Transição Socialista

Viva Engels!

Neste sábado, 28 de novembro, completam-se 200 anos do nascimento do revolucionário alemão Friedrich Engels, amigo e colaborador de Karl Marx por toda a vida. Ambos são considerados os fundadores do socialismo revolucionário. Aqui destacamos brevemente a importância de Engels nesse processo.

A influência de Engels sobre o desenvolvimento intelectual de Karl Marx não pode ser desprezada (e sempre foi ressaltada por este). É sabido, por exemplo, o enorme impacto que causou em Marx a leitura do “Esboço de uma Crítica da Economia Política”, escrito por Engels em 1843 para publicação nos Anais Franco-Alemães (revista dirigida por K. Marx e A. Ruge). Tal “esboço genial de Engels”, como falou depois Marx, foi decisivo para que este começasse a sair de especulações políticas humanistas, de caráter pequeno-burguês e idealista, e encaminhasse suas reflexões para a “anatomia” da sociedade capitalista (seu funcionamento “econômico”). Ou seja: Engels, que já acompanhava o desenvolvimento industrial da Inglaterra e a Economia Política inglesa, era mais precoce que Marx na crítica (proletária) da Economia Política. É em grande medida graças a tal influência de Engels que Marx redigiu os chamados “Manuscritos de 1844” (ou “Econômico-Filosóficos”), que, apesar do traço ainda pequeno-burguês e idealista, demarcam um avanço importante nas reflexões de Marx. Também foi fundamental, no mesmo período, a redação, por Engels, de “A Situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”, onde o autor – apesar dos traços idealistas – antecipa importantes elementos do que depois será chamado de “concepção materialista da história”. Engels era, portanto, um jovem genial!

Marx, que antes de 1844 havia visto Engels somente uma vez (e não tivera boa impressão), agora não via o momento de encontrá-lo novamente. Em 1844, em Paris, encontram-se pela segunda vez, com mais tempo, conversam e entram em acordo sobre os pontos de vista mais importantes de suas reflexões. Inicia-se aí, então, um processo de trabalho, reflexão e produção conjunta que se manteria por praticamente 40 anos, parando apenas com a morte de Marx (1883). É fruto dessa colaboração não apenas a nova concepção da história, materialista (desenvolvida a partir da obra conjunta de 1845/46, denominada posteriormente de Ideologia Alemã), mas também uma série de elaborações táticas e estratégicas para a luta proletária, seja nos tempos da Liga dos Comunistas ou da Associação Internacional dos Trabalhadores (Primeira Internacional). Fundamental é também o diálogo de ambos no quesito “econômico”, visando à compreensão das leis de funcionamento do capitalismo (para o que Engels forneceu a Marx muitas informações diretas do mundo fabril). Sem tal diálogo, registrado em dezenas de cartas, não teríamos O Capital, a crítica da Economia Política, em toda a sua riqueza atual. Como diz Marx, em carta de agosto de 1867 a Engels, após terminar a revisão do volume primeiro de O Capital para publicação: “Este tomo está pronto. Somente a você devo isso! Sem a sua entrega pessoal eu não teria conseguido, por nada neste mundo, realizar este grande trabalho”.

Pouco é necessário falar sobre a ajuda financeira dada por Engels a Marx nos períodos financeiros mais difíceis de sua vida. Engels, muito a contragosto, no início da década de 1850 assumiu parte dos negócios industriais de seu pai, tendo em vista sustentar sua família e ao mesmo tempo a grande família de Marx (o qual, ainda assim, viveu muitos anos em penúria). Marx só pôde ficar muitas horas por dia no Museu Britânico, estudando, ao longo dos anos 1850 e 1860, graças ao auxílio financeiro dado por Engels! E quantos não foram os artigos escritos por Engels para diversos jornais, mas assinados por Marx (com destaque para os do New York Tribune)? Não só a assinatura era de Marx, mas também os honorários da publicação. Assim, com a ajuda financeira direta ou indireta de Engels, Marx pôde se focar no desenvolvimento de sua crítica. Sem Engels não haveria O Capital em sua riqueza atual!

A última afirmação, é sempre bom sublinhar, também se refere ao próprio projeto editorial geral de publicação dos três livros de O Capital. Não fosse pela iniciativa editorial de Engels, as gerações marxistas do final do século XIX e até metade do século XX conheceriam muito menos O Capital. É verdade que Engels fez escolhas editoriais na sua sistematização da obra de Marx para a publicação dos volumes II e III, algumas a se discutir, mas sem dúvida tudo teria sido muito pior se ele, na época, não o tivesse feito. Hoje podemos, é claro, ler os manuscritos de Marx conforme foram deixados pelo próprio autor, mas isso não diminui a importância, à sua época, da complexa iniciativa editorial de Engels.

Engels e Marx não são a mesma pessoa. Eles têm, obviamente, visões de mundo diferentes sobre vários temas (sobre dialética e ciência, sobre dialética e natureza, sobre estudos militares, sobre questões nacionais etc.). Mas nas questões candentes do movimento operário revolucionário, o primeiro e o segundo violino sempre tocaram juntos, martelando a cabeça das correntes pequeno-burguesas (reformistas, estatistas, anarquistas) localizadas no seio do movimento da classe trabalhadora.

Para comemorar os 200 anos do revolucionário alemão F. Engels, a TS disponibilizará nesta próxima semana uma tradução, direta do original alemão, do texto Princípios do Comunismo. Esse texto foi escrito por Engels ao final de 1847, como um primeiro esboço para o programa da Liga dos Comunistas. O texto foi em seguida substituído pelo famoso Manifesto do Partido Comunista (cujo nome, como indica a correspondência de então entre os autores, é de sugestão de Engels). A substituição dos Princípios pelo Manifesto não desmerece, de forma alguma, o rico esboço de Engels, que revela o quão arguto e consciente já era esse revolucionário comunista, com apenas 26 anos de idade. É claro que há limites teóricos no texto, se comparado ao que depois conformará a teoria marxista (sobretudo tendo em vista O Capital). Há traços ainda muito smithianos e ricardianos na análise “político-econômica” elaborada então por Engels, mas tais traços eram também comuns a Marx no período. O texto é assim importante para que os leitores acompanhem e compreendam o próprio desenvolvimento intelectual desses grandes pensadores, bem como compreendam, mais a fundo, o desenvolvimento teórico do movimento da classe operária.

Os Princípios do Comunismo, pouco conhecidos do público em geral, estão organizados na forma de 25 perguntas e respostas, contendo muitos elementos depois desenvolvidos no Manifesto. Chamamos a atenção, para finalizar este texto, à 19ª pergunta, a respeito da possibilidade de a revolução socialista acontecer em um só país. A resposta de Engels é categoricamente negativa. Temos aí um salutar lembrete aos neo-stalinistas que botam suas asas para fora, tentando nos fazer esquecer das manchas que lançaram sobre a bandeira do comunismo internacionalista de Engels e Marx.

Viva Engels!
Viva o comunismo!
Viva a auto-emancipação da classe trabalhadora!