Transição Socialista

Dilma e Lula: diferentes faces da mesma moeda

Talvez a grande característica do estilo de jogo político, praticado pelo ex-presidente Lula, seja a sua capacidade de sacrificar mesmo os aliados mais próximos. Foi assim com Zé Dirceu, Genoíno e toda a velha guarda da extinta Articulação. Seu movimento mais contundente foi, porém, a condução de Dilma à sucessão presidencial. Dessa jogada inesperada, surgiu a “mãe do PAC” e o resto da história todos conhecem.

Neste momento de aprofundamento da crise econômica e seu inevitável rebatimento na esfera política, o ex-presidente dá sinais de que não hesitará em repetir seu jogo, agora, tendo como alvo, ou melhor, como escudo, a própria cria.

Nesta última segunda-feira, dia 04 de maio, Lula fez uma aparição no programa de tevê do partido. Em pouco mais de dez minutos, foram exaltados os enormes avanços de 15 anos do PT no poder. Repetiu-se o mesmo discurso que levou Dilma à reeleição, com uma única mudança: em nenhum momento foi citado o nome da presidente. Da mesma forma que Dilma um dia foi inventada, nesta semana, sua existência foi sumariamente riscada, seu nome apagado, sua imagem, cortada. O PT apareceu como o que é hoje: um partido que existe para o projeto de poder de Lula. A ele coube discursar, como se ainda fosse o presidente. Nunca Dilma foi relegada a uma condição tão baixa.

Em seu discurso, o ex-presidente falou enfaticamente contra a ameaça de alteração na CLT e a perda dos direitos trabalhistas, os quais chamou de conquista histórica da classe trabalhadora. Ora o que se extrai dessa fala se relacionada com a edição e montagem do programa que exclui e apaga Dilma?

Primeiro, que Lula chancela um afastamento do PT em relação a Dilma, como se dissesse: todas estas conquistas até aqui nos pertencem, o desastre no horizonte, a Dilma e somente a ela. Aqui sinaliza a possibilidade de, mais uma vez, sacrificar uma peça do jogo. Não é um movimento ainda, apenas um possibilidade que ele aponta. É inevitável pensar, por exemplo, que isto dá carta branca às rebeliões na bancada de deputados petistas ou então ao discurso de que o partido nada tem a ver com o pacote de Levy.

Por outro lado, seria ingenuidade supor que Lula defenda o que ele diz defender. Assim, coloca-se contra a flexibilização da CLT, mas silencia sobre a medida provisória 665 que regula o pacote de Levy e que seria votada no Congresso apenas dois dias depois do programa ir ao ar. Ora, como não dizer nada? São coisas distintas? Entre os ajustes de Levy está a mudança no regime do seguro-desemprego, um direito essencial num momento como este em que as demissões avançam em todos os setores da economia… Mas vejam bem, diria um petista defensor de Lula, ele também nada disse sobre apoiar o pacote de ajustes! Tem razão. Em outras palavras, no programa do PT, é como se Dilma tivesse desaparecido e o pacote de Levy não existisse.

A  crise se aprofunda e entre este ir e vir, não há no discurso de Lula nenhum átomo de saída para crise. De um lado sua cartada é um jogo de cena para encobrir o ataque desferido contra os trabalhadores pelo governo Dilma, de outro, caso a crise não seja estancada, para alimentar o mito de si próprio, preparando o retorno do herói salvador.

Para além dos efeitos mais circunstanciais, é preciso compreender a crise estrutural por trás do jogo de máscaras. Lula, com toda a sua habilidade política, busca uma sobrevida para o PT e, assim, para o próprio sistema. Mas cada vez mais parece em vão a contenção da crise, que dia após dia se aprofunda e arrasta  PT, PMDB (hoje um partido de três cabeças) e o PSDB (paralisado, sem reação) para o mesmo abismo. É hora, sem dúvida, de um grande esforço das organizações socialistas da classe trabalhadora para construir uma luta comum que promova a defesa dos direitos ameaçados, avançando, também, rumo à derrubada deste sistema em agonia.