Recentemente foi aprovada a medida provisória (MP) que permite a venda de parte do capital da Eletrobrás, empresa que possui 48 hidrelétricas, 12 termoelétricas, 2 usinas nucleares, 62 eólicas e uma solar. O governo, que hoje detém cerca de 60% da empresa, passará a ter 45%, mantendo seu poder de controle das decisões por poder de veto. Os jornais vêm destacando a forma desajeitada e obscura com que a operação vem sendo tocada. O texto aprovado foi vinculado a uma série de imposições de novos gastos, novas aquisições, inclusive de criação de uma nova estatal, tudo isso sem nenhum critério explícito ou claro. É o que a mídia chama de “Jabutis”, ou seja, emendas que nada têm a ver com o projeto em si, mas estão ali para agradar congressistas, distribuir futuras verbas a currais eleitorais, construir cabides de empregos a corruptos e fortalecer lastros de poder locais. No bom português: a boa e velha compra de votos.
A primeira coisa que nos vem à cabeça é: e eu com isso? O que vai mudar? O que podemos esperar é um aumento na nossa conta de luz nos próximos anos, além do aumento de outras mercadorias de necessidade básica, já que isso impacta o custo de produção de toda indústria do país. Os jabutis, enfiados para comprar votos, serão cobrados, mais cedo ou mais tarde, na nossa conta de luz, assim como o próprio custo da operação deve ser pago pelos trabalhadores através de reajuste na tarifa no médio prazo. E não é só isso: grande parte do dinheiro ganho com a venda servirá para subsidiar o não aumento nas tarifas no primeiro ano após a privatização (e assim não desestabilizar o governo antes da eleição).
O ministro da Economia, Paulo Guedes, não está nem um pouco preocupado com esse impacto no prato do trabalhador, mas sim em privatizar “qualquer coisa” o mais rápido possível e mostrar “serviço”, já que prometeu 1 trilhão em privatizações, das quais não se viu um tostão furado ainda. Do seu lado, os candidatos a compradores dessa fatia da Eletrobrás não se incomodam com os jabutis, ou mesmo com qualquer trambique do governo federal e seu impacto para a população, desde que possam fazer o que realmente seja necessário para alavancar seus lucros: demissões e rebaixamento salarial em massa. Com essa prerrogativa, o mercado privado comprará tranquilamente o oferecido, com vistas em poder explorar mais intensamente durante muitos anos todo um setor fundamental da indústria brasileira.
A FNU (Federação Nacional dos Urbanitários – CUT) convocou no dia 21 de junho uma paralisação de 72 horas, contra a aprovação da MP da privatização, em defesa do patrimônio nacional, da indústria nacional, etc. A paralisação teve pouca visibilidade e não surtiu efeito, já que a MP foi aprovada sem dificuldade. A verdade é que todo o palavrório nacionalista levantado pelos pelegos da CUT é usado para esconder sua capitulação, ao não defenderem a ferro e fogo os empregos da Eletrobrás.
O fato é que o facão e degradação dos empregos já começaram bem antes da possibilidade de privatização. Nos últimos cinco anos a Eletrobrás demitiu mais da metade do seu quadro de funcionários, foram mais de 14 mil demissões. Em 2019 a empresa aplicou um PDV para cerca de 1700 trabalhadores, para 600 em 2020 e 500 em 2021. A perspectiva é que haja mais de 450 demissões apenas na usina de Furnas-MG esse ano. Não à toa, na aprovação da MP por Bolsonaro, este vetou o único ponto que dava proteção de apenas 1 ano aos trabalhadores, sem qualquer resistência.
A venda de parte do capital, possibilitada pela MP, deve se concretizar apenas em meados de 2022. E o que faz a CUT? Não deveria haver mais mobilizações para que a operação fosse bloqueada, já que demorará a se concretizar? Assim vemos claramente o intuito criminoso da CUT e sindicatos pelegos: a paralisação foi apenas um blefe. As bandeiras nacionalistas são utilizadas para dar certo ar de radical ao sindicato e chamar uma mobilização morna. Ao mesmo tempo eles conseguem separar o que acontece na Eletrobrás do que está acontecendo no restante do país, que são demissões em massa e rebaixamento salarial em massa. Tal omissão nos parece ainda mais grave na medida em que o governo está em frangalhos, frágil e na corda bamba. Hoje, uma mobilização que enfrente a direção da Eletrobrás e se una com outras categorias tem poder para colocar o governo de joelhos, até mesmo acelerar sua queda. Porém, como vemos, isso vai contra os interesses do PT e da CUT, que querem eleger Lula em 2022, independente das vidas sacrificadas para isso.
Como já dissemos em outras oportunidades, no fim não importa quem é o dono da empresa que nos explora. Uma empresa “estatal” está a serviço do mercado, dos acionistas, dos lucros, assim como as empresas privadas. Os governantes não usam tais empresas em benefício da população, mas a serviço da competição de mercado e de interesses privados próprios. O que está acontecendo na Eletrobrás está ocorrendo em todo o país, em todos os ramos da indústria. As demissões, como um processo unificado da burguesia, só pode ser barrado por uma intransigência unificada dos trabalhadores. Ou todos se unem para defender o emprego de todos, ou cada um sucumbirá isolado. E é isso que querem os pelegos.