Transição Socialista

A greve dos caminhoneiros de Mineápolis em 1934

Por Ron Jorgenson

Ron Jorgenson é membro do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI —1953). Este artigo foi publicado em quatro partes no wsws.org. A tradução é de Pedro Ribeiro.

1a Parte

Na manhã de 7 de fevereiro de 1934, trabalhadores de empresas distribuidoras de carvão de Mineápolis, no estado de Minnesota, se espalharam pela cidade, armados com mapas e instruções de greve mimeografados, prontos para interromper as atividades das 67 companhias que alimentavam a energia e o aquecimento das indústrias e casas da cidade.

No final de janeiro, Mineápolis, conhecida por seus invernos rigorosos, foi tomada por um clima extraordinariamente quente e a demanda por carvão diminuiu. No entanto, no dia primeiro de fevereiro, as temperaturas caíram repentinamente abaixo de zero e, no dia seguinte, um coeso grupo de trabalhadores — que liderava os esforços em busca de melhores condições de trabalho, maiores salários e o reconhecimento sindical da categoria — chamou uma reunião. Os trabalhadores das distribuidoras de carvão, não organizados em sindicato, arrasados pela pobreza e carregando nas costas o pior da Grande Depressão de 1929, votavam peia greve.

As preparações para aquele momento haviam começado, silenciosamente, três anos antes. Agora, em apenas três horas, cerca de 600 trabalhadores, entre eles motoristas de caminhão, auxiliares e aqueles vinculados ao trabalho de transporte nos galpões de carvão, conseguiram interromper es atividades de 65 companhias. Nos locais onde caminhões individuais, auxiliados pela polícia, conseguiam atravessar as linhas de piquete, os grevistas usavam uma técnica chamada “piquete móvel” para barrar o avanço.

Tratava-se do seguinte: um caminhão dos grevistas emparelhava com o do fura-greve e um piqueteiro saltava dentro da cabine do pelego, puxando a freio-de-mão. Em seguida, um segundo piqueteiro acionava a alavanca de despejo e toda a carga de carvão da caçamba era despejada na rua.

A greve pegou de surpresa a elite dominante de Mineápolis. Um de seus representantes declarou à Comissão Regional de Trabalho (CRL): “Esta cidade está em estado de emergência. A vida e a segurança do público estão ameaçadas!”.

Os estoques de carvão se esvaíam e a polícia da cidade não era capaz de derrotar os grevistas. Apenas dois meses antes, a organização dos capitalistas de Mineápolis — a Aliança dos Cidadãos — tinha acabado facilmente com uma tentativa de mobilização do Amalgamated Clothing Workers of America (ACWA – “Trabalhadores Têxteis Unidos da América”, união sindical de trabalhadores da indústria têxtil) e esmagado, em seguida, uma greve em sete companhias de fabricação de móveis.1

Esperando evitar a greve no setor do carvão, a Aliança dos Cidadãos concedeu um aumento salarial. Com a greve em andamento, a CRL interveio propondo o fim do movimento com base na recontratação de todos os grevistas e numa eleição para escolha de representantes sindicais.

Os trabalhadores aceitaram a proposta da CRL e concordaram com a volta ao trabalho depois de três dias de piquetes. Retiraram todas as suas reivindicações, exceto uma: que a regional 574 do sindicato dos caminhoneiros fosse a representante legítima da categoria nas negociações com o patronato. Na exigência, estava implícito que os trabalhadores não-sindicalizados estariam livres para negociar por conta própria.

Por 30 anos, a Aliança dos Cidadãos foi unia das mais determinadas associações da classe dominante na luta contra o closed shop [acordo trabalhista onde a empresa é obrigada a contratar apenas trabalhadores sindicalizados] ou o union shop [acordo trabalhista onde o trabalhador não-sindicalizado precisa se sindicalizar para permanecer empregado]. A Aliança defendia, contrariamente, o open shop, vendendo a ilusão de que, dentro do capitalismo, os trabalhadores seriam perfeitamente livres para negociar, por conta própria, com seus empregadores.

Assim, as companhias distribuidoras de carvão assinaram a proposta da CAL, e a Aliança dos Cidadãos notificou seus membros que isso jamais os forçaria a assinar um contrato direto com o sindicato. Ou seja, nenhum desafio ao reinado do open shop seria negociado em Mineápolis

Até a data em que as eleições propostas pela CRL foram realizadas, no dia 14 de fevereiro, nem mesmo um único trabalhador se apresentou para negociar direta e individualmente com os empregadores. Em vez disso, a regional 574 teve uma vitória esmagadora, com 700 trabalhadores votando a favor da representação sindical.

A decisão de assinar o termo era vista, por parte das companhias e da Aliança dos Cidadãos, como uni problema temporário. A entrega de carvão, enquanto uma operação sazonal, terminaria em março ou início de abril. Portanto, o aumento salarial seria um fardo para as companhias apenas por um curto período. A Aliança dos Cidadãos teria bastante tempo para descobrir os lidares da greve. Quando as entregas recomeçassem, no outono, os hereges já estariam na lista negra do patronato, o aumento salarial seria revertido e o regime de open shop seria fortalecido.

Mas os dirigentes da greve não esperaram até o outono. Em vez disso, ampliaram rapidamente sua organização entre a indústria do transporte, levando a uma erupção ainda maior da luta de classes. Os eventos titânicos do verão de 1934 superariam, do ponto de vista da iniciativa e da mobilização independentes da classe trabalhadora, qualquer embate travado anteriormente pelo proletariado americano.

O fundamento objetivo dos eventos de 1934 era a crise global do sistema capitalista, a chamada Grande Depressão. Em Minnesota, no ano de 1932, perdas operacionais afetavam 86% dos fabricantes do estado. Entre 1929, o ano do crash do mercado de ações em Wall Street, e 1933, quando o presidente Franklin Delano Roosevelt iniciou o New Deal, 25% das fábricas de Mineápolis fecharam as portas e o valor líquido das mercadorias comercializadas caiu em 45%. No ano de 1932, o desemprego em Minnesota atingiu a marca de 23,4%, pouco abaixo da média nacional. Os salários dos trabalhadores de Mineápolis caíram em 27%, e 45% da força de trabalho viu sua jornada semanal descer abaixo das 40 horas.2

Para os trabalhadores da época, o principal mecanismo de suporte financeiro era o pagamento em prestações, onde os salários do próximo ano pagavam as necessidades daquele ano. Os planos de parcelamento das dívidas foram oferecidos por toda a década de 1920 e, quando a Depressão tornou impossível aos trabalhadores pagar suas dívidas, o edifício do crédito ruiu. Estima-se que, no ano de 1929, 69% do PIB dos EUA se concentrava no débito privado não-corporativo.3

O leve ascenso econômico que começou em 1933-1934, combinado com os gastos do New Deal, deu o impulso necessário para o início das lutas dos trabalhadores.

Mas o caráter politicamente avançado da greve de 1934 não foi mero resultado de processos econômicos. Nos anos de 1933-1934, observou-se um crescimento acentuado no número de greves, onde, no entanto, a maioria acabou em derrotas.

O alto nível da luta de classes alcançado em Mineápolis no ano de 1934 vinculou-se ao desenvolvimento histórico da direção revolucionária marxista. Essa foi a particularidade e a importância do movimento, cujos acontecimentos são ainda hoje de grande valor para as lutas da classe trabalhadora, principalmente no âmbito sindical.

Esse caráter avançado da luta não se devia, entretanto, a uma característica apenas americana. Na verdade, estava vinculado a processos internacionais e, no seu cerne, tinha a luta travada por Leon Trotsky e a Oposição de Esquerda pelos princípios da Revolução de 1917, contra a burocracia stalinista.

Muitos acadêmicos e comentaristas “esquerdistas” da pequeno-burguesia insistem em negar isso, buscando atribuir o sucesso da greve dos caminhoneiros em 1934 às tradições sindicais previamente existentes nos Estados Unidos. Tais indivíduos enxergam os líderes da greve simplesmente como sindicalistas, bons organizadores e propagandistas da militância sindical.

Mesmo o biógrafo de Franklin D. Roosevelt, por exemplo, insiste que o papel dos líderes sindicais teve pouco a ver com o marxismo. Segundo ele, a liderança era

radical (trotskista), durona, corajosa, integralmente honesta e notavelmente capaz, muito mais preocupada com o ganho de benefícios concretos para os trabalhadores que representava do que com a pureza ideológica.4

Por que, então, às vésperas da Segunda Guerra Mundial, o herói de sua biografia sentiu-se compelido a condenar e encarcerar justamente esses líderes “trotskistas”? A esse fato, entretanto, o biógrafo não oferece resposta.

Estão corretas as afirmações de que os trabalhadores dos galpões de armazenamento de carvão que estavam no seio da luta — Cari Skoglund e os três irmãos Dunne (Vincent, Miles e Grant) — tinham uma experiência sindical muito rica na região, incluindo o envolvimento em organizações como a Industrial Workers of the World (IWW — Operários do Mundo). No entanto, essa experiência, por si mesma, não explica os eventos de 1934.

A verdade e que eles tinham um alto nível de consciência política e uma firme convicção na força e no potencial revolucionário da classe trabalhadora americana, justamente porque eram membros do movimento trotskista americano, conhecido pela Communist League of America (CLA — Liga Comunista da América).

Para além das dificuldades organizativas e das tarefas rotineiras das greves de 1934 — e elas eram muitas —, o grande desafio enfrentado por esses trabalhadores era o de confrontar a Aliança dos Cidadãos e o Estado capitalista sob todas as suas formas: oficiais do governo, policia, delegados armados, Guarda Nacional, mediadores trabalhistas e imprensa. Um outro desafio era combater as ações dos fura-greve da burocracia sindical do International Brotherhood of Teamsters (IBT — Irmandade Internacional dos Caminhoneiros) e as provocações do Partido Comunista stalinista.

Por fim, havia ainda o problema da manutenção da independência de classe aro relação ao Farmer-Labor Party (FLP — Partido dos Pequenos-Fazendeiros e Trabalhadores) de Minnesota, que recentemente havia eleito o governador do estado, Floyd B. Olson. Muitos “esquerdistas” retratam o reformista FLP como uma força favorável, que facilitou a vitória da greve dos caminhoneiros. A realidade, no entanto, foi muito diferente. Os lidares trotskistas não se cansavam de alertar aos trabalhadores de Mineápolis que não deviam confiar em Olson e, em seu lugar, deviam confiar apenas nas própria forças.

A Aliança dos Cidadãos

Mineápolis, situada perto da confluência dos rios Mississipi e Minnesota, gerou seus primeiros lucros no século XIX, a partir da indústria da madeira. As serrarias, que utilizavam energia hídrica gerada nas Quedas de St. Anthony, situada nos bancos de Mineápolis do Rio Mississipi, deram lugar depois a gigantescas plantações de grãos, criando enormes fortunas, como aquelas associadas a nomes como Pillsbury. Após a construção dos trilhos do barão das ferrovias James J. Hill, que ligavam Mineápolis-Paul ao Oceano Pacifico, a cidade cresceu e prosperou com a entrada do comércio vindo do nordeste do país.

Os usineiros da cidade mantinham um monopólio, controlando a produção dos grãos de toda a região. Através de uma rede local de comércio de grãos, depenavam os pequenos fazendeiros de Minnesota e Dakota do Norte/Sul, combinando preços e trapaceando abertamente nos acertos das cantas.

Mas o crescimento do capital trouxe consigo o crescimento do trabalho industrial e manufatureiro. Entre 1901 e 1902, o número de greves organizadas pela American Federation of Labor (AFL —Federação Americana do Trabalho) dobrou. Em 1903, uma greve de um mês abalou as usinas de farinha da cidade. O programa da Federação do Trabalho do Estado de Minnesota, naquela época, defendia uma jornada diária de 8 horas, a nacionalização dos serviços de energia, ferrovias e minas, e “a propriedade coletiva pelo povo de todos os meios de produção e distribuição”.5

David Parry, o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes, fez um discurso em um encontro da elite de Mineápolis, em 1903, evidenciando a já clara constituição das relações de classe. Parry declarou que o closed shop era

uma teoria de governo à qual aqueles que entendem e apreciam a liberdade e a civilização americanas nunca darão seu consentimento genuíno (…) Por isso, devemos nos empenhar em cortar o mal pela raiz, e essa raiz é o amplo sentimento socialista compartilhado por certas classes da população.6

Mas a classe capitalista de Mineápolis apenas começava a agir. Naquele mesmo ano, formou a organização chamada Aliança dos Cidadãos, com a finalidade explícita de derrotar o closed shop. A Aliança dos Cidadãos seria seu organismo central, tendo, no entanto, incontáveis organizações subordinadas, promovidas durante os 30 anos seguintes para realizar os trabalhos mais sujos.

A Aliança usava agências de investigação com infiltrados para espionar e controlar os trabalhadores. Um bureau de emprego centralizado mantinha dados detalhados sobre a mudança de emprego de cada trabalhador, sendo capaz de manter uma lista negra eficaz. Em certos casos, um trabalhador só conseguia emprego depois de concordar em agir como informante. Quando embates trabalhistas estouravam, capangas privados, polícia, mandatos judiciais, assim como as penitenciárias da cidade e da região estavam a seu dispor. Extensos fundos anti-greve eram disponibilizados às companhias.

A Aliança usou também seu poderio econômico para destruir qualquer empresa que assinasse um acordo trabalhista. Somente era permitido o acordo com o trabalhador individual. Jornais que apresentassem a mais sutil tendência liberal quanto a assuntos do movimento trabalhista eram boicotados.

Escolas técnicas foram criadas para oferecer profissionais especializados e, acima de tudo, garantir aos patrões um exército permanente de fura-greves. Estudantes eram doutrinados com ideologias anta-sindicais e respeito pela administração. Uma das publicações das escolas técnicas pregava: “Seu patrão é seu superior, tem mais direito sobre você do que você sobre ele”.7

As greves de 1916

Até 1914, foram criados apenas quatro novos sindicatos em Mineápolis. Entre 1914 e 1916, a Primeira Guerra na Europa enriqueceu os negócios locais e os patrões enfrentaram apenas três greves.

Mas, em 1916, houve uma mudança. No norte do estado, o Industrial Workers of the World liderou greves de cerca de 15.000 mineiros. Na região, milhares de lenhadores também se revoltaram. O IWW, através de um de seus sindicatos afiliados, como a Organização dos Trabalhadores Agrícolas, conseguiu organizar cerca de 20 mil trabalhadores agrícolas do estado de Minnesota, responsáveis por mais de 50% da colheita daquele ano.

Em Mineápolis, o sindicato dos maquinistas percebeu a impossibilidade de encarar sozinho o poderio da Aliança dos Cidadãos ao tentar organizar os trabalhadores de uma das maiores fabricantes de máquinas e instrumentos agrícolas da cidade. Por isso, em vez de se restringir a uma categoria especifica, rompeu temporariamente com a tradição e expandiu sua greve, procurando organizar todas as categorias de trabalhadores ferroviários.

Na esteira da greve dos maquinistas veio um esforço organizativo dos caminhoneiros, envolvendo 1.200 trabalhadores em 150 empresas. A Aliança respondeu com um lockout, com ganga-teres usando violência física e ameaçando os trabalhadores com armas de fogo. O Conselho Conjunto dos Caminhoneiros contra-atacou com urna manifestação de massas e uma greve geral de todos os trabalhadores do transporte. O prefeito da cidade, sob ordens da Aliança dos Cidadãos, jogou a polícia contra os trabalhadores.

O uso da polícia revoltou amplas camadas da sociedade. Thomas Van Lear, candidato a prefeito pelo Partido Socialista e líder do sindicato dos maquinistas, utilizou isso a seu favor para vencer as eleições. Mas, por fim, todas as greves foram esmagadas. A Aliança contornou facilmente o chefe “socialista” de polícia, empossado par Van Lear, utilizando oficiais subordinados ao xerife de Hennepin County no lugar de policiais locais. O programa reformista do PS foi bloqueado pelo conselho municipal, onde os políticos alinhados à Aliança eram maioria.

O ano de 1917

O ano de 1917 trouxe dois eventos que afetaram profundamente Minnesota e o país inteiro: a Revolução Russa e a entrada dos Estados Unidos na Primeira Guerra. A tomada do poder pelos trabalhadores russos sob liderança de Lênin e Trotsky polarizou o Partido Socialista entre sua ala reformista e aqueles que sustentavam urna perspectiva revolucionária, que mais tarde fundariam o Partido Comunista.

Em Mineápolis, Van Lear foi expulso do Partido Socialista e, em sua tentativa de reeleição fracassada, em 1918, concorreu como candidato por um novo partido, criado por líderes reformistas da Associação de Profissionais e Trabalhadores de Mineápolis. Chamado de Liga Não-partidária Municipal, o novo partido tinha corno slogan “100% pelo ‘americanismo’” e apoiava as políticas do presidente Woodrow Wilson.

A Aliança dos Cidadãos aproveitou o clima político do período da guerra para intensificar seu ataque aos trabalhadores, criando a Comissão de Segurança Pública de Minnesota (OSNI). Sua orientação era indicada por seu jornal patronal, que, entre outras coisas, declarava: “Quando surge o estresse de uma guerra, o mecanismo governamental precisa, por necessidade, tornar-se mais ou menos autoritário”.

Um membro da Aliança dos Cidadãos que ajudou a arquitetar a CSPM declarou:

Não se falará de traição nas ruas desta cidade. Os oradores de esquina, que hoje denunciam o governo e defendem a revolução, denunciando também o exército e pregando o não-alistamento, logo verão o sol nascer por trás das grades de algum campo prisional nas pradarias.8

As liberdades democráticas foram suspensas. A CSPM, em atos de intimidação, prendia ou removia do emprego aqueles que se opunham à guerra. Manifestações eram banidas, Sedes e organismos de imprensa dos sindicatos ou pequenos fazendeiros eram invadidos ou fechados. Centenas de agentes realizavam dezenas de milhares de investigações, batidas noturnas e prisões.

O Estado estabeleceu a Guarda de Minnesota — 11 batalhões liderados pelos “homens de princípios”, sob controle do governador — para serem usados contra trabalhadores e manifestações. A Aliança dos Cidadãos aproveitou a oportunidade para organizar a Assistência Civil de Mineápolis, uma milícia paramilitar. Quando urna greve dos operadores de bonde explodiu cru Mineápolis e St. Paul, no ano de 1917, a Guarda Interna e a Assistência Civil foram mobilizadas para derrotar os grevistas.

O pós-guerra e o surgimento do FLP

Durante o pós-guerra, a Aliança dos Cidadãos buscou projetar-se mais energeticamente por todo o estado de Minnesota, promovendo grupos similares nas outras cidades. isso fortaleceu seus esforços pela aprovação de projetos de seu interesse na Câmara estadual.

Na onda de greves do pós-guerra, a Aliança não estava determinada apenas em lutar contra o closed shop: partia para a ofensiva buscando reverter as conquistas da AFL e tentando destruir suas jurisdições profissionais, incluindo aquelas do setor de construção. Em pouco tempo, dois terços dos projetes de construção em St. Paul não eram mais sindicalizados. A Aliança defendia propostas de leis que buscavam não apenas limitar os piquetes, mas bani-los por completo.

Olhando em retrospectiva para o período de terror da guerra, vemos que muitos dos trabalhadores e pequenos fazendeiros de Minnesota eram cientes de que a Comissão de Segurança Pública estava, na verdade, submetida a um esquema bipartidário, onde o poder era divido entre os Democratas e os Republicanos.

A política de oposição em Minnesota contava com um novo movimento, a Nonpartisan League (NPL — Liga Não-partidária). A NPL se originou em Dakota do Norte, onde o Partido Socialista encontrou uma resposta para suas agitações num setor significativo dos pequenos-fazendeiros, que acreditavam ser enganados pelas companhias ferroviárias, pelos mercados de grão, pelas companhias de processamento de produtos agrícolas e pelos bancos. Não à toa.

O PS conseguiu conferir um status “apartidário” ou não-partidário a esses pequenos-fazendeiros organizados. Em um estado onde três quartos dos eleitores viviam na zona rural, essa facção do partido cresceu rapidamente e desafiou a facção “ortodoxa”.

Temendo tal crescimento, o PS derrubou a vinculação dos não-partidários. Mas a fração resistiu à dissolução e continuou existindo sob a sigla NPL, com um programa reformista que tinha como objetivo criar processadores de grãos estatais e estabelecer um sistema de crédito rural para ajudar os fazendeiros. Sua tática era entrar com candidatos nas primárias do Partido Republicano. O resultado foi uma vitória arrasadora no Parlamento em 1916 e, em 1918, a NPL assumiu o Senado.

O movimento da NPL espalhou-se pelo estado de Minnesota, onde encontrou grande receptividade entre as pequenos-fazendeiros. Mas Minnesota era mais diversa do que isso. Embora estes constituíssem uma parte importante da população, a NPL não poderia ter sucesso se ignorasse a classe trabalhadora urbana de Mineápolis, St. Paul e Duluth, assim corno os mineiros de Iron Range e os trabalhadores espalhados pelo estado em indústrias corno a de madeira. Isso levou a AFL a estabelecer sua própria organização não-partidária e colaborar com a NPL.

Os Republicanos, porém, não permitiriam que a NPL assumisse o controle de regiões dominadas por seu partido, como havia acontecido em Dakota do Norte. No final, a NPL e AFL foram forçadas a lançar candidaturas nas eleições de 1920 sob a sigla do Partido dos Pequenos-Fazendeiros e Trabalhadores (FLP), e tiveram bons resultados. Em 1922 e 1923, respectivamente, ganharam as duas cadeiras do estado para o Senado dos EUA. Mas a Aliança dos Cidadãos e os Republicanos continuaram a dominar a política de Minnesota. Na eleição de 1922, os votos do Partido Democrata diminuíram para 10%, com o FLP abocanhando os votos que eram do Partido Democrata.

O FLP, ainda que contivesse seguidores leais entre as duas classes presentes em seu nome, era, em essência, um partido reformista, permeado por elementos pequeno-burgueses que, aos poucos, assumiram sua direção (Floyd B. Olson, governador pelo FLP em 1930, era um promotor de Hennepin County, que havia tentado inicialmente entrar na política como Democrata; Elmer Benson, que se tornou o segundo governador pelo FLP, depois de Olson, era um banqueiro rural).

No início de 1923, alguns líderes sindicais, como o membro reformista do Partido Socialista, William Mahoney, pensavam que a participação de membros do Partido Comunista no PS poderia fortalecer sua posição diante do FLP.

Outros, como Robley Cramer — editor do Labor Review, de Mineápolis — mantinham em relação ao PC a seguinte atitude: “Não são muito numerosos; são bons trabalhadores e urna força dinâmica esplêndida (…) Podem ajudar bastante se estiverem com você e podem dar muito mais trabalho se os mantiver fora”.9

Mas o Partido Comunista desenvolveu políticas desastrosas e oportunistas em relação ao FLP. Não compreendia a necessidade da classe trabalhadora exercer um papel dominante, como defendeu o Partido Bolchevique na Revolução de Outubro de 1917, onde o campesinato foi arrastado pela classe trabalhadora na formação do Estado Operário. Somente em 1928 a questão seria compreendida por alguns membros do PC. A aliança entre os elementos da AFL e do PS com o PC seria de curta duração, na medida em que eram cada vez mais atacados pela ala conservadora do FLP, cuja luta final levou à expulsão do PC.

Os líderes da regional sindical 574 dos caminhoneiros de Mineápolis

Em 1915, Vincent Dunne conheceu Cari Skoglund em Mineápolis. Skoglund, um imigrante sueco, se juntou ao Partido Socialista em 1914. Dunne fora um membro do IWW, e Skoglund introduziu-o ao marxismo. Ambos apoiaram a Revolução Russa e, depois, se juntaram ao Partido Comunista. Dunne e Skoglund vivenciaram em Minnesota muitas das grandes lutas de sua época.

Em 1924, conheceram James P. Cannon, um membro dirigente do Partido Comunista, que passava por Minnesota em urna de suas viagens como enviado da lnternational Labor Defense (ILL —Defensoria Internacional do Trabalho). Impressionados com Cannon, se aproximaram dele quatro anos depois, em 1928. Estavam ambos profundamente preocupados com a expulsão de Leon Trotsky e Gregory Zinoviev do Partido Comunista. Cannon, igualmente preocupado, apenas respondeu: “Quem sou eu para condenar os líderes da Revolução Russa?”10

Ao final daquele ano, Cannon foi à União Soviética participar do Sexto Congresso Mundial da Internacional Comunista. Lá, obteve o documento de Trotsky intitulado “Crítica ao Esboço de Programa da Internacional Comunista”.

O documento deixava clara a orientação anti-marxista da facção Stalin-Bukharin, que falhava ao não reconhecer as contradições internacionais do capitalismo e ao defender que o socialismo poderia ser construído dentro das fronteiras da União Soviética. Trotsky, por outro lado, defendia que a União Soviética poderia ser defendida apenas com base numa perspectiva internacional da revolução mundial e somente assim poderia haver um avanço mundial rumo ao socialismo,

O documento revelava como, na China, lia Inglaterra e em outros países, a facção de Stalin havia subordinado a classe trabalhadora às forças não-proletárias. Numa seção complementar, tratava das políticas oportunistas defendidas por Stálin em relação ao FLP americano, onde os pequenos-fazendeiros eram defendidos enquanto uma força revolucionária independente. Trotsky insistia, de acordo com a teoria da revolução permanente, que a pequena-burguesia não poderia desempenhar nenhum papel revolucionário independente e deveria ser armada e dirigida pela classe operária, com base num programa marxista.

Cannon voltou para Nova Iorque e iniciou, imediatamente, com base na perspectiva de Trotsky, a organização de uma oposição dentro do Partido Comunista dos EUA. Em um curto período de tempo, ele e seus apoiadores foram expulsos por seus oponentes no PC americano. Em seguida, o partido emitiu diretivas que praticamente obrigavam suas outras seções a referendar cegamente a expulsão de Cannon.

Em Mineápolis, no entanto, Cari Skoglund e Vincent Dunne se recusaram a votar peia expulsão e pediram mais informações, sendo também expulsos do partido. Os dois tinham experiência pessoal com expulsões, tendo sido banidos da AFL em 1926, durante o “Red Purge” [Expurgo Vermelho] conduzido pela burocracia. Dunne, que havia sido candidato pelo FLP, também fora expulso daquela organização no início de 1928. No final, mais de duas dúzias de membros do PC em Mineápolis foram expulsas. A maioria se juntou à Oposição depois de conhecer o programa de Trotsky.

O grupo de Cannon finalmente estabeleceu a Oposição de Esquerda nos Estados Unidos, sob o nome de Communist League of America (CLA —Liga Comunista da América). Durante esse período, os seguidores de Trotsky procuravam influenciar os Partidos Comunistas de volta para a perspectiva marxista e internacionalista, numa luta contra as lideranças stalinistas. Essa época foi muito rica no desenvolvimento teórico da CLA.

“Passávamos um bom tempo estudando os clássicos do marxismo e discutindo como construir um caminho revolucionário”, relatou Farrel Dobbs, que se juntou à CLA antes da greve de 1934.11

Burocracia sindical versus sindicalismo operário

O maior bloqueio à luta dos trabalhadores era a burocracia da AFL. O crescimento e as transformações na estrutura do capitalismo, principalmente o desenvolvimento qualitativo da divisão do trabalho trazido peia linha de montagem, embasou a política reacionária da AFL, que fragmentava os trabalhadores fabris em diferentes ofícios.

O presidente do Teamsters International [sindicato dos caminhoneiros], Daniel Tobin, personificava a figura do burocrata sindical de direita e conservador. Em 1934, seu ódio pelos dirigentes trotskistas da regional 574 veio à tona quando esses aproximaram auxiliares de motorista e trabalhadores dos depósitos para filiarem-se ao sindicato local. Tobin chamava esses trabalhadores não-qualificados ou não-motoristas de “lixo”. Em 1933, quando começou a revolta, Tobin declarou: “A mistura na adesão ao sindicato está em vigor… Não queremos esses homens hoje se amanhã entrarão em greve”.12

Em 1934, os trotskistas não possuíam quaisquer posições oficiais dentro da regional 574. Bill Brown, o presidente da regional, era urna exceção ao típico burocrata. Ele apreciava a colaboração com os trotskistas.

Mas a maioria dos diretores do sindicato seguia Tobin, O número de membros do sindicato nos galpões de carvão, às vésperas da greve, era de meros 75 trabalhadores, resultados de um. acordo de bastidores entre o sindicato e um pequeno grupo de empresas distribuidoras de carvão, que concordaram com o closed shop em troca de serviços escusas por parte do sindicato. Os chefes do sindicato estavam satisfeitos com esse estado de coisas e não tinham qualquer intenção de organizar os trabalhadores.

Prelúdio a 1934

Em 1930, Floyd B. Olson foi eleito o primeiro governador de Minnesota pelo FLP. Durante sua campanha, havia estabelecido os “Comitês Supra-partidários por Olson”, num esforço por obter apoio entre setores dos Democratas e Republicanos. Ao assumir o governo, benefícios e cargos foram oferecidos aos que tinham apoiado sua eleição.

Uma das primeiras lutas que abalaram o meio-oeste foi a greve dos pequenos-fazendeiros de 1932-33, organizada pela National Farm Holiday Association. Entre 1920 e 1930, os preços dos produtos agrícolas haviam caído. A renda liquida anual caiu de US$ 15,4 bilhões para US$ 9,3 bilhões. Cerca de 450 mil proprietários perderam suas fazendas. O valor da propriedade agrícola caiu em US$ 20 bilhões e o preço dos arrendamentos aumentou em US$ 200 mil.13

A greve envolveu dezenas de milhares de fazendeiros. Rodovias e ferrovias que conduzem a grandes cidades — Iowa, Nebraska, Dakota do Sul e Minnesota — foram bloqueadas para barrar a circulação das mercadorias agrícolas, na tentativa de criar escassez para subir os preços. Os grevistas interromperam execuções de hipoteca de fazendas. Ocorreram batalhas acirradas com oficiais da polícia, onde alguns fazendeiros foram mortos.

É bem possível que os caminhoneiros que levavam seus produtos de Mineápolis a outras cidades no período tenham aprendido com as técnicas da greve dos fazendeiros, que paravam os caminhões nas estradas e derramavam as cargas. Pouco depois, a associação dos fazendeiros que organizou a greve, a National Farm Holiday Association, foi uma das maiores contribuintes, inclusive financeiramente, da greve dos caminhoneiros do 574.

Em Austin, Minnesota, cerca de 90 milhas ao sul do Mineápolis, um jovem trabalhador de urna empresa de embalagens, chamado John Winkels, se juntou aos piquetes dos fazendeiros e ajudou a impedir a circulação dos produtos agrícolas para o mercado local. Mais tarde, em 1933, Winkels ficou conhecido por dirigir a ocupação do abatedouro da George A. Hormel & Company.

Na ocasião, Olson mobilizou a Guarda Nacional e a enviou para Austin. Winkels e seus companheiros responderam com barricadas de sacos de areia na entrada da empresa. “Pegamos espingardas, rifles, pistolas, estilingues, munição e qualquer coisa que conseguíssemos arremessar”, afirmou. “Pegamos até uma velha metralhadora. Dissemos a eles que estávamos preparados — e que viessem!”.14

Olson conseguiu desarmar a luta em Austin, estabelecendo um acordo de reconhecimento sindical. Mas sabia que uma coisa era bajular um capitalista isolado da região rural de Minnesota até extrair dele um acordo, e outra, completamente diferente, era reconciliar a Aliança dos Cidadãos e os grevistas mobilizados de Mineápolis.

A proliferação das lutas dos fazendeiros e trabalhadores industriais fez com que Olson se afastasse do conservadorismo dos primeiros dias de sua administração. Em 1933, tentou mudar a legislação para aprovar um programa de seguro-desemprego.

A Aliança dos Cidadãos se revoltou contra a proposta, condenando-a como “o mais avançado controle socialista da vida e da indústria”. Olson tentou conversar com a oposição. Alertou:

A indústria, tendo como única preocupação o lucro, não lembrou-se do bem-estar dos trabalhadores (…) Agora, resta ao Estado fazer o que ela não foi capaz de fazer (…) Esta proposta é uma tentativa, sábia ou não, de remendar o assim chamado sistema capitalista — para evitar a socialização da indústria (…).15

Maio de 1934: os preparativos da greve

Depois do sucesso da greve do carvão em fevereiro, os trotskistas não pararam para contemplar a vitória. Tomaram a decisão de expandir a luta além dos galpões de carvão, iniciando uma campanha para organizar os trabalhadores de toda a indústria do transporte, de motoristas a seus auxiliares, trabalhadores das docas e plataformas até trabalhadores dos armazéns. Eles imprimiram uni panfleto onde colocavam aos trabalhadores os seguintes argumentos:

VOCÊ SABIA? Que sob a Seção 7 da NIRA [Lei de Recuperação da Indústria Nacional] os trabalhadores não só têm garantido o direito de se organizarem, como têm garantido o direito de exercerem esse privilégio sem discriminação?

VOCÊ SABIA? Que os trabalhadores do transporte de carvão de Mineápolis tiraram vantagem desse privilégio para se organizarem e, através dessa organização, conquistaram um aumento salarial de 25%?

O panfleto despertou um grande interesse dos trabalhadores, que foram bater na porta da regional 574. O sindicato encheu a regional com novos membros antes que Tobin, localizado em Indianápolis, Indiana, pudesse sabotar a operação.

Trabalhadores demitidos dos galpões de carvão foram mobilizados corno organizadores do sindicato, onde ganharam experiência corro oradores para acelerar e divulgar a campanha. Foram feitas reuniões especiais, estabelecidas e formalizadas as demandas contratuais, processo no qual a regional sindical teve um maior conhecimento da indústria do transporte como um todo.

No dia 15 de abril, o sindicato veio a público com o resultado de sua campanha e organizou um comício num teatro no centro da cidade. Na ocasião, mais de 3.000 trabalhadores compareceram e se filiaram ao sindicato. Decidiu-se tirar vantagem da popularidade do governador Olson e, principalmente, registrar seu apoio à greve, chamando-o a falar em público. Olson não compareceu, mas enviou um subordinado para ler urna carta em seu nome. Num dos trechos, declarava, “É meu conselho, se vocês desejam aceitá-lo: sigam o caminho sensato, se agrupando para sua própria proteção e beni-estar”.16

Fortalecido, o sindicato começou a preparar a greve. Alugou uma garagem gigantesca para servir como quartel-general. Montou uma cozinha para alimentar os grevistas. Instalou um hospital, empregando enfermeiras voluntárias e um médico, deixando claro que a direção do sindicato não tinha quaisquer ilusões de que a luta seria ganha sem confronto. Mecânicos foram recrutados para fazer a manutenção da frota de 450 veículos, que durante a greve seria usada para despachar os piqueteiros por várias regiões.

Todos os membros da Liga Comunista em Mineápolis foram absorvidos pelos preparativos da greve. Eles assumiram a organização dos 30.000 desempregados da cidade, de modo a impedir que fossem utilizados como fura-greves, e trouxeram seus melhores elementos para as fileiras dos grevistas.

Também organizaram um grupo de assistência feminino, trazendo as esposas dos grevistas para fornecer apoio e integrar as equipes do hospital e cozinha. No auge da greve, cerca de 10.000 trabalhadores e suas famílias passavam pelo refeitório num único dia. O grupo de assistência se tornava mais importante a cada dia, na medida em que a greve se desenrolava. Realizavam manifestações de até 700 mulheres na prefeitura da cidade, para pressionar os proprietários das moradias a retirar os pedidos de despejo contra grevistas que atrasassem os aluguéis. Além disso, formavam piquetes nos escritórios da imprensa capitalista para protestar contra as mentiras e falsificações que eram publicadas.

Houve uma divisão do trabalho interna aos grevistas, onde os trabalhadores mais hábeis eram designados “capitães de piquete”. Esquadrões especiais compostos pelos membros mais aguerridos do sindicato eram mantidos em alerta, prontos para entrar em ação nos momentos críticos. Mensageiros de motocicleta faziam a comunicação entre os núcleos espalhados pelo amplo campo de batalha, e patrulhas de automóveis vasculhavam a vizinhança em busca de caminhões fura-greve, notificando o quartel-general.

Começa a greve!

As reivindicações do sindicato foram rejeitadas pelas companhias de transporte e, no dia 15 de março, a regional 574 aprovou, por unanimidade, a deflagração de greve para o dia seguinte.

Nos primeiros dias, piquetes móveis interromperam as atividades de transporte, enquanto mais e mais motoristas, auxiliares e trabalhadores dos galpões e armazéns se juntavam ao sindicato, aumentando seus filiados para a marca dos 6.000 membros. A polícia entrou em ação, prendendo 169 trabalhadores nos primeiros quatro dias. O valor das fianças chegava a 50 dólares por trabalhador. Alguns eram sentenciados a prestar trabalho comunitário por 10-45 dias.

Um dos jornais locais, o Tribune, alertou no quinto dia de greve:

O suprimento dos alimentos da cidade começa a sentir o impacto da greve (…) Uma interrupção geral na funcionamento das padarias deve ocorrer dentro de um dia, Nos supermercados, situações similares se aproximam.17

No dia 19 de maio, grandes contingentes policiais foram mobilizados para escoltar os caminhões de transporte. Os grevistas, desarmados, se envolveram nos primeiros combates sérios com a policia. Mais tarde, naquela noite, um espião infiltrado no quartel-general foi capaz de despachar três caminhões lotados de piqueteiros para unia localidade onde a polícia e a Aliança dos Cidadãos os esperavam. Além disso, conseguiu convencer um grupo de mulheres a acompanhar os grevistas.

Quando os piqueteiros chegaram, a armadilha se revelou e todos foram violentamente espancados. Gari Skoglund descreveu a cena da seguinte forma:

Me lembro daquela noite. Trouxemos de volta as mulheres e os piqueteiros do Beco do Tribuno para dentro do quartel-general da greve. As mulheres tinham sido mutiladas e estavam cobertas de sangue, duas ou três com pernas quebradas; várias permaneceram inconscientes por horas. Bastões foram usados contra homens e mulheres.18

Em outras ocasiões, o uso de tamanha violência pela polícia e capangas colocava medo nos trabalhadores. Mas, dessa vez, o incidente enfureceu os grevistas, que rapidamente se armaram com todo tipo de bastão que puderam encontrar. O cenário estava pronto para as batalhas sob o nome cio “Dia da Fuga dos Deputados”.

De um lado, centenas de policiais e “deputados” da Aliança dos Cidadãos se aglutinaram no distrito dos mercados. Esses “deputados” eram mercenários contratados pela Aliança dos Cidadãos para os confrontos na greve, cujo custa individual era de cerca de US$ 75 mil a US$ 100 mil por mês.

O sindicato deslocou cerca de 500 piqueteiros e manteve 900 trabalhadores aguardando no quartel-general. Durante a noite, outros 600 grevistas infiltraram-se secretamente, em grupos de três, nas sedes da AFL próximas ao distrito dos mercados dos burgueses. Com o primeiro movimento dos caminhões nos mercados, as forças secretas do sindicato vieram à luz. Começou, então, o confronto. Na medida em que conflito aguçava, um número maior de deputados fugia, deixando a polícia sozinha para absorver a força do ataque. Cerca de 30 policiais foram hospitalizados.

No dia seguinte, o chefe de polícia de Mineápolis, Michael Johannes, convocou a Legião Americana, que forneceu 1.500 homens e vasculhou as penitenciárias, procurando por potenciais capangas. Novos deputados foram recrutados pela Aliança dos Cidadãos.

Do outro lado, trabalhadores da construção civil e do setor elétrico foram às ruas em apoio à greve e se juntaram ao exército da regional 574. Cerca de 20-30 mil pessoas, incluindo espectadores, encheram a região do mercado no centro da cidade, esperando que o confronto começasse. Uma estação de rádio local posicionou equipamentos portáteis para fornecer um relato preciso de combate. Novamente, o primeiro movimento de transporte de cargas detonou a batalha.

O historiador William Millikan fez o seguinte relato daquele dia com base nos informes dos deputados da Aliança dos Cidadãos, que evidencia bem o medo sentido por eles naquele momento:

Seguindo seu plano de batalha, milhares de piqueteiros enfurecidos recuaram para o sul, da Primeira Avenida para a Sétima Rua, de onde marcharam em direção aos trilhos ferroviários. Reforçados por três carregamentos de grevistas armados, deram de encontro com uma linha de policiais localizada na esquina da Sétima Rua com a Terceira Avenida, entre a companhia de cerveja Weisound Malt & Beer Company e o centro de passageiros Mineápolis Anoka & Cuyuna Range Railroad.

Ainda que os 23 oficiais de polícia tenham atrasado brevemente a marcha, os deputados posicionados na esquina nordeste da intersecção foram orientados a fugir para a zona do mercado. Sem líderes e inferiorizados numericamente, numa proporção de 50 para 1, eles rapidamente seriam destroçados.

Três esquadrões observavam ansiosamente em frente à Gamble-Robinson Company, conforme a multidão de grevistas “desembestava e descia pela Terceira Avenida como um bando de hienas”. Quando os piqueteiros começaram e descer correndo a Terceira Avenida, os deputados fugiram e se esconderam num beco. Dentro de minutos, gritos de “aí vêm eles!” foram ouvidos em frente à Ryan Potato Company, na rua Terceira e na Sexta. O diretor da Aliança dos Cidadãos, Arthur Lyman, gritou para diversos esquadrões, ordenando que avançassem e defendessem a esquina. A multidão varria a Terceira Avenida, os grevistas “pareciam estar além de qualquer senso de razão e, certamente, estavam completamente enfurecidas, espalhando selvageria”. A batalha decisiva pelo controle do distrito do mercado de Mineápolis estava prestes a começar.

Uma massa de vários milhares de grevistas enfurecidos tomou a Sexta Rua em dez minutos, preenchendo-a por completo e até mesmo cobrindo parte da entrada da rua do mercado. O exército da Aliança dos Cidadãos recuou sob um bombardeio de tijolos, garrafas, caixas de fruta, paus e chaves de roda. Diante do ataque dos grevistas, os deputados, feridos, sangrando ou inconscientes, foram arrastados para fora da rua.

Numa luta corpo a corpo, mais deputados foram derrubados, atingidos por mangueiras, canos, tacos de basebol e ganchos de ferro. Quando um deles, ferido, mostrava seu distintivo, era atingido na cabeça. Deputados cobertos de sangue rastejavam ou eram arrastados para os prédios da Sexta Rua ou, ainda, rolavam para baixo dos veículos na tentativa desesperada de fugir da ferocidade dos grevistas. Um deles relatou que “os motoristas de caminhão nos odiavam feito loucos”.

Conforme os grevistas avançavam, um dos deputados gritou em alto e bom som para os oficiais de polícia próximos: “Pelo amor de deus, saquem suas armas. Eles vão nos matar!”

Isolados, sem qualquer liderança, em forte desvantagem numérica e combatidas violentamente pelos grevistas, os deputados, desmoralizados, perdiam sua formação e corriam desesperadamente para se protegerem.19

Tanto a polícia quanto os deputados desapareceram da zona do mercado e os piqueteiros assumiram posições, dirigindo o trânsito. Foi uma vitória retumbante. Os acontecimentos estimularam os trabalhadores de todo o país. Como comenta Dobbs:

Os cinejornais, que na época eram parte do entretenimento nos cinemas, mostravam cenas do combate filmadas durante a batalha de terça-feira. Trabalhadores de todas as partes reagiram com entusiasmo às notícias. O público nos cinemas aplaudiam quando viam os piqueteiros batendo nos policiais, uma vez que, na maioria das greves, ocorria exatamente o contrário.20

A importância dos confrontos dos dias 21 e 22 de maio, ao lado de outras grandes greves dos trabalhadores das montadoras de Toledo, Ohio e dos trabalhadores das docas de São Francisco, foi resumida no momento por James P. Cannon da seguinte forma:

A fé messiânica na administração Roosevelt, que caracterizava o movimento grevista no ano passado e que, até certo ponto, forneceu o impulso inicial ao movimento, desapareceu amplamente ou deu lugar a uma desconfiança ou ceticismo (…) Os trabalhadores em greve dependem antes de tudo, agora, de sua própria organização e capacidade de luta. Esperam pouco ou nada da fonte que, um ano atrás, contemplavam esperando tudo (.,,) O que ocorreu, de fato, foi uma migração em sua fé, da NIRA governamental passou para suas próprias mãos, sua própria força.21

Os burocratas da AFL de Mineápolis, acima de tudo, estavam desesperados com os conflitos e o desenvolvimento do movimento. Não queriam que a greve fosse resolvida pelo movimento independente dos trabalhadores, mas que ficasse sob o controle do governador Olson. Se encontraram com membros da prefeitura, num esforço para encerrar as lutas de rua e trazer o governador à cidade. O prefeito Republicano A. G. Bainbridge pediu que Olson mobilizasse a Guarda Nacional, o que ele fez. Nesse momento, entretanto, as unidades da guarda ainda se limitavam a permanecer nos arredores da cidade. A regional 574 denunciou imediatamente a convocação da Guarda e organizou uma manifestação em massa dos trabalhadores.

Uma série de tumultuadas negociações começou, forçando 166 companhias a reconhecerem a legitimidade do sindicato, conquistando o closed shop, e a aceitarem o retorno ao trabalho de todos os trabalhadores, incluindo aqueles que os empregadores queriam punir pelos “crimes” realizados durante a greve. O status de trabalhador sênior também foi reconhecido. No entanto, foram inseridos trechos ambíguos sobre a vinculação dos trabalhadores dos armazéns e galpões ao sindicato. A questão dos salários foi deixada para negociação futura.

Ainda assim, os líderes da greve acreditavam que o acordo constituía uma base a partir da qual ganhos futuros poderiam ser obtidos, e recomendaram que os membros o aceitassem. No dia 31 de maio, o acordo foi assinado e os trabalhadores logo voltaram ao trabalho.

Até esse momento, Cannon e a direção da Liga Comunista de Nova Iorque tinham dado orientações à greve somente por telefone. Mas Cannon reconheceu no momento a necessidade de colocar todo o partido em apoio à luta em Mineápolis. Viajou para a cidade, seguido logo depois por outros membros importantes do partido, para expandir a organização prática e política da luta. Entre aqueles que foram para Mineápolis estavam Max Shachtman e o advogado do partido, Albert Gole man.

Duas semanas após a ratificação do acordo, a Aliança dos Cidadãos recuperou sua compostura e começou a trabalhar na reversão das conquistas da greve de maio. A negociação em torno de futuros reajustes salariais foi quebrada e a inclusão dos trabalhadores dos armazéns e galpões ao sindicato foi negada.

O governador Olson, que havia se comprometida com o apoio à inclusão desses trabalhadores, retrocedeu e disse que a questão teria que ser negociada. A Comissão Regional do Trabalho apoiou a Aliança dos Cidadãos e negou ao sindicato a representação desses trabalhadores.

Além disso, os empregadores deixaram de pagar os reajustes salariais do acordo de fevereiro e trabalhadores não-sindicalizados foram demitidos. O reconhecimento do status de trabalhador sênior foi violada. Alguns trabalhadores receberam aumentos, numa tentativa de aprofundar a divisão entre as fileiras da classe. Ao todo, a regional 574 registrou 700 reclamações no decurso de um período relativamente curto.

Contra isso, no entanto, começaram os preparativos para uma nova e maior greve.


Referências

1. Willian Millikan, A Union Against Unions: The Minneapolis Citizens Alliance and its Fight Against Organized Labor, 1903-1947 (Imprensa da Sociedade Histórica de Minnesota, 2001), p. 268.

2. MILLIKAN, pp. 249-50.

3. Everett Luoma, The Farmer Takes a Holiday: The Story of the National Farmers’ Holiday Association and the Farmers’ Strike of 1932-1933 (Exposition Press, 1967), p. 25.

4. Kenneth Davis, FDR: The New Deal Years 1933-1937 (Random House, 1986), pp. 326-27.

5. MILLIKAN, pp. 5-6.

6. MILLIKAN, p. 30.

7. MILLIKAN, p. 69.

8. MILLIKAN, p. 103.

9. Millard Gieske, Minnesota Farmer-Laborism: The Third-Party Alternative (Imprensa da Universidade de Minnesota, 1979), pp. 83-84.

10. James P. Cannon, The History of American Trotskyism (Pathfinder, 1972), p. 47.

11. Farell Dobbs, Teamster Rebellion (Anchor Foundation, Inc., 1972), p. 34.

12. Art Preis, Labor’s Giant Step: Twenty Years of the CIO (Pioneer Publishers, 1964), p. 41.

13. LUOMA, pp. 16-17.

14. Interview with Pioneer Packinghouse Organizer: How Sitdown Won First Hormel Strike (Bulletin, September 10, 1985), p. 8.

15. MILLIKAN, pp. 256-57.

16. DOBBS, p. 65.

17. Charles Rumford Walker, American City: A Rank-and-File History (Farrar & Rinehart, New York), p. 105.

18. Walker, p. 108.

19. MILLIKAN, pp. XXIX-XXX.

20. DOBBS, p. 92. 21. James P. Cannon, The Communist League of America 1932-34 (Anchor Foundation, Inc., 1985), pp. 334-35.

21. James P. Cannon, The Communist League of America 1932-34 (Anchor Foundation, Inc., 1985), pp. 334-35.