Transição Socialista

Palocci: o fim vergonhoso de uma geração

Em mais um dos capítulos da crise política, vimos a recente “carta” de Antonio Palocci. É necessário retomar um pouco a respeito. Grande parceiro de Lula, um dos principais quadros petistas da sua geração, aquele que seria candidato à presidência após Lula – só não o foi por ter se envolvido em escândalo de corrupção, o que levou Lula a escolher Dilma –, o ex-ministro pediu desfiliação do PT após ser suspenso por 60 dias e receber um processo disciplinar. Na sua longa carta de desfiliação, Palocci busca todas as formas para se salvar dos anos de prisão que lhe esperam pela frente. Palocci não é nem mais nem menos honesto do que Lula e cia. e joga suas cartas na mesa somente para garantir sua própria salvação. Todavia, para isso, contraditoriamente, teve de afirmar certas verdades. Uma delas, bastante significativa, é a seguinte:

“Nós, que nascemos diferentes, que fizemos diferente, que sonhamos diferente, acabamos por legar ao país algo tão igual ao pior dos costumes políticos (…). Chegou a hora da verdade para nós. De minha parte, já virei essa página. Ao chegar ao porto onde decidi chegar, queimei meus navios. Não há volta. Minha geração talvez tenha errado mais do que acertado. Ela está esgotada.”

De fato, a geração de Palocci, com pouquíssimas mas louváveis exceções, mais errou do acertou. Como um todo, ela está agora esgotada historicamente. Ela, infelizmente, pouco pode ensinar às novas gerações, senão pela negativa, pelo erro. Palocci é um símbolo-chave da geração que acreditou na via reformista, parlamentar, centrista e indeterminada do PT e de seu programa de origem, mas não só isso. Palocci é um símbolo também dos autodenominados “trotskistas” que perderam tempo ou se dissolveram dentro do PT.

Sua militância política iniciou-se antes da fundação do PT, quando era membro de uma organização trotskista chamada Organização Socialista Internacionalista (OSI), filiada ao CORQUI (Comitê pela Reorganização da Quarta Internacional), ligada ao grupo francês OCI, dirigido por Pierre Lambert. A OSI brasileira, assim como a maioria das organizações de esquerda por aqui, decidiu adotar a tática de entrismo no PT. Essa tática vinha acompanhada de uma ilusória promessa de que poderiam crescer rapidamente a partir de uma disputa dentro do PT em formação e sair com mais força e inserção na classe operária. Ou seja, construía-se, inicialmente, a ilusão de que sairiam do PT mais fortes para construir o partido revolucionário brasileiro. Aplicava-se no Brasil a mesma “tática” que o grupo de Lambert aplicava na França, sob o governo de Mitterrand. Lá como aqui, um trotskista da OCI “infiltrou-se” no Partido Socialista e chegou ao poder. Trata-se do caso do “trotskista” Lionel Jospin, que virou Primeiro-Ministro da França.

O resultado dessa política, no Brasil, não pôde ser mais claro: a OSI foi rapidamente dissolvida (restando apenas a insignificante corrente petista O Trabalho), seus quadros, como Palocci, Clara Ant, Favre, Gushiken e outros, aproximaram-se da direção sindicalista e majoritária do PT comandada por Lula e José Dirceu e ocuparam altos cargos públicos, a grande maioria se envolvendo em escândalos de corrupção.

Quanto às demais organizações revolucionárias que também entraram no PT, cada qual com sua trajetória própria, saíram do PT mais fracas ou mais ou menos como entraram. É verdade que nenhuma levou tão a fundo a essência desse entrismo, como levou a OSI. A essência desse entrismo era a abdicação à construção de um partido revolucionário, portanto, de fato, a OSI é aquela que foi mais radical ou consequente nessa linha capitulacionaista. Mas as demais também não encontraram um atalho para a construção do partido revolucionário. Toda a ilusão promovida nesse período teve fortes impactos sobre a esquerda brasileira e no conjunto da classe trabalhadora, que viu no PT o resultado de suas lutas na década de 1970/80.

Em meio ao jogo de espetáculos que ilustram os interesses dos parasitas da grande política, há um toque de verdade nas palavras de Palocci e, por isso, ele precisa ser condenado pelo próprio PT. Sua geração, apesar dos anos de governo do PT, não mudou nada da realidade brasileira, portanto, realmente, não “conquistou nada”. Pelo contrário, a realidade de pobreza e miséria neste país somente cresceu nas últimas décadas, e em grande velocidade. Provou-se o relativamente óbvio: não há caminho por meio da conciliação com a burguesia, por meio da indeterminação programática. A traição à classe operária estava já na raiz da fundação do PT e no abandono da política revolucionária, que levou milhares de trabalhadores ao ceticismo e à desilusão. Mas essa constatação já foi incorporada pelos trabalhadores: nossa classe também já virou essa página e o PT, hoje, não passa de um partido traidor de pior tipo, que urge ser enterrado.

Que o PT seja enterrado vivo!