolvimento histórico temos o dever de fazer, de maneira clara e consciente, uma revisão ante a concepção predominante na social-democracia alemã até o colapso do 4 de agosto. É aqui que essa revisão deve ser oficialmente feita.

Camaradas, como entendeu Engels a questão naquele famoso prefácio escrito em 1895 à Luta de classes na França, de Marx, portanto já depois da morte de Marx? Voltando a 1848, ele mostrou, em primeiro lugar, que a concepção segundo a qual a revolução seria iminente tornara-se obsoleta. Em seguida, continua sua descrição:

A história não nos deu razão, nem a nós nem a todos que como nós pensavam. Ela mostrou que o grau de desenvolvimento econômico no continente ainda estava então muito pouco maduro para permitir a eliminação da produção capitalista; mostrou-o por meio da revolução econômica que desde 1848 se estendeu a todo continente, implantou a grande indústria na França, Áustria, Hungria, Polônia e recentemente na Rússia, fazendo mesmo da Alemanha um país industrial de ponta — tudo isso em bases capi­talistas, ainda perfeitamente suscetíveis de expansão em 1848.¹¹

Expõe em seguida como a partir daquela época tudo mudou e aborda a questão das tarefas do partido na Alemanha:

A guerra de 1870-1871 e a derrota da Comuna deslocaram provisoriamente, como Marx havia predito, o centro de gravidade do movimento operário europeu da França para a Alemanha. A França precisou evidentemente de anos para se refazer da sangria de maio de 1871. Na Alemanha, em contrapartida, onde a indústria, favorecida pela bênção dos bilhões franceses, se ­ desenvolvia verdadeiramente como numa estufa e sempre mais rapidamente, a social-democracia crescia de maneira bem mais rápida e constante. Graças à inteligência dos operários alemães na utilização do sufrágio universal introduzido em 1866, o espantoso crescimento do partido manifestou-se aos olhos do mundo inteiro com números indiscutíveis. (ibidem, p.517)

Segue-se a célebre enumeração, descrevendo nosso crescimento de uma eleição a outra para o Reichstag, até chegarmos aos milhões de votos, e Engels conclui:

Graças a esta eficaz utilização do sufrágio universal, uma forma de luta do proletariado, inteiramente nova, foi posto em ação e continuou a desenvolver-se rapidamente. Descobriu-se que as instituições estatais, nas quais se organiza a dominação da burguesia, oferecem novas oportunidades para que a classe operária possa combater essas mesmas instituições estatais. Par­ticipou-se das eleições para certas Dietas, conselhos municipais, conselhos de notáveis, disputou-se à burguesia cada uma de suas posições em que uma boa parte do proletariado tinha algo a dizer. E assim o governo e a burguesia chegaram a temer mais a ação legal que a ação ilegal do partido operário, seus êxitos nas eleições mais que os da rebelião. (ibidem, p.519)

E aqui Engels começa uma crítica detalhada da ilusão segundo a qual, nas modernas condições do capitalismo, o proletariado poderia obter qualquer coisa nas ruas, com a revolução. Na medida em que estamos em plena revolução, uma revolução de rua com tudo o que ela comporta, penso que já é tempo de polemizar com uma concepção que oficialmente até o último minuto era habitual na social-democracia e que é co-responsável pelo que passamos em 4 de agosto de 1914. (“Muito bem!”)

Não quero dizer com isso que Engels com as suas declarações compartilhe pessoalmente a culpa pela evolução que se produziu na Alemanha; digo apenas: aqui está um documento clássico que resume a concepção de que vivia a social-democracia alemã, ou melhor, que a matou. Aqui, camaradas, Engels expõe, com todo o conhecimento especializado de que dispunha no domínio da ciência militar, que, no estado atual desenvolvimento do militarismo, da indústria e das grandes cidades, era pura ilusão acreditar que o povo trabalhador pudesse fazer revoluções de rua e vencer. Essa refutação teve duas consequências: primeiro, a luta parlamentar foi considerada como a antítese da ação revolucionária direta do proletariado e quase como o único meio da luta de classes. Essa crítica teve como resultado o parlamentarismo puro e simples. Segundo, considerou-se, curiosamente, que a mais poderosa organização do Estado de classes, o militarismo, a massa dos proletários uniformizados, devia ser de antemão imune e inacessível a toda influência socialista. E quando o prefácio diz que seria insensato pensar que, com o atual desenvolvimento de exércitos gigantescos, o proletariado pudesse enfrentar soldados equipados com metralhadoras e com os mais recentes meios técnicos de combate, parte claramente do pressuposto de que todo soldado deve permanecer, de antemão e para sempre, um sustentáculo das classes dirigentes. Do ponto de vista da experiência atual e no homem que se encontrava à cabeça do nosso movimento, esse erro seria incompreensível se não se soubesse em que circunstâncias efetivas nasceu o documento histórico mencionado. Em consideração a nossos dois grandes mestres e sobretudo a Engels que, tendo falecido muito mais tarde, defendia a honra e as opiniões de Marx, é preciso declarar que Engels, como se sabe, escreveu esse prefácio sob a pressão direta da fração parlamentar daquele tempo. Era a época em que na Alemanha — após o fim das leis anti-socialistas no início dos anos 90 — uma forte corrente radical de esquerda se manifestava no interior do movimento operário alemão, procurando preservar os camaradas da total absorção numa luta puramente parlamentar. Para derrotar os elementos radicais na teoria e submetê­ los na prática, para que graças à autoridade dos nossos grandes mestres as massas deixassem de prestar-lhes atenção, Bebel¹² e camaradas (exemplo típico do que já era na época nossa situação: a fração parlamentar decidia, do ponto de vista intelectual e tático, sobre os destinos e tarefas do partido) forçaram Engels, que vivia no exterior e devia confiar nas suas afirmações, a redigir esse prefácio, uma vez que, segundo eles, era absolutamente necessário salvar o movimento operário alemão dos desvios anarquistas. Desde então, essa concepção dominou a conduta da social-democracia alemã até nossa bela experiência de 4 de agosto de 1914. Foi a proclamação do parlamentarismo puro e simples. Engels não chegou a presenciar os resultados, as consequências práticas da utilização do seu prefácio, da sua teoria. Tenho certeza de que quando se conhecem as obras de Marx e Engels, quando se conhece o espírito revolucionário vivo, legítimo, autêntico que se manifesta em seus ensinamentos e em seu.s escritos, fica-se convencido de que Engels teria sido o primeiro a protestar contra os abusos resultantes do parlamentarismo puro e simples, contra essa corrupção, essa degradação do movimento operário tal como ocorreu na Alemanha décadas antes do dia 4 de agosto — pois 4 de agosto não caiu do céu como se fosse uma viragem inesperada, mas foi uma consequên­cia lógica do que vivemos, dia após dia, ano após ano (“Muito bem!”); Engels e Marx — se estivessem vivos — teriam sido os primeiros a protestar com todas as forças contra isso,a frear brutalmente o veículo para que não caísse no pântano. Mas Engels morreu no mesmo ano em que escreveu seu prefácio. Nós o perdemos em 1895; desde então, infelizmente, a direção teórica passou das mãos de Engels às de um Kautsky, e assistimos ao seguinte fenômeno: todo protesto contra o parlamentarismo puro e simples, o protesto vindo da esquerda a cada congresso do partido, sustentado por um grupo maior ou menor de camaradas em luta encarniçada contra a corrupção cujas funestas conseqüências deviam aparecer a cada um, todos esses protestos foram tachados de anarquismo, anarco-socialismo ou no mínimo de antimarxismo. O marxismo oficial devia servir de cobertura para todas as hesitações, para todos os desvios em relação à verdadeira luta de classes revolucionária, para todas as meias medidas que condenavam a social-democracia alemã e sobretudo o movimento operário, inclusive o movimento sindical, a definhar nos limites e sobre o solo da sociedade capita­lista, sem que houvesse a menor aspiração a sacudir a sociedade, a tirá-la dos eixos.

Camaradas, hoje vivemos o momento em que podemos dizer: retornamos a Marx, retornamos à sua bandeira. Ao declararmos hoje no nosso programa que a nossa tarefa imediata outra não é senão — resumida em poucas palavras — fazer do socialismo uma verdade e um fato e destruir radicalmente o capitalismo, pomo-nos no terreno em que Marx e Engels se encontravam em 1848 e cujos princípios nunca abandonaram. Vê-se agora o que é o verdadeiro marxismo e o que era esse sucedâneo de marxismo (“Muito bem!”) que, sob o nome de marxismo oficial, ocupou tanto espaço na social-democracia alemã. Vejam pelos representantes desse marxismo a que ponto ele atualmente caiu: a assessor e adjunto dos Ebert, David¹³ e consortes. Vemos aí os representantes oficiais da doutrina que, durante dezenas de anos, nos foi apresentada como o marxismo verdadeiro, autêntico. Não, o marxismo não levava a isso, a fazer política contra-revolucionária junto com os Scheidemann (mit den Scheidemännern).14 O verdadeiro marxismo combate igualmente aqueles que procuravam falsificá-lo; como uma toupeira, solapou os alicerces da sociedade capitalista e fez que hoje a melhor parte do proletariado alemão marchasse sob a nossa bandeira, a bandeira tempestuosa da revolução; e mesmo do outro lado, ali onde a contra-revolução parece ainda dominar, temos partidários, futuros camaradas de luta.

Assim, camaradas, conduzidos pela marcha da dialética histórica e enriquecidos pela experiência do desenvolvimento capitalista dos últimos setenta anos, encontramo-nos, como já disse, no ponto em que se encontravam Marx e Engels em 1848, quando desfraldaram pela primeira vez a bandeira do socialismo internacional. Acreditava-se então, quando da revisão dos erros e ilusões de 1848, que o proletariado ainda tinha um longo caminho a percorrer até que o socialismo pudesse tornar-se realidade. Evidentemente os teóricos sérios não trataram nun­ ca de fixar uma data obrigatória e certa para o colapso do capitalismo; porém supunha-se vagamente que o caminho seria ainda muito longo, justamente o que exprime cada linha do prefácio escrito por Engels em 1895. Mas agora podemos fazer o balanço. Não foi um curtíssimo lapso de tempo em comparação com o desenvolvimento das antigas lutas de classe? Setenta anos de desenvolvimento do grande capitalismo bastaram para que hoje possamos pensar seriamente em eliminar o capitalismo da face da Terra. E mais: não somente somos hoje capazes de resolver essa tarefa, não somente é nosso dever para com o proletariado, como a sua solução constitui hoje a única salvação para a sobrevivência da sociedade humana. (Calorosa aprovação.)

Será que esta guerra, camaradas, deixou alguma outra coisa da sociedade burguesa que não um enorme monte de ruínas? Formalmente o conjunto dos meios de produção e mesmo nu­ merosos instrumentos do poder, quase todos os instrumentos decisivos do poder, encontram-se ainda nas mãos das classes dominantes. Não nos enganemos a esse respeito. Mas o que elas podem fazer com isso, fora tentativas obstinadas de restabelecer a exploração com um banho de sangue, não passa de anarquia. Elas foram tão longe que hoje o dilema enfrentado pela humanidade é: queda na anarquia ou salvação pelo socialismo. Os resultados da guerra mundial põem as classes burguesas na impossibilidade de encontrar uma saída no terreno da sua dominação de classe e do capitalismo. E é assim que podemos verificar a verdade que precisamente Marx e Engels formularam pela primeira vez num grande documento, o Manifesto comunista, como base científica do socialismo: o socialismo se tornará uma necessidade histórica, no mais estrito sentido da palavra que hoje nós vivenciamos. O socialismo tornou-se uma necessidade, não apenas porque o proletariado não está mais disposto a viver nas condições materiais oferecidas pelas classes capitalistas, mas também porque estamos todos ameaçados de desaparecer se o proletariado não cumprir seu dever de classe, realizando o socialismo. (Calorosa aprovação.)

Camaradas, essa é a base geral sobre a qual foi elaborado o programa que hoje adotamos oficialmente e de cujo projeto vocês tinham tomado conhecimento na brochura O que quer a Liga Spartakus?. Ele encontra-se em oposição consciente à separação entre reivindicações imediatas da luta política e econômica, chamadas de reivindicações mínimas, e o objetivo final socia­ l ist a, como programa máximo. Em oposição consciente a isso, liquidamos hoje os resultados dos últimos setenta anos de desenvolvimento e sobretudo o resultado imediato da guerra, dizendo: para nós, agora, não existe programa mínimo nem pro­ grama máximo; o socialismo é uma única e mesma coisa – isso é o mÍnimo que temos que realizar hoje. (“Muito bem!”)

Não me estenderei aqui no que diz respeito às medidas de­ talhadas que propusemos no nosso projeto de programa, pois vocês têm a possibilidade de tomar posição sobre cada uma delas e comentá-las aqui detalhadamente nos levaria muito longe. Considero como minha tarefa assinalar e formular apenas os grandes traços gerais que distinguem nossa tomada de posição programática daquela existente até hoje, a da assim chamada social-democracia alemã oficial. Em contrapartida, conside­ro mais importante e mais urgente pormo-nos de acordo sobre a maneira de avaliar as circunstâncias concretas, a maneira de configurar as tarefas táticas, as palavras de ordem práticas que decorrem da situação política de acordo com a concepção que tentei caracterizar, segundo a qual a realização do socialismo constitui a tarefa imediata cuja luz deve guiar todas as medidas, todas as tomadas de posição de nossa parte.

Camaradas, creio poder dizê-lo com orgulho, nosso Congresso é o congresso constitutivo do único partido socialista revolucionário do proletariado alemão. Este Congresso coincide, por acaso, ou melhor, para falar com precisão, não por acaso, com uma guinada no desenvolvimento da própria revolução alemã. Pode-se dizer que com os acontecimentos dos últimos dias encerrou-se a fase inicial da revolução alemã, que entramos agora num segundo estágio, mais avançado, do desenvolvimento; é dever de todos nós e ao mesmo tempo fonte de um melhor e mais profundo conhecimento para o futuro fazer nossa autocrítica, fazer um exame crítico aprofundado do que realizamos, do que criamos e do que negligenciamos; isso nos permitirá adquirir pontos de apoio para o nosso procedimento futuro. Lancemos um olhar perscrutador sobre a primeira fase da revolução que acabou de se encerrar.

Seu ponto de partida foi o 9 de novembro. O 9 de novembro foi uma revolução cheia de insuficiências e fraquezas. Não é de admirar. Essa revolução chegou após quatro anos de guerra, após quatro anos no decorrer dos quais, graças à educação da social-democracia e dos sindicatos livres, o proletariado alemão revelou uma dose de infâmia e de renegação de suas tarefas socialistas sem igual em nenhum outro país. Se nos pusermos sobre o terreno do desenvolvimento histórico — e é justamente o que fazemos como marxistas e socialistas –, não podemos esperar ver surgir de repente, em 9 de novembro de 1918, uma revolução grandiosa, com consciência de classe e dos fins a atingir, numa Alemanha que ofereceu a terrível imagem do 4 de agosto e dos quatro anos que se seguiram; o que o 9 de novembro nos fez viver foi muito mais o colapso do imperialismo existente do que a vitória de um princípio novo. (Aprovação.) Simplesmente havia chegado o momento em que o imperialismo, colosso de pés de barro, apodrecido por dentro, tinha que desabar; e o que se seguiu foi um movimento mais ou menos caótico, sem plano, pouquíssimo consciente, no qual o único vínculo unificador, o único princípio constante, libertador, era resumido na palavra de ordem: formação dos conselhos de operários e soldados. Era a palavra-chave desta revolução que lhe conferiu imediatamente o caráter especial de revolução socialista proletária — apesar das insuficiências e fraquezas do primeiro momento; e quando vieram com calúnias contra os bolcheviques russos, nunca deveremos esquecer de responder: onde aprenderam vocês o abc da atual revolução? Com os russos, com os conselhos de operários e soldados (Aprovação.); e aquela gentinha que hoje, à cabeça do “governo socialista”, considera como sua função, de mãos dadas com o imperialismo inglês, assassinar traiçoeiramente os bolcheviques russos, apóia-se formalmente nos conselhos de operários e soldados e é obrigada a reconhecer que foi a revolução russa a emitir as primeiras palavras de ordem da revolução mundial. Podemos dizer com segurança – e isso resulta por si mesmo de toda a situação: qualquer que seja o país, depois da Alemanha, em que a revolução proletária estoure, seu primeiro gesto será a formação de conselhos de operários e soldados. (“Muito bem!”)

É justamente nisso que consiste o vínculo que unifica internacionalmente a nossa ação, é a palavra-chave que separa fundamentalmente a nossa revolução de todas as revoluções burguesas anteriores; é bem característico das contradições dialéticas em que esta revolução se move, aliás como todas as revoluções, que em 9 de novembro, quando deu seu primeiro grito, seu grito de nascimento por assim dizer, ela tenha encontrado a fórmula que nos conduzirá ao socialismo: conselhos de operários e soldados — uma fórmula que agrupou todo mundo. A revolução encontrou instintivamente essa fórmula, apesar de 9 de novembro estar situada muito aquém dela. Em razão das insuficiências, das fraquezas, por falta de iniciativa pessoal e de clareza sobre as tarefas a realizar, ela deixou escapar, somente dois dias após a revolução, a metade dos instrumentos de poder que havia conquistado em 9 de novembro. Isso mostra, por um lado, que a revolução atual está submetida à lei toda-poderosa da necessidade histórica, o que nos garante que alcançaremos nosso objetivo passo a passo, apesar de todas as dificuldades, complicações e fraquezas pessoais; mas, por outro, ao confrontarmos essa palavra de ordem clara com as insuficiências da ordem prática à qual estava ligada, é preciso dizer que esses eram justamente os primeiros passos da revolução; ela terá que fazer um esforço poderoso e percorrer um longo caminho para crescer e realizar plenamente suas primeiras palavras de ordem. 

Camaradas, a primeira fase, que vai de 9 de novembro até estes últimos dias, é caracterizada por ilusões de todos os lados. A primeira ilusão do proletariado e dos soldados que fize­ram a revolução foi a da unidade sob a bandeira do “socialis­mo”. Nada pode caracterizar melhor as fraquezas internas da revolução de 9 de novembro do que o seu primeiro resultado: elementos que, duas horas antes da explosão da revolução, estimavam ter por função persegui-la (“Muito bem”), torná-la impossível, chegaram à cabeça do movimento — os Ebert-Scheidemann com Haase!15 A ideia da união das diferentes correntes socialistas no júbilo geral da unidade era a divisa da revolução de 9 de novembro — uma ilusão que devia vingar-se de forma sangrenta e com a qual deixamos de viver e de sonhar só nos últimos dias; mesma ilusão da parte dos Ebert-Scheidemann e mesmo dos burgueses — de todos os lados. Além disso, uma ilusão da burguesia ao fim desse estágio: ela esperava, na realidade, manter as massas com rédea curta e reprimir a revolução socialista graças à combinação Ebert-Haase, graças ao “governo socialista”; e uma ilusão de governo Ebert-Scheidemann, que esperava poder deter a luta de classes socialista das massas operárias com a ajuda das massas de soldados do front. Essas eram as diversas ilusões que explicam também os acontecimentos dos últimos tempos. Todas as ilusões desfizeram-se em nada. Viu-se que a aliança de Haase com Ebert-Scheidemann sob o emblema do “socialismo” não passava, na realidade, de uma folha de parreira sobre uma política puramente contra-revolucionária; e como em todas as revoluções, pudemos nos curar dessa ilusão. Existe um método revolucionário particular para curar o povo de suas ilusões, mas a cura é paga, infelizmente, com o sangue do povo. Nesta revolução exatamente como em todas as anteriores. O sangue das vítimas na Chausseestrasse em 6 de dezembro,16 o sangue dos marinheiros assassinados em 24 de dezembro17 marcaram a grande massa com o selo deste saber, desta verdade: o que vocês juntaram como se fosse um governo socialista nada mais é que um governo da contra­ revolução burguesa; quem continua a tolerar esse estado de coisas trabalha contra o proletariado e contra o socialismo. (“Muito bem!”)

Mas, camaradas, também se desfez a ilusão dos senhores Ebert-Scheidemann que esperavam ser capazes de subjugar duradouramente o proletariado com a ajuda dos soldados do front. Com efeito, qual foi o resultado de 6 e de 24 de dezembro? Todos pudemos perceber o profundo desencantamento das massas de soldados e o início de uma tomada de posição crítica em relação a esses mesmos senhores que queriam utilizá-los como bucha de canhão para reprimir qualquer movimento do proletariado socialista, e assistimos ao seguinte: várias casernas pedindo panfletos da Liga Spartakus. Camaradas, é o fim da primeira fase. As esperanças dos Ebert-Scheidemann de dominarem o proletariado com a ajuda dos soldados retrógrados já estão em grande parte abaladas. O que os espera num futuro próximo é verem propagar-se, mesmo nas casernas, uma concepção revolucionária cada vez mais clara, verem crescer assim o exército do proletariado em luta e enfraquecer-se o campo da contra-revolução. Mas resulta daí que mais alguém precisava perder as ilusões: a burguesia, a classe dirigente. Se vocês lerem os jornais dos últimos dias, após os eventos de 24 de de­ dezembro, constatarão um som nítido, claro, de decepção e indignação: os servos lá em cima mostraram-se inúteis. (“Muito bem!”)

Esperava-se que Ebert-Scheidemann se mostrassem os homens fortes, capazes de domar a fera. E que fizeram? Organizaram alguns putsche insuficientes dos quais a hidra da revolução, de cabeça erguida, saiu ainda mais resoluta. Portanto, desilusão recíproca de todos os lados! O proletariado perdeu toda ilusão sobre a aliança Ebert-Scheidemann-Haase governo “socialista”. Ebert-Scheidemann perderam a ilusão de poder subjugar por muito tempo os proletários de macacão com a ajuda do proleta­ riado em uniforme de soldado; e a burguesia perdeu a ilusão de poder enganar a respeito dos seus objetivos toda a revolução socialista na Alemanha por meio de Ebert, Scheidemann e Haase. Tudo não passa de uma conta negativa, farrapos visíveis de ilusões perdidas. Mas justamente o fato de só terem ficado esses miseráveis farrapos após a primeira fase da revolução constitui para o proletariado o maior dos ganhos, pois não há nada mais nocivo à revolução que as ilusões, nada mais útil que a verdade franca e clara. Posso referir-me aqui à opinião de um clássico do espírito alemão, que não era nenhum revolucionário do proletariado, mas um revolucionário intelectual da burguesia: falo de Lessing que, num de seus últimos escritos como bibliotecário em Wolfenbüttel, escreveu as seguintes palavras, no meu entender muito interessantes e simpáticas:

Não sei se é um dever sacrificar a felicidade e a vida pela verdade… Mas sei que é um dever, quando se quer ensinar a verdade, ensiná-la toda, ou então de jeito nenhum; ensiná-la claramente e sem rodeios, sem mistérios, sem reservas, sem desconfiar da sua força e da sua utilidade… Pois quanto mais grosseiro o erro, tanto mais curto e direto o caminho que conduz à verdade; em contrapartida, o erro refinado pode manter-nos eternamente afastados da verdade, tão difícil nos é reconhecê-lo como erro… Aquele que só pensa em vender a verdade sob toda espécie de máscaras e artifícios bem poderia ser seu rufião, nunca seu amante.

Camaradas, os senhores Haase, Dittmann18 etc. tentaram vender a revolução, a mercadoria socialista sob toda a espécie de máscaras e artifícios; revelaram-se os rufiões da contra-revolução. Hoje estamos livres dessas ambigüidades, a mercadoria está perante a massa do povo alemão sob a forma brutal, atarracada dos senhores Ebert e Scheidemann. Hoje nem mes­mo o mais idiota pode enganar-se: é a contra-revolução tal como existe na realidade.

Quais são as perspectivas futuras do desenvolvimento após termos passado a primeira fase? Não se trata evidentemente de profetizar, mas de tirar as consequências lógicas do que vivemos até agora e de deduzir daí os caminhos previsíveis do desenvolvimento próximo para assim orientar nossa tática, nosso método de luta. Camaradas, qual a continuação do caminho? Vocês têm um indício seguro, de uma cor pura e inalterada, nas últimas declarações do novo governo Ebert-Scheidemann. Em que direção pode mover-se o curso do “governo socialista” depois que todas as ilusões, como mostrei, desapareceram? Este governo perde, a cada dia, um pouco mais do seu apoio nas grandes mas­ sas do proletariado; atrás dele permanecem apenas, fora a pequena burguesia, restos, pobres restos de proletários, mas ainda não está muito claro por quanto tempo ficarão atrás de Ebert­ Scheidemann. Perderão cada vez mais o apoio das massas de soldados, pois os soldados passaram para o caminho da crítica, da autoconsciência; é certo que esse processo caminha lentamente, mas não pode parar antes da completa tomada de consciência socialista. Perderam o crédito perante a burguesia por não se terem mostrado suficientemente fortes. Em que direção, portanto, pode continuar o seu caminho? Acabarão completamente e bem rápido com a comédia da política socialista; se vocês lerem o novo programa desses senhores, verão que navegam a todo vapor para a segunda fase, a da contra-revolução aberta, e poderia mesmo dizer, para a restauração das condições precedentes, anteriores à revolução. Qual é o programa do novo governo? A eleição de um presidente que ocupará uma posição intermediária entre o rei da Inglaterra e o presidente da América (“Muito bem!”), quase um rei Ebert; e segundo, o restabelecimento do Conselho Federal (Bundesrat). Vocês puderam ler hoje as reivindicações particulares dos governos da Alemanha do sul que enfatizam o caráter federativo do império alemão.19 O restabelecimento do bom velho Conselho Federal e, claro, do seu apêndice, o Reichstag alemão, é apenas uma questão de semanas. Camaradas, os Ebert-Scheidemann passam assim para a linha da restauração pura e simples das condições anteriores a 9 de novembro. Mas com isso passaram para um plano inclinado e se encontrarão, com os membros quebrados, estendidos no fundo do abismo. Pois o restabelecimento das condições anteriores a 9 de novembro já fora ultrapassado em 9 de novembro, e hoje a Alemanha está a milhas de distância dessa possibilidade. Para conservar o apoio da única classe cujos verdadeiros interesses defende, a burguesia — apoio que os últimos acontecimentos afetaram vivamente –, o governo ver-se-á forçado a exercer uma política contra-revolucionária cada vez mais violenta. As reivindicações dos Estados do sul da Alemanha, publicadas hoje pelos jornais de Berlim’. exprimem claramente o desejo de ver, como é dito, estabelecer-se uma segurança reforçada do império alemão, o que significa, em bom alemão, o estado de sítio contra os “anarquistas”, os “putschistas”, os “bolcheviques”, portanto, contra os elementos socialistas. As circunstâncias obrigarão Ebert­ Scheidemann a recorrer à ditadura, com ou sem estado de sítio. Mas resulta disso que justamente o desenvolvimento produzido até hoje, a lógica dos próprios acontecimentos e a violência que pesa sobre os Ebert-Scheidemann levar-nos-ão a viver, na segunda fase da revolução, um conflito bem mais agudo, lutas de clas­ ses bem mais encarniçadas (“Muito bem!”), o que não era anteriormente o caso; um conflito bem mais agudo, não somente porque as fases políticas que enumerei até agora levam à retomada da luta entre revolução e contra-revolução, corpo a corpo, olhos nos olhos, sem ilusões, mas também porque uma nova chama, um novo incêndio, vindo das profundezas, propaga-se cada vez mais para o conjunto: as lutas econômicas.

Camaradas, é bem característico que o primeiro período da revolução, que vai, pode-se dizer até 1° de dezembro, e que descrevi — e devemos adquirir plena consciência disso –, tenha sido ainda uma revolução exclusivamente política; e nisso reside o primitivismo, a insuficiência, as meias medidas e a in consciência dessa revolução. Era o primeiro estágio de uma reviravolta cujas tarefas principais situam-se no campo econômico: a transformação radical das relações econômicas. Era ingênua, inconsciente como uma criança que tateia sem saber aonde vai,e tinha ainda, como disse, um caráter puramente político. Só nas últimas semanas é que as greves, de forma inteiramente espontânea, começaram a fazer-se notar. É preciso declarar desde agora: é da própria natureza desta revolução que as greves cresçam necessariamente cada vez mais, que se tornem o centro, o essencial da revolução. (“Muito bem!”) Ao ser uma revolução econômica, torna-se uma revolução socia­ lista. Mas a luta pelo socialismo só pode ser levada a cabo pelas massas, num combate corpo a corpo com o capitalismo, em cada empresa, opondo cada operário a seu patrão. Só assim será uma revolução socialista. 

Certamente, por falta de reflexão, tinha-se uma outra ideia da marcha das coisas. Pensava-se que bastava derrubar o antigo governo e substituí-lo por um governo socialista; publicar-se­-iam então decretos para instaurar o socialismo. Mais uma vez isso não passava de ilusão. O socialismo não é feito, não pode ser feito por decretos, nem mesmo de um governo socialista por mais perfeito que seja. O socialismo deve ser feito pelas massas, por cada proletário. É onde estão presos aos grilhões do capitalismo que os grilhões devem ser rompidos. Somente isso é socialismo, somente assim o socialismo pode ser feito.

E qual é a forma exterior da luta pelo socialismo? É a greve, e por isso vimos a fase econômica do desenvolvimento avançar para o primeiro plano, agora no segundo momento da revolu­ção. Gostaria de enfatizar aqui o que podemos dizer com orgulho e que ninguém contestará: nós da Liga Spartakus, o Partido Comunista Alemão, somos os únicos em toda a Alemanha a estar ao lado dos trabalhadores em greve e em luta. (“Muito bem!”) Vocês leram e viram em todas as ocasiões como o Partido Independente se comportou em relação às greves. Não havia absolutamente nenhuma diferença entre a posição do Vorwärts e a do Freiheit.20 Foi dito: vocês precisam ser laborio­sos, socialismo significa trabalhar muito. E diz-se isso enquanto o capital ainda tem as rédeas na mão! Não é assim que se faz socialismo, mas sim combatendo o capitalismo com toda a energia; todos defendem as exigências do capitalismo desde os piores reacionários até o Partido Independente, até o Freiheit, exceto apenas nosso Partido Comunista. Por isso, com esta exposição digo que todos aqueles, sem exceção, que não se situam no nosso terreno comunista revolucionário combatem as greves da maneira mais violenta.

Daí resulta o seguinte: não somente as greves se estenderão cada vez mais na próxima fase da revolução, como ocuparão o centro, o ponto nevrálgico da revolução, reprimindo as questões puramente políticas. Vocês verão que ocorrerá, na luta econômica, um enorme agravamento da situação. Pois com isso a revolução chega ao ponto em que a burguesia não entende mais a brincadeira. A burguesia pode permitir-se mistificações no plano político, onde uma mascarada ainda é possível, onde pessoas como Ebert-Scheidemann podem ainda apresentar-se sob uma etiqueta socialista, mas não onde aparece o lucro. Ela porá então o governo Ebert-Scheidemann perante a seguinte alternativa: acabar com as greves, suprimir a ameaça de estrangulamento que o movimento grevista faz pesar sobre ela, ou os senhores Ebert-Scheidemann serão postos fora do jogo. Penso também que as medidas políticas tomadas por eles bastarão para pô-los em breve fora do jogo. Ebert-Scheidemann sofrem particularmente por não terem sentido muita confiança da parte da burguesia. A burguesia refletirá antes de cobrir com o manto de arminho a rude figura de parvenu de Ebert. Se chegarmos a isso, dir-se-á que, no final das contas, não basta ter sangue nas mãos, mas que é preciso ter sangue azul nas veias (“Muito bem!”); se chegarmos a isso, dir-se-á: se queremos um rei, não precisamos de nenhum arrivista que nem sequer sabe comportar-se como rei. (Risos)

Assim, camaradas, os senhores Ebert-Scheidemann estimulam a expansão de um movimento contra-revolucionário. Mas assim como eles não extinguirão as labaredas da luta econômica de classe, que se elevam, seus esforços também não satisfarão a burguesia. Eles afundarão, ou para dar lugar a uma tentativa da contra-revolução que se concentra para uma luta desesperada em torno do senhor Groener,²¹ ou visando estabelecer uma ditadura militar declarada sob Hindenburg, ou eles deverão ceder a outras forças contra-revolucionárias.

Não se pode dizer nada preciso, não se podem fazer declarações positivas sobre o que deve vir. Mas pouco importam as formas exteriores, o momento em que ocorrerá isso ou aquilo; bastam-nos as grandes linhas do desenvolvimento futuro, e eis aonde elas nos conduzem: após a primeira fase da revolução, a da luta sobretudo política, vem uma fase de luta reforçada, intensificada, essencialmente econômica, e ao fim de um espaço de tempo mais ou menos longo, o governo Ebert-Scheidemann deve desaparecer no orco.

É igualmente difícil prever no que se transformará a Assembleia Nacional na segunda fase do desenvolvimento. Se ela se constituir, é possível que se torne uma nova escola para a educação da classe operária, mas também não está excluído que não haja nenhuma Assembléia Nacional; nada se pode prever. Quero apenas acrescentar, entre parênteses, para que compreendam a partir de que ponto de vista defendemos ontem a nossa posição: recusávamos apenas situar nossa tática sobre uma única alternativa. Não quero recomeçar as discussões, mas só dizer isto, para que nenhum de vocês ouvindo distraído tivesse a idéia: Ahah, eis uma nova canção! Encontramo-nos todos exatamente sobre o mesmo terreno que ontem. Não queremos que nossa tática em relação à Assembléia Nacional dependa de uma possibilidade, provável mas não necessária, de ver a Assembléia Nacional ir pelos ares: queremos fundá-la sobre todas as eventualidades, inclusive a da utilização revolucionária da Assembléia Nacional, caso ela se constitua. Mas, quer se constitua quer não, é indiferente; em todo caso, a revolução só pode ganhar.

E o que restará ao falido governo Ebert-Scheidemann ou a qualquer outro pretenso governo social-democrata no poder? Eu disse que a massa do proletariado já lhes escapou das mãos, que igualmente os soldados deixaram de ser utilizáveis como bucha de canhão contra-revolucionária. O que resta, pois, a esses pobres coitados para salvar a sua situação? Resta-lhes ainda uma chance; e se vocês leram hoje as notícias, camaradas, verão onde estão as últimas reservas que a contra-revolução alemã enviará contra nós se for preciso bater com força. Vocês todos leram que em Riga as tropas alemãs, de braços dados com os ingleses, marcham já contra os bolcheviques russos. Camaradas, tenho em mãos documentos que nos permitem ter uma visão de conjunto sobre o que se passa atualmente em Riga. A coisa toda provém do Alto Comando do 8º Exército, de comum acordo com o senhor August Winnig,²² social-democrata alemão e dirigente sindical. As coisas sempre foram apresentadas como se os pobres Ebert-Scheidemann fossem víti­mas da Entente. Mas já há semanas, desde o início da revolução, a tática do Vorwärts consistia em fazer crer que a Entente desejava sinceramente sufocar a revolução na Rússia, e foi assim que a própria Entente teve essa ideia. Constatamos aqui, apoiados em documentos, como isso foi feito à custa do proletariado russo e da revolução alemã. Num telegrama de 26 de dezembro, o tenente-coronel Buerkner, chefe do Estado-Maior do 8º Exército, dava a conhecer as negociações que levaram ao acordo de Riga. O telegrama em questão diz:

Em 23.12, a bordo do navio inglês Princess Margaret, houve uma conversa entre o delegado plenipotenciário do Reich, Winnig, e o representante do governo inglês, Monsanquet, outrora cônsul geral em Riga, para o qual também foi convocado o comandante alemão ou seu representante. Fui designado para participar. Objetivo da conversa: aplicação das condições de armistício. Decorrer da conversa: Inglês: Navios estacionados aqui devem vigiar apli­cação das condições. Em razão das condições de armistício será exigido o seguinte:

  1. Que os alemães mantenham nesta zona uma força de combate suficiente para manter os bolcheviques em xeque e não lhes permitir avançar além das suas posições atuais.

Mais adiante:

3. Uma exposição das presentes disposições para as tropas alemãs e letãs que combatem os bolcheviques deve ser enviada ao Estado-Maior britânico para que o decano dos oficiais de marinha tome conhecimento dela. Todas as disposições futuras concernentes às tropas que devem combater os bolcheviques serão comunicadas por esse mesmo oficial.

4. Uma força militar suficiente deve ser mantida armada nos seguintes pontos, para evitar sua ocupação pelos bolcheviques ou seu avanço sobre a linha geral ligando os seguintes lugares: Walk, Wolmar, Wenden, Friedrichstadt, Pensk, Mitau.

5. A via férrea entre Riga e Libau deve ser assegurada contra ataques bolcheviques; todas as provisões e o correio brit ânico que utilizam este trecho devem ter preferência.

Segue-se uma série de reivindicações. E eis a resposta do senhor Winnig, plenipotenciário do Reich alemão: “Não é certamente habitual querer coagir um governo a ocupar um Estado estrangeiro, mas neste caso preciso é o nosso mais caro desejo”, declara o senhor Winnig, o dirigente sindical alemão!, “pois trata-se de proteger o sangue alemão” — os barões bálticos — “e sentimo-nos também moralmente obrigados a ajudar um país que libertamos da situação estatal anterior. Mas nossos esforços foram dificultados, primeiro pelo estado das tropas submetidas à influência do efeito das condições de armistício: elas não querem mais combater mas voltar para casa, sendo compostas, além disso, de velhos inválidos de guerra; segundo, pela atitude dos governos daqui” — trata-se dos governos letões — “que apresentam os alemães como seus opressores. Esforçamo-nos para criar formações voluntárias e combativas, o que, em parte, já foi conseguido.”

É contra-revolução o que se faz aqui. Vocês foram informa­dos, há algum tempo, sobre a formação da “Divisão de Ferro”, destinada expressamente a lutar contra os bolcheviques nos países bálticos.²³ Não era clara a posição do governo Ebert-Scheidemann a esse respeito. Vocês sabem agora que foi esse mesmo governo que propôs isso.

Camaradas, ainda uma pequena observação sobre Winnig. Podemos tranqüilamente dizer que os dirigentes sindicais alemães — não é nenhum acaso que um dirigente sindical preste tais serviços políticos –, que os dirigentes sindicais alemães e os social-democratas alemães são os maiores e mais infames patifes que o mundo jamais conheceu. (Aplausos entusiásticos.) Sabem vocês onde deveria estar essa gente, Winnig, Ebert-Scheidemann? Segundo o código penal alemão, que eles mesmos declararam plenamente válido e segundo o qual fazem apli­car a justiça, o lugar dessa gente é nos trabalhos forçados! (Gritos entusiásticos e aplausos.) Pois, de acordo com o código penal alemão, é punido com trabalhos forçados quem procura recrutar soldados alemães a serviço do exterior. E podemos dizer tranquilamente que temos hoje à cabeça do “governo socialis­ta” não apenas pessoas que são os Judas do movimento socia­lista, da revolução proletária, mas também forçados que não pertencem a uma sociedade decente. (Aprovação entusiástica.)

Concluindo minha exposição, vou ler, em relação com este ponto, uma resolução que espero seja adotada unanimemente, para podermos enfrentar com o peso necessário essa gente que hoje dirige os destinos da Alemanha.

Camaradas, para retomar o fio da minha exposição: é claro que todas essas maquinações, a formação das divisões de ferro e, sobretudo, o mencionado acordo com o imperialismo alemão nada mais significam que as últimas reservas destinadas a sufocar o movimento socialista alemão; mas a questão crucial, a questão que se relaciona com as perspectivas de paz, está estreitamente ligada a isso. Que vemos nós em todos esses arran­jos senão a tentativa de reatiçar a guerra? Enquanto na Alemanha esses patifes representam a comédia, fingem não ter mãos a medir para instaurar a paz e pretendem sermos nós os desmancha-prazeres, as pessoas que suscitam o descontentamento da Entente e que protelam a paz, preparam-se para reatiçar a guerra com suas próprias mãos, a guerra no Leste, à qual se seguirá rapidamente a guerra na Alemanha. Também aqui é a situação que nos leva a entrar num período de conflitos violentos. Junto com o socialismo e com os interesses da revolução, teremos que defender também os interesses da paz mundial. Isso confirma justamente a tática que nós, spartakistas, sempre fomos os únicos a defender, em qualquer oportunidade, durante os quatro anos da guerra. Paz significa revolução mundial do proletariado! Não há nenhum outro meio para instaurar e garantir realmente a paz senão a vitória do proletariado socialista. (Aprovação calorosa.)

Camaradas, que resulta disso para nossa linha tática geral na situação em que nos encontraremos em breve? A primeira consequência a tirar é certamente a esperança de ver cair o governo Ebert-Scheidemann, que seria substituído por um gover­no declaradamente revolucionário, socialista e proletário. Con­tudo, gostaria de chamar-lhes a atenção não para o alto, mas para baixo. Não podemos continuar a alimentar, a repetir a ilusão do primeiro período da revolução, do 9 de novembro, como se para fazer a revolução socialista bastasse derrubar o governo capitalista, substituindo-o por outro. Não se pode conduzir a revolução socialista à vitória, a não ser que se proceda da maneira inversa: minando, passo a passo, o governo Ebert-Scheidemann por uma luta de massa do proletariado, social e revolucionária; gostaria de lembrar-lhes aqui uma série de insuficiências da revolução alemã, que não foram superadas com a primeira fase e que mostram com clareza que, infelizmente, ainda não chegamos ao ponto de garantir a vitória do socialismo derrubando o governo. Tentei mostrar-lhes que a revolução de 9 de novembro foi sobretudo uma revolução política, quando precisa tornar-se sobretudo econômica. Mas foi também apenas uma revolução urbana, o campo não foi praticamente tocado. Seria loucura realizar o socialismo sem a agricultura. Do ponto de vista da economia socialista, não se pode de maneira nenhuma reestruturar a indústria sem amalgamá-la imediatamente com uma agricultura reorganizada segundo os princípios socialistas. A ideia mais importante da ordem econômica socialista consiste em supri­ mira oposição e a separação entre a cidade e o campo. Se adotarmos um ponto de vista socialista, essa separação, essa contradição, essa oposição constitui um fenômeno puramente capitalista que precisa ser rapidamente suprimido. Se quisermos seriamente uma reestruturação socialista, vocês precisam prestar atenção tanto ao campo quanto à cidade, e, neste ponto, infelizmente, não nos encontramos sequer no começo do começo. Agora precisamos trabalhar seriamente nisso, não apenas porque não podemos socializar sem a agricultura, mas também porque, se tivermos contado as últimas reservas da contra-revolução contra nós e contra nossos esforços, há ainda uma reserva importante que não contamos, os camponeses. Justamente por não terem sido tocados até agora, permanecem uma reserva para a burguesia contra-revolucionária. E a primeira coisa que ela fará, quando a chama das greves socialistas lhes chegar aos calcanhares, será mobilizar os camponeses, os partidários fanáticos da propriedade privada. Contra esse ameaçador poder contra-revolucionário, não há outro meio senão levar a luta de classes ao campo, senão mobilizar o proletariado sem terra e o pequeno camponês contra os camponeses ricos. (“Bravo!” e aplausos.)

Pode-se concluir daí o que nos resta fazer para garantir os pressupostos do sucesso da revolução e, por isso, gostaria de resumir assim nossas próximas tarefas: precisamos sobretudo, no futuro, estender em todas as direções o sistema dos conselhos de operários e soldados, mas principalmente o sistema dos conselhos de operários. O que fizemos em 9 de novembro é apenas um débil começo, e não é só isso. Na primeira fase da revolução, perdemos mesmo, novamente, grandes instrumentos de poder. Vocês sabem que a contra-revolução procedeu a uma desmontagem contínua do sistema de conselhos de operários e soldados. No Hesse, os conselhos de operários e soldados foram completamente suprimidos pelo governo contra-revolucionário; em outros lugares, os instrumentos de poder são-lhes arrancados das mãos. Por isso, não devemos apenas estender o sistema de conselhos de operários e soldados, mas também incorporar os operários agrícolas e os pequenos camponeses a esse sistema. Precisamos tomar o poder, precisamos pôr assim a questão da tomada do poder: o que faz, o que pode fazer, o que deve fazer cada conselho de operários e soldados em toda a Alemanha? (“Bravo!”) É aí que reside o poder; devemos solapar o Estado burguês a partir da base, não separando mais por todo lado os poderes públicos, a legislação e a admi­nistração, mas unindo-as, pondo-as nas mãos dos conselhos de operários e soldados.

Camaradas, eis um imenso campo a lavrar. Devemos fazer os preparativos de baixo para cima, devemos dar aos conselhos de operários e soldados tal poder que, quando o governo Ebert­ Scheidemann ou outro parecido for derrubado, isso será apenas o ato final. Assim, a conquista do poder não deve ser feita de uma vez, mas ser progressiva: nós nos introduziremos no Estado burguês até ocuparmos todas as posições, que defenderemos com unhas e dentes. E a luta econômica, na minha opinião e na dos meus amigos mais próximos no partido, deve ser igualmente conduzida pelos conselhos de operários. São também os conselhos de operários que devem dirigir os conflitos econômicos e fazer-lhes tomar vias sempre mais largas. Os conselhos de operários devem ter todo o poder no Estado. É nessa direção que devemos trabalhar nos próximos tempos; se assumirmos essa tarefa, resulta daí que devemos contar com uma colossal exacerbação da luta nos próximos tempos. Pois trata-se de lutar passo a passo, corpo a corpo, em cada Estado, em cada cidade, em cada aldeia, em cada comuna, a fim de transferir para os conselhos de operários e soldados todos os instrumentos do poder que será preciso arrancar, pedaço a pedaço, à burguesia.

Para isso, é preciso primeiro educar nossos camaradas, é preciso educar os proletários. Mesmo onde existem conselhos de operários e soldados, ainda falta a consciência de quais são as funções dos conselhos de operários e soldados. (“Muito bem!”). Precisamos primeiro ensinar às massas que o conselho de operários e soldados deve ser, em todas as direções, a alavanca da maquinaria do Estado, que ele deve se apoderar de todos os poderes para fazê-los convergir para o mesmo canal:a transformação socialista. Mesmo as massas operárias, já organizadas nos conselhos de operários e soldados, encontram-se a milhas disso, exceto naturalmente algumas pequenas minorias de proletários, que têm clara consciência de suas tarefas. Isso não constitui uma carência, mas é algo muito normal. Exercendo o poder, a massa deve aprender a exercer o poder. Não há nenhum outro meio de lhe ensinar isso. Felizmente, foi-se o tempo em que se tratava de ensinar o socialismo ao proletariado. Para os marxistas da escola de Kautsky, esse tempo parece não ter acabado. Educar as massas proletárias de maneira soci­ alista significa: fazer-lhes conferências, distribuir panfletos e brochuras. Não, a escola socialista dos proletários não precisa de nada disso. Eles são educados quando passam à ação. (“Muito bem!”). No princípio era a ação, é aqui a divisa; e a ação consiste em que os conselhos de operários e soldados se sintam chamados a tornar-se o único poder público em todo o Reich e apren­dam a sê-lo. Só dessa maneira podemos minar o solo, a fim de que se torne maduro para a transformação que deve coroar nossa obra. Eis por que, camaradas, era por um cálculo claro, com uma consciência clara que declaramos ontem, que eu, em particular, disse: “Parem de encarar a luta tão levianamente!”. O que foi mal interpretado por alguns camaradas, acreditando que eu os acusava de quererem ficar de braços cruzados a boicotar a Assembléia Nacional. Nem em sonhos isso me ocorreu. Simplesmente eu não podia mais estender-me sobre o assunto; no quadro e no contexto de hoje tenho essa possibilidade. Quero dizer com isso que a história não nos faz a tarefa tão fácil como nas revoluções burguesas, em que bastava derrubar o poder oficial no centro e substituí-lo por alguns homens, ou por algumas dúzias de homens novos. Precisamos trabalhar de baixo para cima, o que corresponde precisamente ao caráter de massa da nossa revolução, cujos objetivos visam ao fundamentos, ao solo da constituição social, o que corresponde ao caráter da atual revolução proletária; devemos conquistar o poder político não por cima, mas por baixo. O dia 9 de novembro foi a tentativa de abalar os poderes públicos, a dominação de classe, uma tentativa débil, incompleta, inconsciente, caótica. Agora é preciso dirigir, com total consciência, toda a força do proletariado contra os fundamentos da sociedade capitalista. É na base, onde cada patrão se defronta com seus escravos assalariados, na base, onde todos os órgãos executivos da dominação política de classe se defrontam com os objetos dessa dominação, as massas, é lá que devemos arrancar, passo a passo, os instrumentos de poder aos dominantes, pondo-os nas nossas mãos. Tal como o descrevo, o processo parece talvez mais demorado do que se estava inclinado a ver num primeiro momento. Penso que é saudável para nós encararmos com plena clareza todas as dificuldades e complicações desta revolução. Pois espero que, assim como eu, nenhum de vocês deixará a descrição das grandes dificuldades, das tarefas que se acumulam, paralisar seu ardor ou sua energia; ao contrário, quanto maior a tarefa, mais concentraremos todas as nossas forças; e não esquecemos: a revolução sabe realizar sua obra com extraordinária rapidez. Não pretendo profetizar de quanto tempo esse processo precisa. Qual de nós faz a conta, qual de nós se preocupa com que nossa vida mal baste para consegui-lo? Importa somente que saibamos com clareza e precisão o que temos que fazer; e o que temos que fazer, espero tê-lo de algum modo exposto, com minhas poucas forças, em suas grandes linhas.

Moção de protesto contra a atuação do governo alemão no Leste24

A Conferência do Reich, indignada, toma conhecimento da atuação do governo alemão no Leste. A marcha conjunta das tropas alemãs, dos barões bálticos e dos imperialistas ingleses significa não somente uma traição infame ao proletariado russo e à Revolução Russa, como também a confirmação da aliança mundial dos capitalistas de todos os países contra o proletariado em luta do mundo inteiro. Perante essa monstruosidade, o Congresso do partido declara novamente: o governo Ebert­-Scheidemann é o inimigo mortal do proletariado alemão. Abaixo o governo Ebert-Scheidemann!

Ata do Congresso de fundação do Partido Comunista Alemão (30 de dezembro de 1918 a 1º de janeiro de 1919)

I: p.124-9

II: p.185-7 

III: p.195-222 

IV: p.222


Notas

  1. Tradução feita de acordo com a seguinte edição: Luxemburg, R. Gesammelte Werke, Berlin: Dietz Verlag, 1987, v.4. Publicada pela primeira vez em Loureiro, l., Vigevani, T. Rosa Luxemburg, a recusa da alienação, São Paulo: Editora UNESP, Fapesp, 1991. As notas que não são de minha autoria provêm da edição alemã e da seguinte edição francesa: Luxemburg, R. Oeuvres II (écrits politiques 1917-1918), Paris: Maspero, 1978.
  2. A pedido do comitê central da Liga Spartakus, Paul Levi, na sua exposição, defendeu a participação do jovem KPD nas eleições para a Assembléia Nacional.
  3. Otto Rühle era porta-voz da maioria esquerdista no Congresso de fundação do KPD. Na sua intervenção, interpretando equivocadamente a correlação de forças na Alemanha, rejeitou como oportunista a participação nas eleições para a Assembléia Nacional.
  4. Referência à moção de Felix Schmidt (Hannover) e camaradas, pela qual os membros do KPD seriam obrigados a sair dos sindicatos e a construir o KPD como organização político-econômica unificada. Essa moção foi rejeitada.
  5. Referência às “Reivindicações econômicas transitórias para os trabalhadores da indústria e do comércio”, publicadas em parte no Freiheit (Berlim), n.83, de 31 de dezembro de 1918, e no Deutschen Allgemeinen Zeitung (Berlim), n.664, de 31 de dezembro de 1918, e que foram distribuídas no Congresso do partido.
  6. Interrupção no texto.
  7. Referência à moção de Felix Schmidt (Hannover) e camaradas (ver nota 4).
  8. Ver anexo “O que quer a Liga Spartakus?”. (N.T)
  9. Marx, K., Engels, F. Prefácio [à edição alemã de 1872]. In: _____. Werke, Berlin, 1971, v.4, p.573-4. Utilizo aqui a tradução brasileira do Manifesto do Partido Comunista, de Leandro Konder e Marco Aurélio Nogueira, Petrópolis: Editora Vozes, 1988, p.42. (N.T.)
  10. Marx, K., Engels, F. Manifesto do Partido Comunista. Petrópolis: Vozes, 1988, p.86-7. (N.T.)
  11. Engels, F. Introdução à luta de classes na França de 1848 a 1850 (1895), In: Marx, K., Engels, F. Werke, Berlin, 1972, v.22, p.515. (N.T.)
  12. August Bebel (1840-1913): fundador e presidente do Partido Social-Democrata Alemão (SPD).
  13. Friedrich Ebert (1879-1925): seleiro, militante do SPD, foi eleito para o Reichstag em 1912; em 1913 tornou-se presidente do comitê dirigente,e durantea guerra fez parte da ala direita do partido. Membro do Conselho dos Comissários do Povo em 1918, presidente da República alemã de 1919 a 1925. Eduard David (1863-1930): deputado do SPD no Reichstag, de­fensor do revisionismo; fez parte da ala direita do partido durante a guerra, ministro sem pasta em 1919-1920; foi o primeiro presidente da Assembléia Nacional.
  14. Philipp Scheidemann (1865-1939): dirigente social-democrata, entrou no comitê dirigente em 1912; deputado no Reichstag de 1903 a 1918 e de 1920 a 1933; em 1918, membro do Conselho dos Comissários do Povo; primeiro chanceler da República alemã (fevereiro a junho de 1919), participou da repressão à Revolução de 1918. (N.T.)
  15. Hugo Haase (1863-1919): deputado do SPD em 1897, presidente do partido em 1911, presidente da fração social-democrata no Reichstag em 1912; contra o voto dos créditos de guerra em 1914, vota por disciplina; torna­-se, a partir de 1916, porta-voz da minoria centrista. Um dos dirigentes do USPD desde a sua fundação, membro do Conselho dos Comissários do Povo em 1918, morreu assassinado por um nacionalista. (N.T.)
  16. Em 6 de dezembro, os fuzileiros da guarda atiraram em uma manifestação de spartakistas e de simpatizantes quando esta estava na Chausseestrasse. Houve dezesseis mortos.
  17. Em 24 de dezembro, o general Groener conseguiu de Ebert autorização para sitiar o edifício da divisão popular da Marinha a fim de evacuá-lo. Esse ataque de surpresa enfrentou forte resistência. Morreram onze mari­nheiros e 56 soldados.
  18. Wilhelm Dittmann (1874-1954): membro do comitê dirigente do USPD em 1917, Comissário do Povo em 1918. Membro da ala direita dos independentes, voltou ao SPD em 1922.
  19. Os representantes dos governos de Baden, Baviera, Hessen e Württemberg apresentaram em 27-28 de dezembro de 1918, em Stuttgart, as seguintes reivindicações: 1. Reorganização do Reich alemão em bases federativas; 2. Criação de um governo do Reich e de uma Assembléia Nacional com capacidade para agir; 3. Promover a paz o mais rápido possível para o Reich alemão. Manifestaram-se expressamente contra um governo central exclusivo que reduziria os governos dos Land a administrações provinciais, e exigiram participar das negociações com os EUA, a respeito do abastecimento de víveres, por meio de uma delegação conjunta.
  20. Vorwärts: órgão central do SPD, publicado em Berlim de 1891 a 1933. Em 1916, passa às mãos dos social-democratas majoritários. Die Freiheit: órgão do Partido Social-Democrata Independente (USPD), publicado em Berlim de novembro de 1918 a outubro de 1922. (N.T.)
  21. Groener, general monarquista que pôs o Exército à disposição de Ebert, com a condição de que este se dispusesse a aniquilar a revolução.
  22. August Winnig (1878-1956): pedreiro qualificado, em 1913 presidente da União dos Operários da Construção Civil; nomeado em novembro de 1918 plenipotenciário do Reich para os países bálticos e comissário do Reich para a Prússia ocidental e oriental, tornou-se em 1919 presidente supremo da Prússia oriental. Derrubado em 1920, foi expulso do partido pela participação no putsch de Kapp.
  23. Desde meados de novembro de 1918, o alto-comando do Exército em Riga, em concordância com o comissário do Reich para os países bálticos, August Winnig, iniciou a formação de grupos voluntários contra-revolucionários, como a “Divisão de Ferro”, com o objetivo de combater os trabalhadores bálticos, finlandeses e poloneses. Na Alemanha, esses corpos francos tornaram-se destacamentos decisivos na guerra civil contra a revolução.
  24. Essa moção foi aprovada por unanimidade.