Após contrariar as pesquisas durante toda a eleição, que indicavam Manuela D’Ávila (PCdoB) com uma margem muito maior de votos do que Sebastião Melo (MDB), de 35% para 22% (favorável para ela), o 2º turno em Porto Alegre será entre Melo, com 31,1% dos votos e Manuela, 29%. Se a enorme vantagem indicada nas pesquisas fazia Manuela rebaixar o seu já rebaixado programa de gestão burguesa em Porto Alegre, o seu decepcionante primeiro turno fará com que agora se endireite mais e mais, para se tornar palatável a setores burgueses.
Que Melo é um político burguês que adapta a sua agenda à situação, todos sabemos. Melo teve alta votação em bairros proletários (a sua propaganda eleitoral é sempre em bairros periféricos). Inclusive, curiosamente, fez uma campanha mais voltada aos trabalhadores do que a própria Manuela D’Ávila, que não está tão preocupada com os problemas reais dos trabalhadores (empregos e salários), mas sim com frases de amor contra o “ódio” bolsonarista e microcrédito do BNDES, para supostamente conter o rebaixamento do nível de vida dos trabalhadores (tornando-os ainda mais reféns dos usurários capitalistas). Não é preciso ir muito ao passado para entender a qual classe servirá uma eventual prefeitura de Manuela. Ela mesma diz que fará uma “prefeitura para todos” – frase que sempre significa que se governará para a burguesia. Com ela os grandes capitalistas seguirão sua política de aumento de exploração dos trabalhadores, mas contarão com um gestor mais apto a conter a revolta das massas. Manuela D’Ávila se pretende uma boa gestora capitalista. Não à toa, em entrevista recente à CNN, quando questionada como se comportaria frente ao governo federal de Bolsonaro e estadual de Eduardo Leite (PSDB), afirmou, após um silêncio dramático, que “o gestor público deveria ser ativo” e que manteria um diálogo respeitoso com Bolsonaro e qualquer outro governante.
Ao contrário do caso de Boulos (PSOL) na capital paulista, o caso do PCdoB é diferente. Este já “passou pela experiência”. É um partido burguês, investigado por corrupção como os demais. O PCdoB já teve alguns ministérios nos governos petistas – com destaque para o Ministério do Esporte, em meio à Copa do Mundo e às Olimpíadas no Brasil, o que envolveu muito dinheiro –; já governou muitas cidades e governa até um Estado (Maranhão). Já votou por diversas leis nefastas contra a classe trabalhadora. Orlando Silva, do PCdoB de São Paulo, foi o relator da MP que permite a diminuição de salários em meio à pandemia. Entre muitas outras medidas, o PCdoB votou pela MP 905, que abriu ainda mais as portas para o encarceramento em massa da juventude proletária. O PCdoB também presidiu a Câmara dos Deputados, com a figura de Aldo Rebelo, sob o governo Lula. Rebelo entrou lá como presidente logo após o escândalo do mensalão (2005), visando a salvar a governança do abalado PT. E coube a ele organizar a pauta capitalista que o PT aprovou durante anos na Câmara. Rebelo também foi Ministro da Defesa durante o governo Dilma, amplamente elogiado pelo Estado Maior militar brasileiro. E Rebelo é o mesmo que disse, em 2018, num ato de sincericídio, que o governo de Lula nunca foi de esquerda. O PCdoB, além disso, é nacionalmente conhecido pela atuação mafiosa e gangsterista em entidades sindicais e estudantis, com diversas acusações de desvios de verbas. Lembremos que na comemoração dos 97 anos do PCdoB Rodrigo Maia, do DEM e presidente da Câmara, esteve no palanque. Lembremos que a bancada do PCdoB sequer apoiou Marcelo Freixo do PSOL à presidência da Câmara dos Deputados para apoiar o MDB. Lembremos também que, em 2012, Ana Amélia Lemos, então senadora pelo PP (e depois vice de Geraldo Alckmin) apoiou Manuela à prefeitura de Porto Alegre, afirmando que juntas “estudaram muito sobre gestão pública”. E há muitas e muitas outras falcatruas que realizou o PCdoB, sempre na política de traição à classe trabalhadora. Não há como uma pessoa seriamente comprometida com a causa socialista achar que o PCdoB é uma organização de esquerda. O PCdoB é um partido burguês, como qualquer outro grande partido brasileiro.
Manuela D’Ávila chega com chances reais no segundo turno como nunca antes, principalmente porque ocupa agora o lugar do PT, que já governou Porto Alegre, para a burguesia, por 15 anos (1989-2004). O vice de Manuela D’Ávila, Miguel Rosseto, é um dos fundadores da CUT e foi ministro tanto de Lula quanto de Dilma. Além disso, foi não apenas vice-governador do Rio Grande do Sul no governo Olívio Dutra (que nunca mais conseguiu ser eleito a qualquer cargo no Estado), como também foi presidente da Petrobrás nos momentos de corrupção desenfreada da estatal. Ou seja, não há nada de realmente novo na chapa de Manuela D’Ávila. É apenas a velha gestão burguesa petista colocada sob um suposto viés jovial.
O discurso de Manuela D’Ávila não enfrenta em nada seriamente a ordem capitalista. Quando deputada estadual pelo RS, e sondada para a presidência, Manuela alertou que “não havia razão para o mercado se assustar com o PCdoB”. A linha política de Manuela é a defesa de pequenas e superficiais reformas no capitalismo, mera perfumaria que não toca na estrutura, nas relações de produção sob o capitalismo. Nunca se coloca em questão a exploração capitalista do trabalho, o que realmente mantém em funcionamento o sistema e dá base para a sua ampliação. A política de gente como Manuela D’Ávila visa apenas a encobrir, com discurso humanitário, uma posição favorável à ordem capitalista. Manuela é cúmplice do aumento do grau de exploração da classe trabalhadora.
O histórico petista em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul é grande, e é ele que retornará caso Manuela assuma. Nada haverá de novo. Mudarão apenas as caras. Mas é justamente num passado idealizado, longe da realidade, que a pequena-burguesia desesperada e assustada com a crise capitalista se apoia. Sonhando com a volta do Orçamento Participativo e com uma gestão mais “humana”, ela engole seco todas as possíveis críticas, comprometendo-se com as falcatruas da candidata. E, sobretudo, ela rifa qualquer projeto real de transformação, adaptando-se à mediocridade política da burguesia. Se antes era necessário derrotar o suposto fascismo em ascensão de Bolsonaro, agora o projeto “radical” que cabe nas urnas é mais modesto: derrubar a prefeitura de Marchezan Jr. (PSDB), a qual teria seu legado na candidatura de Melo.
Ora, mas em 2016, quando o segundo turno à prefeitura foi decidido entre Sebastião Melo e Nelson Marchezan (que saiu vitorioso), o PCdoB não apoiou o Melo? Sim! E há poucos dias, quando o candidato José Fortunati (PDT) teve sua candidatura impugnada, Manuela não manifestou sua solidariedade de “esquerda”? Mas Fortunati não é o mesmo que governou a partir de 2013, tendo justamente Sebastião Melo como vice? Como dizer então que Melo, ontem aliado e hoje inimigo, é parte da onda conversadora, fascista ou o que quer que seja? Percebem a total confusão? Percebem o imbróglio político completo? A eleição, na realidade, se dá entre compadres. A política de gente como Manuela, Fortunati, Marchezan e Melo não tem quaisquer princípios, somente conveniências e pragmatismo; apoia-se ou retira-se o apoio conforme a ocasião, visando-se a cargos e muito dinheiro; taxa-se os demais de “fascistas” ou “direita” meramente para angariar votos; usa-se o desespero de amplas camadas médias e trabalhadoras – desespero advindo de sua situação econômica cada vez mais instável – para fazer pura politicagem oportunista.
É muito difícil agora, na campanha eleitoral, convencer a todos de que existe uma grande diferença entre Melo e Manuela, ou entre o MDB e o PCdoB. As amplas camadas trabalhadoras percebem isso muito mais facilmente que nossa pequena-burguesia de “esquerda” (como PSOL e apoiadores). Não à toa os votos nulos no primeiro turno em Porto Alegre foram mais massivos do que em todas as outras capitais. Tudo indica que no segundo isto será ainda maior. Isso só pode indicar uma indignação cada vez maior contra essa democracia falida. É esse sentimento que os verdadeiramente revolucionários, contrários ao Estado burguês, têm de saber dialogar, participar e alimentar!
Os revolucionários não podem cair na falsa ideia de que há um conflito de projetos entre Melo e Manuela. Ambos são a mesma política burguesa degradada. Caso houvesse um risco real de fascismo, poderíamos votar em Manuela. Mas não há! Todas as análises sérias do resultado eleitoral de 2020 apontam que a “onda bolsonarista” era só uma marolinha (veja aqui). Não há conflito entre fascismo e democracia no segundo turno em Porto Alegre, mas entre gestores burgueses praticamente iguais. É preciso dizer a realidade aos trabalhadores e à juventude, sem alimentar ilusões, como única forma de abrir um novo caminho, revolucionário, para a emancipação da classe trabalhadora!
É nulo contra Manuela e Melo!
Pela construção de uma nova organização revolucionária neste país!